Será que agora vai?

Times da Série A serão obrigados a ter equipes femininas em 2019. É a melhor chance que a modalidade já teve

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Futebol feminino decola?

Pedro Ernesto Guerra Azevedo/Santos FC Pedro Ernesto Guerra Azevedo/Santos FC

A hora do futebol feminino?

Por que todos os envolvidos com futebol feminino acreditam que 2019 pode ser o ano da mudança? A resposta começa em 2016, quando a Fifa publicou sua visão de como vê o futebol nos próximos dez anos. Nesse documento, o incentivo ao futebol feminino ganhou muita importância, dentro e fora dos campos. Entre os objetivos estão desenvolver novas competições internacionais, assegurar a criação de estratégias locais de fomento à modalidade, criar um programa de marketing e ampliar o número de mulheres nos comitês das associações e da própria Fifa.

Pensando nisso, a Conmebol passou a exigir que os clubes interessados em disputar suas competições masculinas tenham investimentos em torneios femininos. Essa regra passa a valer já em 2019. Isso significa que times classificados para a Libertadores, como Cruzeiro, Palmeiras, Flamengo, Inter, São Paulo, Grêmio e mais um time que ainda briga pela classificação via Brasileirão só confirmarão sua vaga no torneio se tiverem times femininos disputando campeonatos no ano que vem.

A CBF também trabalha nesse sentido. Em 2017, criou o licenciamento dos clubes para a disputa de suas competições oficiais. Nessas regras, tornou obrigatório que cada clube que vá disputar o Brasileirão da Série A de 2019 seja obrigado a participar de competições femininas - daí a peneira do São Paulo, que reuniu mais de 450 meninas no vídeo acima.

Além disso, o Programa de Modernização da Gestão e de Responsabilidade Fiscal do Futebol Brasileiro (Profut), também prevê “apoio mínimo” ao futebol feminino. No entanto, as sanções previstas na lei federal, que refinanciou cerca de R$ 579 milhões em dívidas dos clubes com o governo federal, ainda estão em discussão no Supremo Tribunal Federal e ainda não foram confirmadas. As regras esportivas, no entanto, já valem.

Nesse contexto, quem descumprir estará fora não só do Brasileirão, mas também não terá confirmada sua classificação para as Copas Sul-Americana e Libertadores.

Exigências para os clubes em 2019

CONMEBOL exige que clubes tenham:

  • equipe feminina (ou se associar a um clube que tenha);
  • pelo menos uma categoria juvenil feminina (ou se associar a clube que tenha);
  • suporte técnico, equipamento e infraestrutura com campo para treinamento e jogos;
  • participar de competições nacionais e/ou regionais da CBF ou Federações estaduais.

PROFUT exige que clubes tenham:

  • manutenção de investimento mínimo no futebol feminino.

CBF quer que clubes tenham e apresentem documentos que comprovem:

  • equipe feminina disputando competições nacionais ou estaduais em 2018 ou 2019 (ou se associar a clube que tenha);
  • estrutura à disposição do time feminino, com equipe técnica e médica dedicadas, instalações para treinamento, campo para jogos, e eventuais contratos de patrocínio.
Pedro Ernesto Guerra Azevedo/Santos Pedro Ernesto Guerra Azevedo/Santos

"Só querem cumprir obrigação"

Primeira mulher a treinar a seleção brasileira, Emily Lima hoje dirige o Santos, a equipe feminina mais vencedora do Brasil. Para ela, toda obrigação é complicada. Por isso, duvida se a medida será positiva.

“Dois clubes grandes me ligaram para saber como montar uma estrutura de futebol feminino. Eu perguntei se eles queriam fazer um trabalho de desenvolvimento de um time vencedor ou só para cumprir a obrigação. A resposta dos dois foi de que queriam cumprir a obrigação”.

A técnica não conta quais foram os clubes, mas não poupa palavras ao dizer que as respostas refletem falta de comprometimento. Sua preocupação aumenta, também, porque a inclusão do investimento em times femininos nas regras do Profut foi alvo de lobby dos clubes de camisa, que tentam retirar o item das contrapartidas.

Emily avalia que a aplicação das penalizações será crucial para alguma mudança, de fato, ocorrer. Mas a desilusão é tão grande que espera acompanhar o desfecho de longe. “É complicado. Minha busca é ir para fora do país”.

Se o cumprimento das regras já existentes do Brasileirão masculino for algum indicativo, a posição de Emily passa do pessimismo a uma possibilidade concreta. De acordo com o regulamento atual, os times com salários em atraso por mais de 30 dias devem perder 3 pontos por jogo até a situação financeira ser normalizada. Quantos clubes foram penalizados? Nenhum. E, não, isso não significa que todos os salários estão sendo pagos mensalmente. Como mostram os exemplos de Fluminense e Atlético-MG.

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Nos acréscimos

Para facilitar a leitura dessa reportagem, a partir daqui os clubes que disputam a Série A do Brasileirão masculino serão chamados de times de camisa. É assim que as jogadoras se referem aos clubes celebrados e que agora chegam ao futebol feminino. Como a obrigatoriedade de criação de times femininos vale a partir de janeiro, os times de camisa têm pouco mais de um mês para se enquadrar nas novas regras. Era de se esperar que os clubes estivessem prontos, os locais de treinamento e mando de jogos definidos e os elencos montados. Nada disso.

Os times podem até ter camisa, mas não têm planejamento. A maioria deixou para última hora. Usando aqueles já classificados para a Copa Libertadores de 2019 como exemplo, dois deles ainda não sabem nem mesmo que modelo de projeto vão seguir. O UOL Esporte apurou que Palmeiras e Cruzeiro ainda estão fazendo reuniões para definir se farão parcerias com um time feminino já existente ou se montarão uma estrutura própria.

O Flamengo, semifinalista do Brasileirão feminino de 2018, por exemplo, tem parceria com a Marinha. Internacional e Grêmio montaram equipes próprias, que já disputaram a Série A2 do Brasileirão deste ano. Já o São Paulo está criando um time próprio - a peneira de 450 meninas mostrada no início dessa reportagem é o ponto inicial do projeto tricolor. Na última temporada, por exemplo, o prazo de entrega de documentos e planejamento dos clubes junto à CBF se encerrou em outubro do ano anterior. Até agora, nem sinal do licenciamento para 2019. Ou seja, os clubes ainda não obtiveram a licença para disputar oficialmente o campeonato.

Rosane, atacante do Santos, revela que até o momento a maioria das atletas não sente movimentação maior do mercado. Não aumentaram nem as propostas, nem as sondagens. A falta de organização vai ter consequências. Com muitos clubes procurando jogadoras ao mesmo tempo, há expectativa de inflacionar o mercado.

Nem todos acreditam que os clubes farão contratações. Thaís Picarte é goleira do Santos e projeta que muitas equipes apostarão em parcerias. A atleta avalia que será um movimento inicial e de pouca duração – para o bem. Argumenta que se um time de camisa começar a tomar vários 7 a 1, incluindo em clássicos, haverá tanta pressão da torcida que não haverá jeito que não investir. "Ficará muito difícil que o futebol feminino não cresça".

Para engrenagem funcionar, porém, é necessário que CBF e Conmebol não aliviem nas punições. Até a exclusão de competições estão previstas nas regras. "Se não punir, desanda", resume Rosane. À reportagem, porém, a CBF não confirmou como será a fiscalização e quais serão as punições para quem não cumprir essa regra.

Bruno Teixeira/Ag. Corinthians Bruno Teixeira/Ag. Corinthians

Amigo do bolso

Ainda assim, existe esperança de a regra ajudar a engordar a conta bancária de atletas. Atualmente, a remuneração média de uma jogadora é de R$ 1,5 mil por mês. A informação é de Ana Lorena Marche, coordenadora do futebol feminino das Guerreiras Grenás, a versão feminina da Ferroviária de Araraquara (SP), semifinalistas do Brasileirão feminino de 2018.

“Hoje, os salários variam de R$ 500 a R$ 3 mil”, diz Ana, que aposta em um nível salarial mínimo no novo contexto. “Acho que talvez não aumente tanto, mas garante que ninguém ganhe menos que um salário mínimo, algo que hoje não acontece”.

Como exemplo, usamos o caso de Rubiane Suzie Pereira, a Rubi, goleira do Iranduba, time de Manaus que levou 25 mil pessoas à Arena Amazônia ano passado, em semifinal do Brasileirão contra o Santos. A obrigatoriedade de montar equipes femininas fez a jogadora ser sondada por um clube do Sudeste, com aceno de aumento de salarial.

São casos assim que fazem com que os envolvidos, incluindo a diretora das Guerreiras Grenás, acreditem que vai aumentar a quantidade de jogadoras que recebem salários de cinco dígitos no futebol feminino nacional. “Hoje, já tem uma menina ganhando R$ 10 mil. Ela joga no Corinthians. Isto será mais comum em cinco anos”, aposta.

A situação é parecida entre as comissões técnicas. Lucas Piccinato, por exemplo, trabalhou várias temporadas no Centro Olímpico, um dos mais vitoriosos projetos da modalidade na capital paulista. Agora, ele veste uniforme do São Paulo Futebol Clube, depois de uma transferência que aumentou seu salário em 40%.

Amor ao futebol fala mais alto que dinheiro

Aline Pellegrino, dirigente da Federação Paulista para o futebol feminino, não tem dúvidas de que a modalidade está no caminho do crescimento. Citando hierarquia forte e longa, que inclui Conmebol e Fifa, ela vê a exigência sendo cumprida e os times femininos saindo do papel.

O movimento, para ela, é de clubes de camisa passarem a pressionar por torneios melhores. Incluindo um movimento com a Conmebol por uma Libertadores feminina maior. Mas a ex-jogadora da seleção brasileira não espera que o futebol feminino se torne do tamanho do masculino.

"Não vamos pensar que chegaremos aos valores do masculino. Mas o futebol será uma opção de trabalho para as mulheres. Quando a menina falar que quer ser jogadora, mães e pais acharão que poderão ter carreiras que permitam o sustento".

Lucas Figueiredo/CBF Lucas Figueiredo/CBF

Apagar imagem de coitadinho

O projeto do time feminino do Santos é o mais vencedor do Brasil. Tanto que, em 2018 e 2017, os maiores públicos de futebol na Vila Belmiro, no masculino ou no feminino, foram de jogos de mulheres.

Gerente executivo para a área, Alessandro Rodrigues acredita que este processo fará cair por terra a imagem que muitas pessoas têm de que o futebol feminino é coitadinho. "As próprias jogadoras refutam este título. E estão cobertas de razão. Muitas falam outras línguas, 70% do elenco têm diploma. E ainda ganham mais que 90% dos homens profissionais".

Os números que ele apresenta, porém, são referentes a um estudo sobre o futebol brasileiro que envolve atletas de todas as divisões, incluindo times semiamadores. Os orçamentos do próprio Santos mostram uma disparidade gigantesca. Enquanto a folha salarial do time masculino é de R$ 4,5 milhões por mês, todo o projeto feminino tem orçamento previsto de pouco mais de R$ 4 milhões. Pelo ano todo.

Mesmo com menos investimento, o dirigente vê as atletas do Santos se tornando modelo de sucesso. Ele conta que o Santos já recebeu 900 garotas em peneiras e que todo dia é procurado por pessoas indicando meninas para o clube.

Esporte Clube Iranduba da Amazônia Esporte Clube Iranduba da Amazônia

Calendário precisa ser ampliado

A coordenadora de Futebol Feminino da Federação Paulista, Aline Pellegrino, avalia que o número de clubes vai dobrar para o ano que vem – hoje, o Ranking Nacional dos Clubes de futebol feminino da CBF tem 82 times. Com uma estrutura tímida de competições, vai faltar campeonato para tanto time no país e mudanças serão necessárias para o calendário.

Estaduais

Atualmente, todas as 26 federações filiadas à CBF contam com um campeonato feminino. O número de times participantes, porém, não é tão grande quanto essa totalidade pode sugerir. São 170 clubes disputando esses torneios, em uma média de 6,5 times por competição.

Desses 26 estaduais brasileiros, apenas seis têm dez ou mais participantes. Bahia, com 15 times, e São Paulo, com 13, são os maiores torneios. Ao mesmo tempo, dez desses estaduais contam com quatro ou menos participantes. Nesses casos, são torneios de tiro curto, normalmente com menos de um mês de duração, que impossibilitam a criação de uma estrutura profissional em torno dos clubes.

Bruno Teixeira/Agência Corinthians Bruno Teixeira/Agência Corinthians

Campeonato Brasileiro

É por isso que o fortalecimento do Campeonato Brasileiro é importante. A CBF solicitou, no início do ano, um estudo para adequar o campeonato ao tamanho da modalidade no país. As mudanças só serão adotadas em 2020 e, por isso, o formato que será repetido em 2019 é o atual: um Brasileirão com 16 equipes, 14 rodadas e fase de mata-mata.

A fórmula é aplicada na primeira e segunda divisão – que ainda tem uma fase preliminar, totalizando 29 clubes participantes. O problema, aí, é a dificuldade de acesso. Os times da primeira divisão estão garantidos na próxima edição, mas a Série A2 (equivalente à Segundona) é disputada pelos dois rebaixados da Série A1 na temporada anterior e pelos campeões estaduais (em caso de time já classificado, para as Séries A1 ou A2, o próximo time na classificação estadual ganha a vaga).

Isso quer dizer que os novos times criados para 2019 terão um gargalo estreito para ter um calendário minimamente preenchido para a temporada. Esse é o problema que deve ser atacado pela CBF, de acordo com o coordenador de seleções femininas, Marco Aurélio Cunha. O dirigente defende um ajuste, mas sem ignorar clubes que têm times de futebol feminino antes de haver obrigação.

“Temos um ranking que merece ser respeitado pelas conquistas anteriores de quem está jogando há muito tempo. Não pode, porque é um time de camisa, ter que subir. Temos duas séries, A1 e A2. São 16 clubes em cada série. Dois sobem e dois caem. O que tenho discutido é criar fórmula em que o gargalo não seja tão difícil”, explica Marco Aurélio Cunha.

Pedro Ernesto Guerra Azevedo/Santos Pedro Ernesto Guerra Azevedo/Santos

Copa Libertadores

Sonho de consumo no masculino, a versão feminina da Libertadores é um torneio de tiro curto, estilo Copa do Mundo. Dura três semanas e os participantes jogam dia sim, dia não, em uma única cidade. A fórmula é criticada porque o desgaste atrapalha a qualidade técnica justamente nas partidas decisivas.

As pessoas envolvidas no futebol feminino esperam que a contrapartida da Conmebol por exigir que clubes criem equipes femininas seja organizar uma Libertadores mais longa para as mulheres. O desejo seria repetir a fórmula masculina, mas a falta de estrutura as obriga a se contentar apenas com uma duração maior do torneio.

A disputa de 2018 teve início neste domingo (18 na Arena da Amazônia, em Manaus, com três equipes brasileiras das 12 participantes, que se enfrentarão em 22 partidas. A final está marcada para 2 de dezembro.

Copa do Brasil

A competição, que já foi a mais importante do país, foi extinta e não é prioridade da CBF no momento. A entidade prefere investir no Campeonato Brasileiro, por ser uma competição de tiro longo. Marco Aurélio Cunha justifica que não compensa montar uma equipe que pode ser eliminada logo na primeira rodada. “Nesse caso, todo o esforço feito pelos dirigentes morre. Não é o que tem de ser feito no futebol feminino”, diz Cunha. Ele também ressalta que eliminações precoces impedem a exposição das marcas patrocinadoras e afastam interessados. Por estes motivos, o retorno da Copa do Brasil não está no radar da CBF.

Lucas Figueiredo/CBF Lucas Figueiredo/CBF

"Vai criar mercado próprio"

A obrigação dos times de camisa terem equipes femininas causará impacto positivo na opinião de Marco Aurélio Cunha, na foto acima à direita, ao lado do técnico Vadão. “Vai dar oportunidade. Quanta gente não tem emprego e vai poder trabalhar? Podem ser salários baixos no começo, mas a competição vai criar mercado próprio”, analisa o dirigente.

Marco Aurélio diz que o futebol feminino já tem público e cita os 25 mil torcedores do Iranduba que estiveram na Arena da Amazônia na semifinal do Brasileirão feminina do ano passado e que os maiores públicos da Vila Belmiro em 2017 e 2018 foram em partidas da equipe feminina do Santos. Mas reclama que fatos assim a imprensa não mostra.

“Sempre que mostra é um drama. ‘Perdeu o clube e trabalha no supermercado’. Ou a Marta, que é uma exceção. É sempre o pico ou o fundo do poço. Ninguém mostra a evolução natural, o progresso. Tem uma menina no Milan usando a 22 do Kaká”, reclama o dirigente. “O próprio UOL é assim. Eu liguei há algum tempo para colocar os resultados do feminino e disseram: ‘Ah, é difícil’. Tem até de campeonato da Oceania. Mas em um prazo de cinco anos farão por obrigação. Porque será muito constrangedor não mostrar”.

Lucas Figueiredo/CBF Lucas Figueiredo/CBF

No vácuo dos times de camisa

Rubi, a goleira do Iranduba, imagina que a chegada dos times de camisa levará a uma importação de torcedores destes clubes. Ela justifica que qualquer grupo que usar o uniforme de Palmeiras, São Paulo, Fluminense ou Atlético-MG, só para citar alguns clubes da Série A masculina que não tem time feminino, vai ganhar simpatizantes. A atleta acrescenta que mais interesse resulta em patrocínio e crescimento geral.

Ana Lorena Marche, coordenadora das Guerreiras Grenás, ressalta que os patrocinadores já começaram a olhar para o futebol feminino com outros olhos. Muitos clubes já jogaram o campeonato deste ano com patrocinadores e a chegada dos times de camisa deve aumentar os contratos. "Muitos times tiveram parceiros, mas por valores baixos. Ano que vem e nos próximos, a tendência é aumentar. Por causa da maior visibilidade".

O Santos também acredita nesta perspectiva. O gerente executivo de Futebol Feminino do clube, Alessandro Rodrigues, projeta sair do vermelho já em 2020. Ele conta que até este ano foi preciso tirar dinheiro do bolso para bancar a equipe.

Pedro Ernesto Guerra Azevedo/Santos Pedro Ernesto Guerra Azevedo/Santos

Pequenos temem extinção

A chegada dos times de camisa é uma faca de dois gumes para as equipes que chegaram antes ao futebol feminino. Para Ana Lorena Marche, se um clube como o São Paulo, que fez uma peneira gigante no fim de outubro, entrar com um investimento baixíssimo para os padrões masculinos pode deixar para trás boa parte das equipes femininas. Sem falar no apelo de vestir a camisa de um clube tricampeão mundial.

A dirigente das Guerreiras Grenás teme que no começo da próxima década os times de camisa façam valer seu poder financeiro e virem de cabeça para baixo a realidade atual da modalidade. "Corinthians, Flamengo, São Paulo têm muito mais dinheiro. Pode acontecer como no masculino, com esses times dominantes. Acho que demora um pouco e estipular um prazo é especulação, mas vejo o cenário em cinco anos bem modificado".

Ana Lorena diz que as equipes menores precisam profissionalizar suas gestões para não morrerem. O modelo é a Chapecoense, que se manteve competitiva por anos na Série A sem fazer loucuras financeiras. Coordenador de seleções da CBF, Marco Aurélio Cunha, admite que o problema pode existir e há pouco a ser feito para remediar.

"A gente viu isso acontecer no masculino. É mercado. Mas o mercado feminino não é tão desigual quanto o masculino. O que os times do interior precisam fazer é assinar contratos e pôr multa. Mas pode acontecer de o pequeno sofrer. Já acontece no masculino. O São Paulo quis tirar o Everton Felipe do Sport e não teve jeito. Levou. Não é ilícito".

Sem comparar com o masculino

Quando atletas, comissão técnica e dirigentes falam em aumento de salários e patrocínios, não estão esperando atingir o patamar do futebol masculino. Afinal, a diferença é enorme. Olhe o gráfico acima: o campeão brasileiro feminino de 2018 ganhou R$ 120 mil, enquanto seu par masculino vai embolsar R$ 18 milhões. A expectativa de melhora ocorre justamente porque a modalidade está vários estágios atrás. Lucas, o treinador do São Paulo, por exemplo, conta que não existem contratos longos ou multas rescisórias. O padrão são acordos de gaveta.

O site dos clubes é uma radiografia da atual condição do futebol feminino brasileiro. Corinthians e Rio Preto fizeram a final do Campeonato Brasileiro na sexta-feira que antecedeu o segundo turno da eleição. A página das duas equipes tem uma aba de futebol profissional e outra para o futebol feminino. É com este espírito que a maioria dos profissionais do futebol feminino vê a chegada dos times de camisa.

Outra questão é de onde vai sair o dinheiro. Teoricamente, a verba do futebol feminino vem do mesmo lugar que a do futebol masculino. O problema é que, nos últimos três anos, os clubes têm diminuído o investimento em categorias de base ou estrutura. O único gasto que vem aumentando é o de compra de atletas.

Mesmo assim, algumas equipes prometem levar a modalidade a sério. O São Paulo, por exemplo, fez uma peneira com 450 meninas há poucas semanas. Iniciativas assim darão visibilidade e, a partir deste passo, é possível sonhar com estádios cheios, patrocínios e transmissões na televisão.

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