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Nosso repórter vai à aula de luta livre e "apanha". E você? Quer aprender?

Daniel Lisboa

Do UOL, em São Paulo

10/07/2015 06h00

Voadora no peito, soco nas costas, caras gigantes se jogando sobre o seu estômago. Tem gente que gosta de tudo isso, e não estamos falando de masoquistas. Na luta livre (ou “wrestling” e “telecatch”, como a modalidade também é conhecida), essa aparente explosão de violência faz parte do show. Porque é disso mesmo que se trata, entretenimento: embora muita gente ainda se surpreenda com a informação, tudo o que acontece no ringue é meticulosamente encenado.

Mas como aprender a lutar sem se machucar e ainda divertir o público? Em São Paulo, você pode frequentar as aulas da BWF (Brazilian Wrestling Federation). Comandadas pelo lutador Bob Junior, nelas é possível conhecer todos os macetes da luta livre. E interessados não faltam: as aulas, que acontecem todo sábado, costumam ter mais de trinta alunos. E esqueça aquele estereótipo do fortão de cara fechada: entre seus frequentadores estão magros, gordos, altos, baixinhos e até algumas mulheres. 
 
Quem assiste a uma aula pela primeira vez pode se assustar com o que vê. A impressão é que a pancadaria rola solta, mas os golpes ali praticados não machucam ninguém. Ou, pelo menos, não devem machucar, porque é para ensinar suas técnicas que Bob Junior está ali. Filho e neto de lutadores, praticante da modalidade há 35 anos, ele mostra como atirar o oponente no chão, esmagá-lo contra a parede, acertá-lo com um chute na cara. Enfim, todos os clássicos golpes da modalidade.
 
A aula começa com um aquecimento. Depois, os alunos dividem-se entre iniciantes e mais experimentados para treinarem os golpes. Por fim, todos reúnem-se em uma roda para, de dois em dois, aplicarem aquilo que aprenderam. A desenvoltura nas lutas varia, claro, da experiência de cada um, mas ninguém foge da “porrada”. Alguns, normalmente os mais leves, preferem os golpes “voadores”, outros são melhores no chão, tem até quem invente os próprios golpes, mas todos se divertem a despeito da impressão de que estão realmente massacrando os adversários. 
 
“Tem gente que chega com medo, mas assim que recebe um golpe percebe que não machuca”, conta Bob. “Nosso treino é focado nisso, em aprender a não se ferir. A luta livre não tem mais lesões que a média de outros esportes”, explica o treinador. 
 
A maioria dos alunos tem entre 15 e 30 anos. Alguns, como “speed”, já assumiram um personagem e até treinam de máscaras. Outros, como Vagner Gevergi, estão em sua primeira aula, mas nem por isso fogem da porrada. E de fazer as caras e trejeitos de um lutador de wrestling. “É o que chamamos de registro. Além de lutar, o aluno tem que aprender a fazer cara de mau e a fingir que está com dor quando apanha”, diz Bob. “A luta livre é composta pela parte física, a técnica e a teatral”. 
 
E, de fato, alguns alunos já estão tão bons no tal do “registro” que fica até difícil saber se estão encenando ou se o oponente exagerou no golpe. Outros impressionam pela desenvoltura em, por exemplo, voar no pescoço do adversário, “enlaçá-lo” com os pés e atirá-lo no chão. 
 
A mensalidade para treinar na BWF é negociável, mas fica em torno de 70 reais. “Nosso maior interesse é formar lutadores. Não estamos preocupados em ganhar dinheiro com isso”, diz Bob. Para o treinador, ao contrário do que muitos dizem, a luta livre não está tão mal assim no Brasil. “Eu faço em média três eventos por mês. Em julho, serão seis”, ele conta. 
 
E são vários os tipos de eventos que contratam a BWF para se apresentar. Bob e seus lutadores já estiveram, para ficar em alguns exemplos, no rodeio de Jaguariúna, no carnaval de Salvador, na Virada Cultural de São Paulo e até em eventos de anime. Alguns de seus lutadores começaram como alunos pouco desenvoltos, então quem se aplicar pode ter o privilégio de vir a se apresentar ao lado do treinador. 
 
“Aquele ali era um nerd quando chegou aqui, mal conseguia correr em volta do ringue. Agora já lutou até no Canadá, olha lá como ele é bom”, diz Bob, apontando para um dos alunos. O cachê de um lutador da BWF é de, em média, 300 reais por apresentação. Nada comparável aos 80 mil dólares anuais que, segundo Bob, um profissional iniciante costuma ganhar nos EUA, mas já é um começo para quem é amante da luta livre. 
 
Perambulando entre os alunos está Emerson, o filho de quatro anos de Bob. A influência do pai já trouxe consequências curiosas. “Quando ele tinha só dois anos, me ligaram da escolinha dizendo que ele estava com uma mania estranha: se jogar em cima dos colegas, mas de um jeito que não machucava ninguém. Orientei os professores a, quando ele fizesse aquilo, abaixar ao lado dele e bater no chão como um juiz de luta livre. Acredita que ele parava na hora?”, conta Bob, divertindo-se. 
 
Salvo exista alguma restrição física, o que deve ser devidamente avaliado por um médico, qualquer um pode fazer aulas de luta livre. No caso da BWF, basta se informar pelos contatos disponíveis no site bwf.com.br. As aulas estão provisoriamente acontecendo na academia do Ginásio 7 de setembro, na Água Rasa, zona leste de São Paulo. Coincidentemente, trata-se de uma espécie de “templo” da luta livre no Brasil: foi cenário para programas históricos como o “Astros do Ringue”, da TV Bandeirantes, e o “Gigantes do Ringue”, da TV Record. Porém, logo que acabar a reforma na sede da BWF (que também fica na Água Rasa), as aulas voltarão a acontecer no local, que tem um ringue apropriado à modalidade. 
 
A fim de provarem o que aprendem, alguns alunos de Bob resolveram “fechar o tempo” com este pobre repórter. O resultado? Veja você mesmo no vídeo que abre essa reportagem...