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Alpinista dribla campo minado e abastece moto com óleo de cozinha em busca de recorde nos Andes

Maximo Kausch quer escalar as 110 montanhas com mais de 6 mil metros na Cordilheira dos Andes - Arquivo Pessoal
Maximo Kausch quer escalar as 110 montanhas com mais de 6 mil metros na Cordilheira dos Andes Imagem: Arquivo Pessoal

Francisco De Laurentiis

Do UOL, em São Paulo

10/05/2013 06h00

"Um cara sem noção". Assim se define o homem que abandonou qualquer possibilidade de "vida normal", comprou uma moto sem saber pilotar e saiu pela América do Sul em busca de um recorde mundial.

Nascido na Argentina, mas radicado no Brasil desde pequeno, Maximo Kausch quer escalar as 110 montanhas da Cordilheira dos Andes com mais de 6 mil metros, entrando para o Guinness Book. A marca a ser batida é de 60 montanhas, das quais ele já escalou 52, passando por muitas aventuras no caminho. Seus percalços incluem até mesmo um campo minado e problemas mecânicos, no mínimo, inusitados.

Alpinista desde os 15 anos, Kausch já escalou grandes montanhas nos quatro cantos do mundo, dos Alpes europeus ao Himalaia, na Ásia. Para se dedicar integralmente à sua aventura nos Andes, largou tudo e não tem nem mesmo residência fixa (muito menos contas para pagar). Não tem namorada nem filhos, e não gosta nem mesmo de futebol, apesar de suas origens - considera o esporte "muito perigoso".

Seu trabalho como guia de expedições lhe rendeu dinheiro para passar meses escalando e vivendo em sua cabana - até agora, gastou cerca de R$ 9 mil. Seu único companheiro em meio à solidão das geladas montanhas de Argentina, Chile, Bolívia, Peru e Equador é um iPod, que o ajuda a "manter a sanidade".

"A maior parte destas montanhas estou fazendo sozinho por falta de parceiro. Não é todo mundo que tem tanto tempo livre para viajar e escalar por aí. Em setembro e outubro do ano passado, quando escalei 30 montanhas, só encontrei gente em uma delas. A vantagem de escalar sozinho é a praticidade, pois consigo progredir mais rápido. O problema é quando algo dá muito errado. Quando tenho algum acidente ou a moto quebra, a solidão piora tudo. Quando algo dá muito certo também é difícil, pois não tem com que dividir os momentos", conta o alpinista, ao UOL Esporte.

Os problemas com sua moto também são frequentes. Sem nenhum traquejo com o veículo, ele já viu sua Honda Tornado quebrar 22 vezes pelo caminho, muitas vezes graça aos terrenos acidentados e às péssimas estradas que tem que enfrentar. A inexperiência, porém, lhe rendeu dificuldades inesperadas.

"Eu nunca tinha andado em moto até setembro do ano passado, quando decidi enfrentar essas montanhas sozinho. Teve uma vez que o óleo da moto queimou e tive que usar óleo de cozinha, pois era só o que eu tinha. Caí muitas vezes, tive que cruzar fendas no gelo onde a moto caiu. Houve vezes que peguei ventos de 120 km/h e quase congelei. Essas histórias que hoje lembro e caio na gargalhada, mas na hora foram um pesadelo", lembra (veja mais na galeria de fotos abaixo).

"O problema é encontrar mecânicos bons no interior do Chile e Argentina. Espero que, com o próximo conserto, ela segure mais oito montanhas", completa o aventureiro, que também costuma sofrer com a falta de água. Muitas vezes, ele tem que derreter gelo obtido no topo das montanhas para matar a sede.

Maximo Kausch também viveu fortes emoções esteve na região de Socompa, na fronteira dos Andes argentinos e chilenos. O local é "decorado" tanto por ruínas de povos pré-Colombianos quanto por minas terrestres, colocadas pelo governo do Chile nos tempos de conflitos militares com países vizinhos. Autoridades disseram que a maior parte das minas já havia sido retirada, mas o que ele viu foi bem diferente.

"O campo minado foi um daqueles que separa os meninos dos homens. Ou melhor, algo na linha do que separa os responsáveis dos 'sem noção'", brinca o montanhista. Mesmo apreensivo com explosões, ele viajou com sua moto pela estrada abandonada que atravessa o campo minado e subiu o vulcão Socompa, de 6.050 metros.

MAXIMO KAUSCH MONTA EQUIPAMENTO DE ESCALADA DENTRO DE CASA

Além de se manter vivo, cuidar de sua moto e escalar montanhas, Kausch também tem outra preocupação para os próximos meses: referendar o recorde andino para o Guinness Book. O alpinista espera que seus registros no GPS bastem, mas ainda terá que conversar melhor com o livro. Isso, no entanto, não parece incomodá-lo. Do alto das montanhas, ele só consegue pensar em seus próximos objetivos.

"Eles (Guinness) estão tentando descobrir uma forma de avaliar isso, já que muitas dessas montanhas não tinham sido escaladas há mais de 20 anos. Acho que com as fotos que tenho e as rotas de GPS vou conseguir provar o recorde", explica.

"Mas, cada vez que escalo mais uma dessas montanhas, descubro que o recorde não significa muito. Quanto mais escalo, mais descubro que não escalei nada. Do cume de cada uma das montanhas, avisto outras dezenas que nem sei o nome", filosofa.

Faltando oito montanhas para bater o recorde nos Andes, Maximo Kausch deve completar sua primeira missão nas próximas duas semanas. Isso, é claro, se sua guerreira motoca aguentar.