Topo

Cientistas correm contra o tempo para construir carro capaz de superar 1.600 km/h

Bloodhound: inglês é um dos concorrentes ao título de carro mais rápido da história - Bloodhound Project
Bloodhound: inglês é um dos concorrentes ao título de carro mais rápido da história Imagem: Bloodhound Project

Bruno Doro

Do UOL, em São Paulo

25/10/2012 06h00

O carro que você usa não deve acelerar de 0 a 100 km/h em menos de 10 segundos. Mas, ao redor do planeta, equipes de cientistas, físicos, engenheiros e pilotos quebram a cabeça para descobrir como ir de 0 a 1.600 km/h em até 20 segundos. É a corrida para construir o carro mais rápido do mundo, que deve ter seu ápice em 2013. O objetivo é quebrar o recorde de 1.227,986 km/h, de 1997, do inglês Andy Green dirigindo o ThrustSSC, o primeiro carro supersônico da história.

Atualmente, pelo menos seis equipes estão na disputa, representando Inglaterra, Estados Unidos, Austrália e Nova Zelândia. Três delas estão avançadas nos testes e podem chegar ao recorde já no próximo ano. As outras ainda estão em fases iniciais e só devem colocar os carros na pista em cinco ou seis anos.

Os ingleses da Bloodhound SSC contam com a experiência de Green e de outro ex-recordista, Richard Noble (1.019 km/h em 1983), englobando um projeto ligado a divulgação de conhecimento. Os australianos da Aussie Invader 5R já fizeram uma tentativa, nos anos 90, e voltam agora com seu terceiro modelo, apostando na experiência de Rosco McGlashan, recordista do kart mais rápido da história (407 km/h). Já os norte-americanos da North American Eagle, comandados por Ed Shaddle, estão há dez anos tentando chegar ao recorde.

  • American Eagle: equipe cortou as asas de um jato

“A corrida pelo recorde de carro mais rápido do mundo está vivendo uma verdadeira ‘Era de Ouro’, com tantas pessoas tentando fazer um carro andando a 1.000 milhas por hora. O melhor do nosso esporte é que não estamos limitados por regras como, por exemplo, a Fórmula 1, em que a tecnologia é guardada a sete chaves pelas equipes e, mesmo assim, todos os carros são iguais. Aqui, os caminhos usados podem ser diferentes e, por isso mesmo, as soluções são diferentes. Quanto mais gente buscar o recorde, mais a tecnologia vai evoluir. E todo o mundo vai se beneficiar”, comemora o piloto do Bloodhound e atual recordista, Andy Green.

Apesar dessa busca por soluções diferentes, todas as equipes usam, basicamente, os mesmos princípios. A velocidade desejada é de 1.000 milhas por horas, pouco mais de 1.600 km/h. Para isso, os carros são empurrados por grandes turbinas, como as usadas em jatos supersônicos ou foguetes espaciais. O formato e as dimensões também são parecidos, com carros longos, de 14 a 18 metros, e finos, lembrando os aviões a jato (um deles, inclusive, usa um avião com asas cortadas). O peso também varia, de 5,8 toneladas do American Eagle a 9,4 toneladas do Aussie Invader 5R (com o tanque cheio).

Para suportar peso e, principalmente, velocidade, as rodas são um capítulo a parte. Nada de borracha como nos veículos comuns: os carros supersônicos usam peças de liga metálica feitas sob medida, para manter a forma mesmo acima dos 1.000 km/h. Já a fuselagem é de fibra de carbono, o mesmo material usado na Fórmula 1, e ligas metálicas, dependendo da área.

As particularidades, porém, são muito mais interessantes.

BLOODHOUND SSC (Inglaterra): motores de jato, foguete e F-1

Mais estruturada entre as três equipes, a Bloodhound inglesa usa três motores diferentes. A potência para chegar aos 1.600 km/h vem da combinação de turbinas de jato e de foguete, que usam combustíveis especiais. A escolha de propulsão híbrida foi feita para aumentar o controle sobre o carro: usar só um foguete garantiria a potência necessária, mas usando um foguete menor, mais um motor a jato, o piloto ganha dirigibilidade.

Além disso, o terceiro motor foi criado, inicialmente, para carros de Fórmula 1 e não serve para ganhar velocidade. O modelos Cosworth CA2010, o mesmo que equipou os carros de Williams, Lotus, HRT e Virgin no Mundial de F-1 de 2010, é usado no Bloodhound para fornecer energia para os diferentes sistemas do veículo, inclusive o bombeamento do combustível para o motor de foguete.

AMERICAN EAGLE (EUA): um jato transformado em carro

  • American Eagle

Mais longo dos três concorrentes, com 17,7 metros, o American Eagle é, na verdade, um avião que foi transformado em carro. A equipe norte-americana usou um jato F-104 Starfighter da Nasa, usado como apoio nas missões espaciais e em testes de voo supersônicos, cortou suas asas e adaptou rodas para a tentativa de quebra de recorde.

Apesar da garantia de que, pelo menos no ar, o american Eagle já quebrou a barreira do som, no solo o time enfrenta dificuldades justamente pela adaptação ao solo. Inicialmente, o veículo teria apenas dois conjuntos de rodas, na frente e na traseira, mas após os primeiros testes um terceiro foi incluído no meio da fuselagem, para impedir que o corpo do carro sofra qualquer tipo de deformação.

AUSSIE INVADER 5R (Austrália): 200 mil cavalos de potência

  • AFP

    Rosco McGlashan mostra modelo do Aussie Invader e a primeira das rodas especiais de liga metalica

Para os australianos do Aussie Invader, a palavra chave é potência. Eles são os únicos a apostar em um foguete isolado para mover o carro. O motor, cuja interface ficou pronta em setembro, tem potência anunciada de 200 mil cavalos – como comparação, o sistema híbrido de propulsão do Bloodhound tem 135 mil. Para alimentar tanta força, o piloto Rosco McGlashan vai usar 2,8 toneladas de oxigênio líquido e biocombustível a base de querosene como combustível.

Na semana passada, McGlashan, mostrou a primeira das rodas especiais, feitas com uma liga metálica para suportar a velocidade de 1.600 km/h. “Acredito que podemos tirar o recorde dos ingleses. Eles são os donos dessa marca há tempo demais. Nosso carro é mais potente, temos uma equipe menor, mas muito focada”, disse o piloto.

OUTRAS EQUIPES: australianos, neozelandeses e reciclagens da Nasa

  • Sonic Wind

Os outros concorrentes estão em fases iniciais de seu projeto. O JetBlack foi pensado para mostrar para o mundo a tecnologia da Nova Zelândia e o  calendário prevê colocar o carro na pista em até cinco anos. O projeto é parecido com o do Bloodhound, com um sistema de propulsão híbrido, usando motores de jato e dois foguetes diferentes.

Os australianos do Bullet Project também se parecem com o projeto inglês, mas na área de educação. O objetivo é criar um programa de pesquisa para cientistas do país desenvolverem veículos rápidos. Um deles, para a quebra de recorde, terá propulsão a jato ou foguete, mas também estão nos planos carros rápidos movidos a energia elétrica e eólica.

Os norte-americanos do Sonic Wind LSRV são os mais inusitados do trio. O carro é um projeto pessoal do engenheiro Waldo Stakes: ele comprou uma série de peças usadas pela Nasa e está montando o veículo (da foto acima) no quintal de sua casa. Alguns dos componentes, inclusive, fizeram parte de módulos espaciais como os Apollo, que levaram os homens à Lua, e satélites. Se Stakes conseguir construir o carro, a ideia é colocar uma mulher na direção – e ele já tem duas pilotos da força aérea dos EUA para o posto.