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Apoiada por Phil Collins, tenista brasileira supera lesões e quebra tabu

Felipe Pereira

Do UOL, em São Paulo

13/01/2014 16h51

Filha de um boia fria, apadrinhada por Roger Federer, apoiada pelo cantor Phil Collins, mas com um rompimento com a Confederação Brasileira de Tênis no currículo, Teliana Pereira considera sua vida um conto de fadas. Saída do sertão nordestino, ela estreia na madrugada desta terça-feira nos glamorosos e milionários torneios Grand Slam do circuito mundial de tênis.

Uma conquista para qualquer atleta, ainda mais para alguém que viveu os primeiros oito anos num sítio em Águas Belas (PE), cidade classificada como baixo IDH. A vaga foi obtida com as vitórias acumuladas no ano passado, quando chegou a ter 17 triunfos em sequência. Os bons resultados fizeram que Teliana tenha hoje o melhor ranking entre todos os jogadores de tênis do Brasil, incluindo homens.
 
O início desta trajetória começou quando o pai deixou a vida de cortador de cana no Nordeste para morar em Curitiba. Ele conseguiu emprego de pedreiro na construção da academia de tênis do francês Didier Rayon. Para a sorte de Teliana, a parceria continuou e seu José Pereira da Silva, mais conhecido como Pernambuco, passou a cuidar da manutenção das quadras. 
 
No primeiro momento, o lugar era usado pela jogadora para brincar depois da aula. Não demorou para começar a juntar as bolinhas amarelas que caíam no fundo das quadras. Mais que uns trocados, o trabalho de pegadora de bolas foi o primeiro contato com o esporte que logo passou a aprender com Didier Rayon, primeiro técnico e dono do clube.
 
Como sempre estava na academia Teliana era chamada para bater bola com outras pessoas. Tanto tempo com a raquete levou a aperfeiçoar a técnica e se inscrever nos campeonatos foi o caminho natural. Com os bons resultados, Curitiba ficou pequena e ela saiu Brasil afora em busca de novas adversários e glórias.
 
De vitória em vitória Teliana está na 97ª posição no ranking, posto que rendeu vaga no primeiro Grand Slam da carreira. A presença da tenista quebra um tabu de quase 20 anos no tênis feminino do Brasil. Desde agosto de 1993, com Andrea Vieira no US Open, não havia uma brasileira disputando um dos quatro grande torneios de tênis do mundo.
 
O sorteio das chaves não foi muito favorável e a brasileira estreia contra a cabeça de chave 29, a russa Anastasia Pavlyuchenkova. A jogadora projeta que a mera participação no Australian Open vai ter reflexos positivos na temporada. "Estou ganhando bastante experiência na Austrália, treinando e convivendo com as melhores do mundo, Serena (williams), Sharapova, então isso só me ajudará ao longo do ano." 
 
Teliana garante que não fossem os problemas de contusão o tabu teria acabado antes. Ocorre que uma série de lesões surgiu quando a tenista tinha 19 anos e os resultados de 2007 confirmavam a expectativa de que era o maior talento de sua geração. Naquele ano, alcançou a 196ª posição no ranking e ganhou a medalha de bronze em duplas no Pan do Rio. O primeiro percalço na rota de ascensão apareceu no ano seguinte, quando a jogadora machucou o ombro e passou quatro meses fora das quadras. 
 
A situação piorou em 2009. Em março, uma cirurgia retirou parte do menisco do joelho direito da atleta. Após de uma tentativa frustrada de voltar ao circuito foi necessária nova intervenção em dezembro para corrigir a cartilagem. Nas duas semanas seguintes, ela teve usar muletas. Depois, longas e intensas sessões de fisioterapia fizeram parte do cotidiano de Teliana.
 
A falta que o tênis causou foi registrada no blog mantido por Teliana. No post publicado em 19 fevereiro de 2010 a jogadora descreveu com fazia para matar uma pouco da vontade. “Como todo atleta não conseguimos ficar totalmente distante da nossa atividade. Assisto tênis todos os dias, vou a academia e também treino um pouco sentada num banco…falando assim acho que poucos devem entender, mas treino saque, direita e esquerda sem se (sic) mexer.”.
 
A volta ao circuito ocorreu na cidade de Brasília em julho de 2010. Foi o primeiro de uma série de torneios de menor expressão. A recuperação no ranking sofreu um baque em março de 2012, quando ela rompeu com a Confederação Brasileira de Tênis (CBT). A alegação foi falta de comprometimento da atleta, mas a origem do problema era o local de treinamento. Os cartolas desejavam que ela trabalhasse na academia de Larri Passos, em Santa Catarina.
 
A jogadora experimentou, mas preferiu voltar a treinar em Curitiba. Por causa da decisão, a CBT cortou o patrocínio e retirou Teliana do programa de preparação para as Olimpíadas do Rio. O problema persistiu até o final daquele ano, quando os diretores da CBT aceitaram que a tenista fizesse a preparação para os torneios em Curitiba.
 
Se num determinado período faltou apoio no Brasil, durante a formação a ajuda veio de fora. Teliana foi selecionada pela Fundação Little Dreams, mantida pelo cantor inglês Phil Collins. A instituição escolhe 10 jovens a cada ano em todo o mundo, o que mostra a singularidade da história da atleta. Ao ser aceita, a brasileira tinha como padrinhos Roger Federer e Amelie Mauresmo, com quem jogou uma partida de exibição em 2002.
 
Agora Teliana está em nova fase da carreira e depois da ascensão ano passado luta para se firmar entre as jogadoras da elite mundial. A brasileira garante que vontade não vai faltar. Ela afirma que a origem humilde e as dificuldades enfrentadas fizeram que tenha mais fome de ganhar que as demais companheiras do circuito mundial de tênis.

Raio-x

  • Divulgação/CBT

    Raio-x
    Nome: Teliana Pereira
    Ranking: 97
    Títulos: 27
    Data de nascimento: 20 de julho de 1988
    Local de nascimento: Águas Belas (PE)
    Altura: 1,68cm Peso: 62 kg
    Empunhadura: destra (backhand com duas mãos)
    Começo da carreira: 14 de julho de 2003