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Crise na Itália deixa times pequenos de 'pires na mão'

Marcelo Crescenti

De Milão para a BBC Brasil

11/04/2014 08h20

Falências de times, queda na venda de ingressos e um número crescente de jogadores desempregados: a crise econômica está afetando seriamente o futebol italiano.

Segundo a Federação Italiana de Futebol, na temporada 2012/13 a Itália contou com 40 times profissionais a menos que em 2009/10. O número de equipes da "Lega Nazionale Dilettanti", a liga de times amadores e semiprofissionais registrados nas divisões mais baixas, caiu nesse mesmo espaço de tempo de 17,4 mil para cerca de 16,5 mil times.

Os números foram publicados este mês no Report Calcio 2013 da federação e da empresa de consultoria PriceWaterhouseCoopers. De acordo com o estudo, o número de jogadores profissionais também caiu nas últimas três temporadas – de 14,5 mil para 13,8 mil. Os número de jogadores nas ligas amadoras e semiprofissionais foi reduzido de 470,5 mil para cerca de 440,6 mil.

Problema global

A crise econômica afeta o futebol em todo o planeta. Segundo a FIFPro, associação que representa jogadores em todo o mundo, cerca de 40% dos profissionais que jogam no Leste Europeu reclamam de atraso no pagamento dos salários, problema que também ocorre com frequência em países como Grécia e Espanha.

O presidente da associação, Philippe Piat, criticou duramente as regras de transferência da Fifa, argumentando que o sistema inflaciona os passes dos jogadores de destaque e permite que os clubes assumam dívidas enormes.

Isso criaria uma situação comprometedora para as equipes, que muitas vezes acabam não podendo sustentar o seu plantel.

Na Itália, os problemas financeiros estão sendo sentidos principalmente pelas equipes menores. Mas os times grandes da Série A também sofrem, com uma queda de 17% nos ingressos vendidos nos últimos cinco anos.

No entanto, equipes conhecidas, como Juventus e Milan, conseguiram aumentar seu faturamento e subir posições no ranking dos times mais ricos do planeta feito pela consultoria de empresas Deloitte.

O Juventus, de estádio novo, registrou um crescimento de 39% no ano passado, ficando em nono lugar no Deloitte Footbal Money League. O AC Milan cresceu em 17% e ocupa a décima posição.

Apesar desse sucesso financeiro, a performance geral da Série A deixa a desejar se comparada a outros campeonatos europeus. "Com um faturamento total estagnado nos 1,6 bilhões de euros, fomos ultrapassados pela Bundesliga alemã com 1,9 bilhões e pela Liga Espanhola, que fatura 1,8 bilhões de euros", diz Paolo Ciabattini, especialista em finança esportiva.

Luta pela sobrevivência

Mais embaixo na tabela e em divisões menores do futebol italiano, a situação muitas vezes é preocupante. Muitos times locais lutam para sobreviver. O corte de verbas por parte de prefeituras e patrocinadores regionais pode ser fatal para as finanças das equipes.

Uma das últimas vítimas da crise foi o time do Bari Calcio, do sul do país, que jogava na série B e declarou falência em março passado.

Em divisões ainda mais baixas, muitas equipes passam por dificuldades. Por exemplo, na Sardenha times pequenos como Olbia, Arzachena ou Budoni, jogando da divisão D para baixo, correm o risco de não poderem se inscrever no próximo campeonato por falta de dinheiro.

"Além da falta de verba os times lutam contra os custos crescentes de manutenção e a alta de impostos e taxas", explica Igor Piciau, cronista esportivo local e entusiasta do futebol sardo. "Muitas vezes os presidentes dos clubes pagam as despesas dos próprios bolsos."

Desemprego

Com o futebol em crise e com as vagas para jogadores limitadas pela falta de dinheiro dos times, cresce na Itália o número de profissionais do futebol que estão desempregados. Tanto que a "Associazione Italiana Calciatori" (Associação Italiana de Jogadores de Futebol) criou uma divisão especial, chamada "Equipe Itália", para assessorar e ajudar quem não tem time.

Na região da Campania, no sul do país, a "Equipe Campania" reúne profissionais sem contrato e organiza jogos amistosos para eles ficarem em forma e mostrarem o seu futebol. O responsável, Antonio Trovatto, cuida atualmente de um número recorde de mais de cem jogadores. "E a tendência é esse número aumentar mais", diz.

Vários profissionais do futebol passaram por mais de um time falido em sua carreira. O jornal italiano La Repubblica citou recentemente o exemplo de Enrico Morello, que em seus tempos áureos jogou na Série A no time do Parma.

Depois do Parma, Morello passou por nove equipes e teve que trocar de clube várias vezes por causa dos problemas financeiros dos times: O Spal faliu em 2003 e seu presidente foi preso, o Reggiana abriu falência em 2005, o clube Torres, da Sardenha, foi excluso da série C por falta de fundos, o Messina quebrou em 2009 e finalmente o Lucchese, seu último clube, teve que deixar a série C por ter dívidas de 7 milhões de euros.

Procurado pelo jornal, o ex-defensor Morello não quis falar sobre a sua carreira futebolística. Ele disse que no momento está "à procura de um emprego estável".