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Tenista da Rocinha rejeita rótulo de "esporte burguês" e sonha com casa para o pai

Fabiano de Paula parou na primeira rodada do challenger de Campos do Jordão - João Pires/Divulgação
Fabiano de Paula parou na primeira rodada do challenger de Campos do Jordão Imagem: João Pires/Divulgação

Rubens Lisboa

Em São Paulo

05/08/2011 07h00

A definição do tênis como esporte da burguesia no Brasil é comum entre dirigentes esportivos ou organizadores de eventos. Até o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva já entrou na onda. Mas o conceito não vale para Fabiano de Paula. Jovem tenista, ele mora na comunidade da Rocinha no Rio de Janeiro, conta com a ajuda de um empresário ligado ao futebol, de um ex-tenista e também já foi apoiado pelo apresentador Luciano Huck, da TV Globo.

LULA CRIOU POLÊMICA COM DECLARAÇÃO

  • Em agosto do ano passado, durante a inauguração de um clube público no Rio de Janeiro, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva causou polêmica ao chamar tênis de esporte da burguesia e orientar um garoto para procurar outro esporte.
    A declaração foi rebatida por tenistas e ex-tenistas, como Fernando Meligeni.

Fabiano começou sua trajetória no tênis trabalhando como boleiro no hotel Continental, em São Conrado, aos 9 anos. Aceitou o emprego para ajudar na renda da família, substituindo outro pegador de bola que se acidentou. A dedicação o levou a ser convidado para começar a jogar dois anos depois.

Com títulos nacionais a partir dos 16 anos, interrompeu a carreira por três anos. Nos dois primeiros, por falta de patrocínio. No período, deu aulas para sustentar a família. No ano seguinte, serviu ao Exército. Voltou no ano passado e hoje, aos 22 anos, ocupa a 465ª colocação no ranking de simples na busca por pontos em futures e challengers.

Pode parecer um ranking ruim, mas lembre-se: o ex-pegador não tinha dinheiro para custear viagens ou comprar raquetes e roupas de jogo. Para despesas assim, contou com a ajuda do ex-tenista Luiz Cláudio Alves, que bancou sua carreira. Hoje recebe salário do empresário José Alonso, que também trabalha com futebol.

Outro que ajudou foi o apresentador Luciano Huck, que intermediou o fornecimento de uniformes da Olympikus e estava disposto a participar mais, mas um desentendimento acabou com os planos.

SONHO DE VIDA NO TÊNIS

João Pires/Divulgação
Quero construir a vida no tênis. Ter uma casa, dar uma casa melhor para o meu pai e dar uma vida melhor para eles que não tiveram

Fabiano de Paula, tenista da Rocinha

“Luciano Huck me ajudou, mas foi por pouco tempo e era só com os uniformes. Saiu uma matéria falando que ele me apoiava, mas o Luis Cláudio sempre me apoiou e, na época, não gostou [da repercussão]. O Luciano iria começar a ajudar mais, mas não deu tempo por esse desentendimento. Como o Luis me ajudava desde os 14, decidi obedecer a ele”, explica o tenista carioca.

Com vitórias sobre tenistas como o ex-top 100 Thiago Alves e a revelação Christian Lindell, brasileiro naturalizado sueco, além de ter treinado com Ricardo Mello, Fabiano carrega o orgulho de saber que na Rocinha é visto como inspiração para outros jovens. 

“Um primo meu joga tênis falou que tem uma rapaziada nova que fala de mim e quer ser como eu. É um prazer enorme ouvir isso”, afirma Fabiano, que quando está em casa sai cedo diariamente da Rocinha para treinar na academia Tennis Route e volta apenas depois das 20h.

Em um momento de ascensão na carreira, Fabiano de Paula está longe dos seus objetivos, que vão muito além dos resultados da quadra de tênis. Ele diz que o tênis é a sua vida e espera aproveitar para construir um futuro para a sua família. 

“Quero construir a vida. Ter uma casa, dar uma casa melhor para o meu pai e dar uma vida melhor para eles que não tiveram”.

Sua última competição foi em Campos do Jordão, no interior de São Paulo. Ele perdeu para o sul-africano Izak Van Der Merwe e voltou para o Rio de Janeiro. Fica em casa por dez dias, antes de voltar a viajar para os torneios e sonhar com um futuro melhor no esporte.