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Caos financeiro faz Brasil desistir de torneio escolar e frustra crianças

Guilherme Costa

Do UOL, em São Paulo

09/12/2016 19h16

As dez componentes do time de basquete feminino sub-14 do Santa Mônica Centro Educacional, situado em Madureira (RJ), são egressas de um programa social. Bolsistas integrais, todas teriam neste ano a primeira chance de fazer uma viagem internacional: a equipe carioca venceu os Jogos Escolares da Juventude, em João Pessoa (PB), e se credenciou para representar o Brasil no Sul-Americano da categoria, em Medellín (Colômbia), de 11 a 18 de dezembro. Na última quinta-feira (08), a empolgação virou frustração. Em meio a um cenário de falta de dinheiro, atrasos de logística e problemas na prestação de contas da CBDE (Confederação Brasileira de Desporto Educacional), o país cancelou participação na competição.

A desistência foi informada aos treinadores em uma mensagem no aplicativo WhatsApp. “Criou-se uma expectativa em um monte de gente, incluindo as crianças, e de repente foi dito que nós não vamos. As meninas ficaram tristes demais”, relatou Guilherme Vos, 52, treinador do Santa Mônica.

Organizados pelo COB (Comitê Olímpico do Brasil), os Jogos Escolares da Juventude são estruturados inicialmente em etapas regionais. Os times campeões são enviados para a fase nacional (a edição deste ano foi realizada em João Pessoa e terminou no dia 19 de novembro). Na categoria sub-14, os vencedores de cada esporte foram convocados pela CBDE para o Sul-Americano escolar.

Um dia depois do término dos Jogos Escolares, a CBDE criou o tal grupo de WhatsApp para facilitar a comunicação com técnicos. Pediu uma série de documentos e avisou que informaria “o quanto antes” os detalhes sobre voos e hospedagem – nesse caso, como as crianças precisariam de autorização dos pais para viajar, o prazo era fundamental. A competição na Colômbia estava marcada originalmente para 4 de dezembro, mas foi adiada por decisão do comitê organizador.

Também foi postergada a data para a CBDE obter recursos do Ministério do Esporte, que originalmente custearia a viagem. A entidade responsável pela convocação dos garotos disse inicialmente que o dinheiro seria liberado no dia 20 de novembro, mas depois mudou a previsão para 27 do mesmo mês.

Após ter descumprido os dois prazos, a CBDE informou aos treinadores que considerava outras fontes para coleta da verba. Em mensagens às quais o UOL Esporte teve acesso, um funcionário da entidade disse aos técnicos que tentava viabilizar um aporte do COB.

Na última quarta-feira (07), também no aplicativo de troca de mensagens, um profissional da CBDE avisou que o COB havia liberado o dinheiro. Mais tarde, ainda no mesmo dia, disse que haveria uma reunião emergencial na manhã seguinte. Nessa altura, a notícia de que a viagem estava confirmada já havia chegado à maioria das crianças.

“O que aconteceu é que sempre vinha uma notícia de que a resposta chegaria logo, mas a resposta era sempre um adiamento da decisão. Então, a todo momento ficava essa indefinição”, contou Vos, que conversou com as meninas na tarde de quinta-feira (08) para falar sobre o cancelamento da viagem: “Uma boa parte chorou bastante”.

A explicação do Ministério do Esporte é que a celebração do convênio com a CBDE não foi possível porque “não houve tempo hábil para viabilizar a ida dos atletas”. No entanto, a desistência também tem a ver com corte orçamentário e principalmente com problemas da entidade responsável pela convocação.

Segundo o UOL Esporte apurou, a CBDE tem pendência em prestação de contas com o Ministério. Por isso, não pôde receber nova injeção de recursos. O aporte do COB seria uma maneira de driblar isso, mas esbarrou em uma questão de prazo/custos.

“A notícia é péssima. Era um sonho de todos os meninos, e do grupo apenas dois têm idade para o ano que vem. Mas superando esse processo e tentando passar por esse trauma, é uma equipe escolar. Como a gente utiliza o projeto de esportes como ferramenta no processo de ensino e aprendizagem, procurei minimizar essa pancada e colocar para eles que a vida tem isso. Eles vão passar. A gente espera que eles se tornem profissionais em várias áreas, e aí eles estarão sujeitos a situações similares e precisam aprender a olhar para a frente”, disse Fernando Barreto Barbosa, 48, técnico do vôlei masculino do Colégio Elite, situado na Tijuca, bairro da zona norte do Rio de Janeiro.

A desistência foi especialmente frustrante para um menino que representaria o Colégio Elite. Cada equipe convocada teve direito a convocar um jogador de outro time dos Jogos Escolares, e a instituição de ensino do Rio havia chamado um garoto de uma escola de Recife.

“Ele chegou na segunda-feira para fazer uma semana de adaptação ao grupo. Como não vai ter mais o Sul-Americano, volta amanhã [sábado] ou domingo para casa”, explicou Barreto Barbosa. “Aproveitou o espaço que teve aqui, conheceu o Rio e se envolveu com a modalidade que gosta. Ainda está muito recente, e todo mundo está muito chateado. Mas aqui a gente tem essa política de não focar no problema, e sim na solução”, completou.

O UOL Esporte procurou a CBDE para falar sobre a desistência de participar do Sul-Americano, mas não conseguiu contato até o fechamento do texto.