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Por que badalados Guardiola e City sofrem para marcar território na Europa

Darren Staples/Reuters
Imagem: Darren Staples/Reuters

Caio Carrieri

Colaboração para o UOL, em Manchester (ING)

11/04/2018 04h00

Se o futebol fosse uma ciência exata, a combinação do altíssimo poder de investimento do Manchester City à disposição de Josep Guardiola, técnico mais badalado da era moderna, seria perfeita para o clube se impor na Liga dos Campeões. No entanto, as duas primeiras participações do City no torneio sob o comando de Pep ficaram muito aquém das expectativas.

Com campanha recorde na Premier League e muito próximos do título, apesar da festa adiada no Dérbi de Manchester no último fim de semana, os Citizens foram eliminados pelo Liverpool nesta terça (10) nas quartas de final da competição europeia, no Estádio Etihad, ao amargar a terceira derrota consecutiva (2 a 1) em sete dias, sequência negativa inédita na temporada. Na ida, em Anfield, os Reds, mesmo 17 pontos atrás no campeonato nacional, já tinham atropelado os rivais por 3 a 0.

Guardiola apreensivo - Anthony Devlin/AFP - Anthony Devlin/AFP
Imagem: Anthony Devlin/AFP

Na campanha de estreia de Guardiola pelo clube, a equipe havia sucumbido ainda mais cedo: caíra para o Monaco-FRA logo nas oitavas, com o peso do gol fora de casa como critério de desempate: 5 a 3 a favor na ida, na Inglaterra, e derrota por 3 a 1 no principado francês.

“É impossível manter o mesmo ritmo por 11 meses”, declarou o técnico catalão, que bateu boca com a arbitragem no intervalo e foi expulso. “Perdemos, reconheço, mas os jogadores têm crédito pelo que fizemos até agora, foram 10 meses maravilhosos. Talvez na próxima temporada eu descubra o segredo para melhorar”.

Mas afinal, por que o City ainda não se estabeleceu como forte candidato ao título europeu sob o comando de Guardiola, bicampeão com o Barcelona, mas que já completa 7 anos sem chegar a uma decisão do torneio? 

Cultura embrionária de Champions

Em 63 anos da competição mais importante do continente, esta foi apenas a sétima participação do City, de maneira seguida. Todas as edições disputadas foram já sob a gestão de Sheik Mansour, dos Emirados Árabes, proprietário do clube desde 2008. Uma semifinal é o mais longe que a equipe conseguiu avançar – em 2016, sob o comando do chileno Manuel Pellegrini, acabou eliminado pelo Real Madrid, que seria campeão.

Pela história curta no certame, o City ainda não vive a Liga dos Campeões como os clubes mais tradicionais. Inexiste expectativa pela competição, a não ser em grandes jogos de mata-mata. Por isso, muitas vezes sobram ingressos de partidas da fase grupos, o que raramente acontece na Premier League.

“Este torneio é especial, diferente. Não é porque estamos quase 20 pontos na frente deles (no Inglês) que vamos vencer. Existe Anfield, eles já foram campeões cinco vezes e sentem que são jogos especiais para eles”, ponderou o eliminado Pep, que na véspera da eliminação tinha enfatizado que o clube ainda precisava “criar algo” para se afirmar na Europa.

Sorteio deste ano reservou um carrasco

Liverpool comemora - Andrew Yates/Reuters - Andrew Yates/Reuters
Imagem: Andrew Yates/Reuters

Guardiola engoliu seco quando a bolinha do Liverpool apareceu no caminho para uma possível semifinal. Além de os Reds terem sido os responsáveis pela única derrota (4 a 3) de Kevin De Bryune em 32 rodadas na Premier League, o técnico Jürgen Klopp já mostrou diversas vezes que tem o antídoto para o esquema do técnico catalão – transições rápidas e contra-ataques fulminantes.

Não deu certo a aposta do City no meio-campista Ilkay Gündogan no lugar do ponta Raheem Sterling no primeiro jogo. O objetivo era fortalecer o meio e ainda ter a chegada de Gündogan dentro da área rival. A estratégia foi um fiasco, e com 31 minutos, o Liverpool já tinha 3 a 0 no placar, resultado que levou Guardiola a lançar mão de uma formação inédita na volta.

O 3-5-2, com Kyle Walker recuado na linha de três ao lado de Otamendi e Laporte, colocou o City todo no ataque. Bernardo Silva, Sterling, Leroy Sané e Gabriel Jesus foram escalados desde o início. O brasileiro abriu o marcador logo aos 2 minutos, mas o gol de empate de Salah, aos 11 da etapa complementar, esfriou todas as esperanças dos mandantes, que ainda assistiram Firmino aproveitar saída de bola errada de Otamendi e garantir a virada – para delírio de Klopp na beira do campo.

Nenhum treinador tem melhor retrospecto geral contra Pep. Com os dois triunfos nos últimos dias, o carismático alemão ainda ficou em vantagem: 7 vitórias, 5 reveses e duas igualdades.

“Ainda penso, sinceramente, que eles têm o melhor time do mundo no momento”, elogiou novamente o algoz, após a classificação. “Mas ainda assim podemos vencê-los, por isso o futebol é assim, tão legal”.

Elenco está em processo de rejuvenescimento

Gabriel Jesus cabisbaixo - Shaun Botterill/Getty Images - Shaun Botterill/Getty Images
Imagem: Shaun Botterill/Getty Images

Pep já fez 13 contratações e gastou 448 milhões de libras (R$ 2,166 bilhões) em quatro janelas de transferências no Estádio Etihad. Concentrou as fichas em jovens, como Leroy Sané, que chegou ao clube aos 20 anos, em agosto de 2016, e Gabriel Jesus, contratado aos 19. Mas nenhum setor concentrou mais investimentos do que as laterais, fundamentais para fornecer a intensidade e a amplitude demandadas pelo comandante.

Ao desembarcar em Manchester, Guardiola tinha Pablo Zabaleta (31), Bacary Sagna (33), Gael Clichy (30) e Aleksandar Kolarov (30) como peças na posição. Nenhum dos quatro seguiu no elenco após o primeiro ano com Pep, sem nenhuma taça.  Para esta temporada chegaram Benjamin Mendy (23), Kyle Walker (27) e Danilo (26) por um valor somado de 124,6 milhões de libras (R$ 602 milhões), quase 30% do total desembolsado a pedido do catalão.

Apesar de um time muito consistente e veloz, a falta de experiência parece ter pesado no momento decisivo da Liga dos Campeões.

A dificuldade para achar um "goleiro perfeito"

Ederson discute com Mané - Shaun Botterill/Getty Images - Shaun Botterill/Getty Images
Imagem: Shaun Botterill/Getty Images

Os oito gols sofridos nas últimas três partidas expuseram o setor defensivo da equipe. No entanto, Ederson, embora não tão confiante como em outros momentos do ano, está muito longe de ser o vilão desta fase mais frágil da defesa. Na verdade, ele virou solução de Guardiola após a primeira temporada de pesadelos na meta.

Tudo começou com a liberação de Joe Hart, então titular da seleção da Inglaterra e também do City. Fincado nos princípios de iniciar as jogadas de pé em pé, com a saída de bola em triangulações, Pep quis repetir o que fizera com Victor Valdés no Barça e Manuel Neuer no Bayern de Munique. Arriscou as fichas no veterano Claudio Bravo, 34, campeão da Liga dos Campeões. O chileno, no entanto, foi um desastre, com seguidos erros nas tentativas de construir os lances e insegurança constante debaixo das traves.

Resultado: Bravo foi para o banco de reservas, e Willy Caballero, dois anos mais velho, assumiu o gol. Também não convenceu. Teve falha crucial contra o Monaco, nas oitavas do ano passado, ao tentar sair jogando.

Por isso, Guardiola não hesitou em pagar 35 milhões de libras para tirar Ederson do Benfica. O segundo goleiro da seleção brasileira na Copa da Rússia assumiu a posição com muita frieza e personalidade. Em pouco tempo, já protagonizou lançamentos e passes primorosos, mesmo sob intensa marcação. Algumas destas participações foram a origem perfeita de gols de Sérgio Agüero, Sané e companhia.