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Galvão eternizou o tetra com Pelé na TV, mas quase não narrou a Copa de 94

Galvão Bueno e Pelé se abraçam em histórica transmissão do tetra da seleção  - Reprodução
Galvão Bueno e Pelé se abraçam em histórica transmissão do tetra da seleção Imagem: Reprodução

Diego Salgado, Gabriel Carneiro e Vanderlei Lima

Do UOL, em São Paulo

15/07/2019 04h00

"Vai partir. Sai que é sua, Taffarel. Partiu. Bateu. Acabou, acabou, acabou... É tetra, é tetra, é tetra... O Brasil é tetracampeão mundial de futebol."

Galvão Bueno já disse que "não teve nada mais ridículo" do que o desafinado grito "É tetra" enquanto abraçava Pelé com o braço esquerdo e era puxado por Arnaldo Cezar Coelho pela direita após a final da Copa do Mundo de 1994. Mas não dá para negar que esta seja uma das narrações mais famosas da história do futebol brasileiro, eternizada pela internet. Hoje, a relação é direta no imaginário popular entre o título do Brasil e a voz do narrador de 68 anos.

É até difícil imaginar que esse grande momento da TV brasileira, que completa 25 anos na próxima quarta-feira, poderia simplesmente não ter acontecido.

O tetra seria narrado por outra pessoa na Globo caso uma aventura de Galvão Bueno tivesse dado certo: dois anos antes da Copa, ele havia pedido demissão da emissora onde trabalhava desde 1981 para ser narrador, apresentador e diretor da Rede OM, que era do Paraná e tinha sido criada para desafiar a hegemonia do eixo Rio-São Paulo nas comunicações e transmissões esportivas.

Galvão na Rede OM - Reprodução - Reprodução
Folha de S. Paulo em 1º de abril de 1992 anunciou estreia na Rede OM
Imagem: Reprodução

O novo canal tinha programação exibida em São Paulo pela TV Gazeta e garantiu exclusividade na transmissão de Copa Libertadores e Copa do Brasil em 1992. A estrela fez sua estreia em 1º de abril daquele ano, numa goleada por 4 a 0 do São Paulo sobre o Criciúma na competição continental. O primeiro título tricolor, aliás, ficou marcado por passar fora da Globo e na voz de Galvão Bueno. A emissora teve 34 pontos de média de audiência no dia, número bem expressivo dentro daquele contexto, e chegou a liderar em alguns momentos.

O curioso é que o bi do São Paulo na Libertadores, em 1993, já foi transmitido pela Globo. E de novo com Galvão Bueno.

Projeto abreviado

José Carlos de Castro Martinez, empresário e político paulista radicado no Paraná que criou ao lado de seu irmão a Rede OM (Organizações Martinez), foi acusado, segundo o noticiário da época, durante investigações de uma CPI, de receber empréstimo por meio de cheques fantasmas para pagar uma dívida com o SBT na compra da TV Corcovado, responsável pelo sinal da nova emissora no Rio de Janeiro. O responsável pelo empréstimo foi Paulo César Farias, ex-tesoureiro de campanha e cabeça de esquema de corrupção que derrubou o governo de Fernando Collor, e que estimulou a compra do canal. Tanto Martinez, quando Farias morreram. Collor é senador (PROS-AL).

Galvão na Globo - Reprodução - Reprodução
Narrador trabalhou na Rede Globo entre 1981 e 1992 e 1993 até agora
Imagem: Reprodução

A OM trocou de nome em maio de 1993 para se desvincular do escândalo e foi rebatizada como CNT (Central Nacional de Televisão). Mas Galvão Bueno, principal nome do esporte, havia rescindido seu contrato em fevereiro, em meio a todo este processo. O narrador recebeu propostas de diversos canais de televisão após ficar livre no mercado. Chegou a ter negociação avançada com a Manchete, mas acabou voltando à Globo, reestreou em março e logo reassumiu a locução dos grandes eventos esportivos, como se jamais tivesse saído.

Em 94, treta com Pelé

Mesmo depois de dez meses fora da Globo, Galvão Bueno retornou como principal voz da Copa do Mundo dos Estados Unidos, com Pelé e Arnaldo Cezar Coelho em sua equipe. Ainda antes de eternizar gritos como "É tetra" e "Sai que é sua, Taffarel", marcantes para toda uma geração, o narrador teve um desentendimento com o Rei do Futebol, seu colega de trabalho. Foi depois da gravação de comentários para o Jornal Nacional que Galvão conversou com pessoal de operações da Globo sobre Pelé. O problema é que o sinal não foi desligado e acabou captado por antenas parabólicas.

"Eu sei que estão dizendo 'fala para o Pelé parar', mas só se eu matar ele, cara. Ele vem aqui, mete a mão no microfone, tum, abre e fala. Quem contratou que converse com ele. Eu vou dar com a marreta na cabeça dele", disse Galvão, sobre comentários longos de Pelé no jogo contra a Suécia. Depois, o assunto foi tratado como mal-entendido e o narrador disse que jamais brigou com o Rei.

Galvão e Pelé - Reprodução - Reprodução
Após entrada no Jornal Nacional, Pelé saiu de quadro e Galvão desabafou aos diretores da TV
Imagem: Reprodução