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Torneio de aviõezinhos de papel tem pesquisa de aerodinâmica, segredos industriais e cópia da internet

Competidor treina antes do início da competição de aviãozinho de papel, em São Paulo - Roberto Setton/UOL
Competidor treina antes do início da competição de aviãozinho de papel, em São Paulo Imagem: Roberto Setton/UOL

Bruno Doro

Do UOL, em São Paulo

22/03/2012 06h00

Fazer um avião de papel é fácil e todo mundo sabe o passo a passo. Você dobra uma folha ao meio, junta as duas pontas, dobra as asas e atira pelo ar. O difícil é projetar um aviãozinho de papel para uma competição com três categorias diferentes e exigências particulares de design em cada uma delas. Na manhã de quarta-feira, em São Paulo, um grupo de quase 100 universitários viu que a brincadeira pode ser séria e envolver pesquisas de aerodinâmica e segredos industriais, além da inevitável cópia da internet.

Em evento patrocinado por uma marca de energéticos, universitários paulistas colocaram o cérebro para funcionar. O desafio era criar um avião que percorresse grandes distâncias, um que ficasse muito tempo no ar e outro que fizesse as manobras mais espetaculares. Tudo isso usando uma folha de papel.

VEJA COMO MONTAR UM AVIÃO DE PAPEL VENCEDOR

“Parece brincadeira, mas montar aviãozinho de papel pode ser interessante. Você usa os mesmo conceitos de aerodinâmica dos aviões normais. Para distância, ele precisa ser mais fino. Para tempo de voo, precisa ser mais largo, para planar”, explica Leonard Ang, aluno de engenharia da Escola Politécnica da USP (Universidade de São Paulo).

Leonard conquisto o título de campeão mundial em 2009, na Áustria, com um voo de 11 segundos. Ele, porém, é dono do recorde mundial, de 17 segundos, nas eliminatórias brasileiras. “Além do desenho do avião, a performance depende muito do arremesso. No Mundial, o teto era baixo, não deu para fazer o mesmo tempo. Na eliminatória, o teto era mais alto, deu para fazer o lançamento perfeito”, completa.

AVIÃOZINHO DE PAPEL FAZ PARTE ATÉ MESMO DE PESQUISA ESPACIAL

  • Itsuo Inouye/AP

    Apesar do tom de brincadeira do evento, aviõezinhos de papel tem seu lugar no mundo sério. A Universidade de Tóquio, por exemplo, estuda designs e materiais para fazer com que aviões lançados do espaço resistam à entrada na atmosfera. O estudo começou com a Associação Japonesa de Origami, chegou até o departamento de estudos aeroespaciais da universidade e, depois, ao astronauta japonês Koichi Wakata – que já foi três vezes ao espaço e soma mais de 159 dias fora da órbita terrestre.

    O objetivo era usar a viagem de Wakata em 2009 para jogar alguns aviõezinhos do espaço e descobrir se as estruturas resistiriam à reentrada na atmosfera. Em testes com uma resina de vidro aplicada em uma folha de papel, os pesquisadores conseguiram montar um avião de origami que resistiu ao calor de 230 graus e velocidades supersônicas.

    Nem a Nasa (Agência Espacial dos EUA), nem a Jaxa (Agência Espacial Japonesa), informam se o projeto foi executado. Críticos à época diziam que, como os aviões não poderiam ser rastreados – chips localizadores aumentariam o peso do avião e diminuiriam muito as chances de resistir à reentrada –,não valeria a pena nem mesmo tentar. O estudo, porém, fazia parte de uma pesquisa maior, para a criação de naves leves para a reentrada na atmosfera.

     

A técnica perfeita de Leonard é o melhor exemplo de como usar o que se aprende na internet com um pouco de pesquisa própria. Léo copiou o modelo que tinha vencido o torneio anteriormente, testou e fez suas melhorias. “Comecei com a mesma versão, mas fui fazendo pesquisas e treinamentos até chegar ao modelo final. Não é muito diferente, tem apenas algumas peculiaridades. O mais importante que as pessoas precisam saber é que o seu primeiro avião nunca vai voar. Você tem de saber fazer os ajustes”.

Se o campeão mundial não tem problemas em mostrar seus segredos, o mesmo não pode ser dito dos outros competidores. Muitos deles montavam seus aviões de frente para a parede, escondendo o design com as costas. “É segredo industrial, ninguém pode ver”, diz Giovani Schmidt, aluno de engenharia industrial.

Procurado pela reportagem, Bruno Panzero Schechter, aluno de engenharia naval, também não entregou o jogo. O pedido era para mostrar como se faz um aviãozinho perfeito. “Vou mostrar como se faz o avião clássico para a prova de distância. Mas não é o que eu vou usar. Tem alguns segredos que quero usar na hora da prova”.

Aos 22 anos, ele admite que buscou a inspiração na internet para seu “projeto secreto”. “Olhei alguns vídeos no YouTube e aprendi como se faz”. Após alguns pedidos, ele finalmente cedeu e contou um dos truques que pretendia usar. “Para fazer o avião para tempo de voo, você faz um design mais quadrado. E dobra a ponta oito vezes, para que o centro de gravidade do avião fique no bico e o voo fique mais estável”.

Apesar do esforço, Bruno não foi muito bem na prova. Melhor para Fausto Damiani Victorelli, aluno de engenharia química da Poli, vencedor da prova de tempo de voo com 8s69. Que foi muito mais sincero. “Olha, como aluno de engenharia química, posso dizer que as aulas não ajudam em nada. O que estou usando aqui é o que aprendi com meu pai mesmo”, disse, aos risos. “Na verdade, os detalhes do avião não importam muito, desde que você faça o projeto básico para cada prova. No tempo de voo, o segredo foi jogar para cima o mais forte possível e torcer para ele demorar a cair”, completa.