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Pan 2019

Pan-2019: Falta de medalhas é mais culpa da organização do que do Brasil

Keno Marley (dir.) ganhou uma das duas pratas brasileiras nesta quinta pelo boxe - REUTERS/Ivan Alvarado
Keno Marley (dir.) ganhou uma das duas pratas brasileiras nesta quinta pelo boxe Imagem: REUTERS/Ivan Alvarado

Demétrio Vecchioli

Do UOL, em Lima (Peru)

02/08/2019 00h20

O Brasil subiu ao pódio apenas três vezes no Pan de Lima nesta quinta-feira (1). Foram duas medalhas de prata no boxe, com os jovens Keno Marley e Jucielen Romeu, no turno da noite. Antes, havia saído um bronze pelo ciclismo. Foi só, mesmo. A explicação para isso? Não passa exatamente pela falta de sorte ou de capacidade dos atletas brasileiros, mas em um calendário desequilibrado montado pela organização dos Jogos Pan-Americanos. Foram apenas 11 finais na quarta e serão 15 nesta quinta, das quais sete no boxe. Em compensação, serão 71 no penúltimo dia do Pan, um sábado.

Numa jornada tão pouco produtiva para o Time Brasil, o Canadá acabou assumindo a terceira posição no quadro de medalhas ao também alcançar a marca de 12 medalhas de ouro. A diferença é que eles têm o dobro de pratas em relação à delegação brasileira (24 a 12). O México, por sua vez, abriu vantagem para se manter em segundo, com 16 ouros. Ninguém chega perto dos 36 ouros dos Estados Unidos, de todo modo. Aqui, vale uma observação, no entanto: não estamos computando as medalhas do badminton, nem mesmo os quatro bronzes obtidos por brasileiros no badminton, seguindo protocolo dos organizadores, que aguardam a conclusão da modalidade nesta sexta. Ygor Coelho, um dos destaques do continente, foi o único a avançar à final, por sinal.

Esse é o tipo de cenário que dirigentes do Comitê Olímpico Brasileiro (COB) receavam, aliás. Não havia muito como brigar com esse calendário.

"Um equilíbrio é muito difícil, porque um evento dura sete, oito dias, enquanto outros duram apenas um dia, como o moutain bike. Tentamos balancear os eventos que podem ser atrativos não apenas para a população peruana, mas para todos os mercados. Alguns claros, de repente, sentem que vão ser preteridos porque vai ter muitos eventos em um só final de semana, mas estamos bastante contentes com o calendário", diz Gustavo San Martin, diretor de esportes do Comitê Organizador, conhecido pela siga COPAL.

O calendário do Pan de Lima foge muito da tradição dos eventos poliesportivos. A começar pelo fato de os dois esportes mais tradicionais do movimento olímpico, atletismo e natação, serem disputados ao mesmo tempo, no final da última semana. Para isso existe uma explicação técnica: a Federação Internacional de Natação (Fina) marcou as provas de natação para a parte final do Mundial de Esportes Aquáticos na Coreia do Sul, o que impossibilitava que o Pan tivesse natação na sua primeira semana.

O ideal seria inverter, puxando o atletismo para o começo da competição. Mas a federação pan-americana da modalidade não quis conversa. "Tivemos que dialogar com algumas federações, mas o atletismo tradicionalmente fecha os jogos. Mesmo assim eles fizeram uma concessão e nos permitiram ter as maratonas no primeiro dia, o que encheu as ruas de gente", ressalta San Martin. Disputadas no primeiro dia do Pan, as maratonas masculina e feminina foram vencidas por peruanos e bateram recordes de audiência no país-sede.

O critério "tradição", porém, só valeu para o atletismo. O judô, que tradicionalmente abre o Pan, foi jogado para a última semana, em uma concorrência desleal com atletismo, natação, e finais de esportes coletivos. "Há certa tradição nos calendários, mas as coisas mudam e queremos fazer um calendário atraente para o espectador", aponta o diretor.

Sobre o judô especificamente, ele diz que a explicação está na utilização do mesmo ginásio provisório que o handebol. A organização preferiu primeiro realizar o handebol feminino (inclusive com jogos antes da Cerimônia de Abertura), depois o handebol masculino, e só por fim o judô. Em Callao, cidade vizinha a Lima, ocorre o contrário: o ginásio que recebeu o taekwondo agora tem um esporte coletivo, o vôlei.

Interesses mercadológicos e de público

Bronze no ciclismo de pista - Washington Alves/COB - Washington Alves/COB
Kacio Freitas, Joao Vitor da Silva e Flavio Cipriano ganharam bronze na pista
Imagem: Washington Alves/COB

Porta-voz dos Jogos Pan-Americanos, San Martin não entende que esta quinta-feira tenha sido um dia desinteressante do Pan. Ele cita o início as provas de saltos ornamentais e de ciclismo de pista. Que, na sua visão, são eventos "prime", assim como as fases inicias de vôlei e basquete, todos pelo masculino. No basquete, o Brasil está fora. Ainda pelos coletivos, a seleção de handebol masculino triturou o time da casa, vencendo por 40 a 16.

"Os eventos são feitos para promover o esporte em todo o mundo. Se esses esportes não são tão populares no Brasil, mas sim no México ou na Colômbia, talvez seja um incentivo para que Brasil e Argentina, por exemplo, também se desenvolvam nessas modalidades. O encanto de um evento poliesportivo é desfrutar de muitos esportes", argumenta.

Bom, para constar, no ciclismo de pista, a equipe brasileira ao menos ganhou o bronze na prova de velocidade. Um resultado relevante para o trio Flavio Cipriano, Kacio Fonseca e João Vitor Silva, mas sem muito peso na luta brasileira no quadro de medalhas.

Segundo Martín, esse calendário foi discutido com todas as partes interessadas, incluindo os detentores dos direitos de transmissão. "Temos imprensa de todo o mundo e isso foi conversado com os donos dos direitos de transmissão. Conhecemos esse calendário há muito tempo e fomos manejando com todos os meios. Entendemos que o Brasil é um mercado muito muito forte, mas também temos Argentina, México, Estados Unidos, Canadá, Europa, que também podem desfrutar dos espetáculos".

Sobre a concentração dos eventos nos finais de semana, a explicação está na relação com o espectador local em uma cidade onde a mobilidade é caótica e o transporte público funciona muito mal. "Foram quatro dias de feriado nos quatro primeiros dias para que o trânsito fosse um pouco mais flexível. O tráfego é complicado como em qualquer parte do mundo, estamos fazendo os ajustes. Queremos ter dois finais de semana muito fortes com finais."