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Do preconceito à admiração, esportes radicais viram teses de doutorado

Giancarlo Machado é skatista e doutorando em Antropologia Social pela Universidade de São Paulo  - Fellipe Francisco
Giancarlo Machado é skatista e doutorando em Antropologia Social pela Universidade de São Paulo Imagem: Fellipe Francisco

Paulo Anshowinhas

Do UOL, em São Paulo

05/10/2013 06h00

Estudos interdisciplinares, antropologia urbana, iniciação científica, etnografia, teses, dissertações e monografias. Os esportes radicais são tema de estudo cada vez mais frequente entre pesquisadores brasileiros e estrangeiros que encontram nesse universo um amplo campo de observação.

Para  o mestre e doutorando em Antropologia Social pela Universidade de São Paulo (USP) Giancarlo Machado, que já foi redator da revista Tribo Skate e editor do blog Skate Cultura, “são criados vários estereótipos em torno dos praticantes do skate. Por estar inserido no contexto urbano, a utilização da cidade para o exercício dessa prática nem sempre é amistosa, ocasionando conflitos”, prossegue. “Em certos momentos, os skatistas são tratados como atletas, mas em outros são tratados como vândalos”, analisa.

Nascido em Ipatinga, interior de Minas Gerais, Giancarlo se mudou para São Paulo onde o skate virou temática da sua dissertação de mestrado “De ‘carrinho’ pela cidade, a prática do street skate em São Paulo”, e também de publicações científicas como “De skate pela cidade: quando o importante é (não) competir”, publicado na revista Cadernos de Campo (USP);  “Dilemas em torno da prática do street skate em São Paulo”, publicado na revista Esporte & Sociedade (UFF); e “Skate na cidade, imagens da cidade: notas etnográficas sobre a conquista de picos”, publicado na revista Ponto Urbe (USP).

Em sua dissertação, Giancarlo analisou os usos e apropriações urbanas a partir da prática do skate, além de conflitos, formas de sociabilidade, negociações com o poder público, entre outros aspectos relevantes. Atualmente no doutorado desenvolve a tese “Rumo a ‘Meca do Skate’: análise etnográfica do circuito skatista São Paulo – Barcelona” (feita com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – FAPESP), onde acompanha os trajetos de skatistas em buscas de locais para andar de skate, a importância da produção de imagens, e como isso se relaciona ao campo esportivo.

Outro pesquisador que tem uma visão ainda mais ampla da situação dos esportes de ação é o professor Leonardo Brandão da Universidade Regional de Blumenau (FURB). Doutor em História Social pela PUC/SP, Leonardo considera que  “no passado o preconceito era maior, mas atualmente, em alguns casos, ele vem dando lugar à admiração”, conta. Segundo ele, “o fato é que há uma tendência, nas sociedades “pós-modernas” de valorizar o risco, o efêmero e a juventude, aspectos esses que se configuram centrais nos esportes radicais”, afirma.

Leonardo tem dois livros publicados: “A cidade e a tribo skatista”, que foi lançado em 2011, e o segundo, organizado por ele e pelo professor Tony Honorato, com o título “Skate & skatistas: questões contemporâneas”, com capítulos escritos por diversos pesquisadores, inclusive de outros países.

Um desses trabalhos estrangeiros que ele destaca é o do professor de arquitetura da University College of London (UCL), autor do livro “Skateboarding, space and the city: architecture and the body” (Skate, espaço e a cidade: arquitetura e o corpo, em tradução livre).

Em sua dissertação de mestrado, intitulada “Corpos deslizantes, corpos desviantes”, Leonardo investigou a formação do Street Skate e sua relação com a cidade. No doutorado pesquisou a introdução e o desenvolvimento dos chamados “esportes radicais” ou “californianos” no Brasil, com ênfase no skate e no surfe.

Ele, que pretende realizar uma pesquisa sobre a proibição do skate em Blumenau, atualmente orienta uma turma de Iniciação Científica sobre skate e uma monografia que tem por objetivo analisar todas as edições da revista Yeah! (uma das principais mídias impressas sobre skate da década de 1980).

Segundo Leonardo, para falar de surfe seria importante conhecer o trabalho do pesquisador carioca Rafael Fortes, professor da Unirio e autor do livro “O surfe nas ondas da mídia: esporte, juventude e cultura”.

E, para finalizar, o doutor em esportes radicais acrescenta que existe uma abertura e interesse sobre essa área, mas muita coisa precisa ser feita para sua consolidação. “A Universidade está aberta às pesquisas sobre “esportes radicais”. Cabe aos interessados, entretanto, saber justificar e demonstrar a relevância de suas pesquisas”, orienta.