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Skate leva suporte e educação para crianças em países marcados pela guerra

Oliver Percovich é o fundador e responsável pela Skateistan - DivulgaçãoSkateistan
Oliver Percovich é o fundador e responsável pela Skateistan Imagem: DivulgaçãoSkateistan

Júlia Caldeira

Do UOL, em São Paulo

22/07/2013 06h00

A rotina do medo e a incerteza restringem a infância de crianças e a esperança dos pais que vivem em países marcados pela guerra. Com o skate, porém, o australiano Oliver Percovich , de 39 anos, consegue mudar um pouco esta realidade.

Ele é o fundador e responsável pela Skateistan, uma organização sem fins lucrativos que une educação ao esporte e leva diversão e perspectiva para crianças do Afeganistão e do Camboja. Em entrevista ao UOL Esporte, Percovich falou sobre o projeto e sobre as dificuldades de mantê-lo atuante.

"Eu não viajei para o Afeganistão com a ideia do Skateistan, ela surgiu a partir da consciência de que as crianças são a parcela mais importante a se trabalhar no Afeganistão. Eu estava morando em Cabul [capital afegã] e, dos muitos projetos que vi, poucos trabalhavam com crianças ou eram voltados para a educação", afirmou.

A partir desta observação e do interesse que seu skate despertava nas crianças quando andava pelas ruas de Cabul, começou a surgir a ideia do Skateistan. Oliver então deixou o trabalho como pesquisador de gestão de emergências na Universidade de Melbourne para se dedicar às aulas deste esporte.

E, da pista improvisada em uma fonte vazia de água em Cabul até a construção da primeira escola, ele se tornou o diretor do projeto de skate. Atualmente, o Skateistan já ajuda mais de 400 jovens no Afeganistão e se estendeu para o Camboja, em um trabalho que ocupa 100% do tempo de Oliver.

"São países que foram atingidos negativamente pela guerra. Muitas crianças têm muito pouco a esperar na vida. Criar oportunidades em educação é essencial para desenvolver o país", explicou.

O QUE É O SKATEISTAN?

  • O Skateistan é uma organização sem fins lucrativos que trabalha com crianças entre 5 e 18 anos no Afeganistão e no Camboja.
    O intuito da entidade é ajudar crianças carentes que sofrem com problemas de guerra e a pobreza vividas em seus países através do skate.
    Nas escolas da Skateistan os jovens aprendem a andar de skate e outros esportes, têm aulas de reforço escolar, e participam de atividades culturais.
    Atualmente, o projeto, que existe desde 2007, conta com o trabalho de 40 pessoas, divididas entre o Afeganistão, o Camboja e Berlim (cidade onde fica a sede administrativa da organização).

A organização é totalmente dependente de doações e do lucro proveniente da venda de produtos da marca Skateistan, como camisetas, além do livro recém-lançado, motivo de orgulho para Oliver. A publicação conta a história do projeto em 320 páginas com fotos e algumas histórias de crianças e da própria organização.

"Fizemos o livro todo sozinhos e estamos muito orgulhosos do resultado. O estafe da Skateistan escreveu o texto, tirou as fotos, criou o layout e organizou a publicação e a distribuição".

Esta dependência, porém, deixa Oliver preocupado. O projeto ainda não tem nenhum financiamento para o ano que vem, o que gera incertezas. "Então, comprar o nosso livro iria nos ajudar muito!", apelou.

Mas não é só o lado financeiro que traz dificuldades para o trabalho da organização. Em um país como o Afeganistão, em que as garotas precisam cobrir seus rostos com um véu aos 11 anos, e práticas esportivas, como andar de bicicleta, são proibidas às mulheres, o trabalho com meninas por meio do esporte enfrenta preconceitos.

Segundo Oliver, há famílias que proíbem as meninas de praticar qualquer tipo de esporte e de ir à escola. Assim, é preciso realizar um trabalho também com os pais das crianças, para convencê-los de permitir a participação de suas filhas no projeto.

"Nós trabalhamos com as famílias e as comunidades dando muitos incentivos para que as meninas se envolvam. Fornecemos transporte gratuito a elas e não para os meninos, e todas as aulas para meninas são exclusivas. Sempre é uma professora e a nenhum menino é permitido estar presente ou assistir às aulas femininas. Estas modificações possibilitam o sucesso das aulas. Nós damos bastante suporte para as estudantes e então elas comparecem", explica.

O trabalho com as famílias é feito pelos agentes de suporte estudantil da Skateistan. Eles visitam cada uma das famíllas para encorajá-las a apoiar essas meninas na educação e no esporte. "Trabalhamos muito para superar todas as dificuldades de ter um programa para meninas".

Mesmo com a barreira cultural, o Skateistan trabalha efetivamente com as garotas afegãs e divulga com orgulho que 40% dos seus alunos são mulheres, número superior a todos os outros esportes mistos (praticados por ambos os sexos juntos) no Afeganistão, o que, segundo Oliver, torna o skate a maior organização de esporte feminino no país.

A jovem Hanifa, de 14 anos, é fruto do sucesso do programa entre as garotas. Ela começou a participar do projeto apenas para estudar, mas acabou se apaixonando e se destacando nas pistas de skate.

"Eu gosto sempre de ir alto nas rampas. Quando estou lá, me sinto livre, como se estivesse voando. Gosto muito desta sensação", descreveu a garota em depoimento ao site oficial do projeto.

O sentimento de Hanifa  exemplifica o que Oliver e sua equipe de quarenta colaboradores tentam buscar com o Sketeistan, unir o direito de diversão das crianças a uma capacitação e inclusão de jovens. Segundo ele, o skate é perfeito para tal objetivo, já que, por ser divertido, é um atrativo para as crianças e, ao mesmo tempo, por ser difícil e perigoso, cria "uma batalha contra você mesmo".

"Aprender a andar de skate pode lhe trazer confiança e amizades e traz oportunidades para crianças desamparadas que nunca tiveram acesso formal à educação e redes de apoio como outras crianças costumam ter. Criatividade, autoestima e persistência são qualidades que você pode aprender com o skate. Quando você cai e se levanta de novo milhares de vezes, isto lhe proporciona uma vantagem psicológica sobre outras pessoas".