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Pilotar carro de controle remoto custa R$ 10 mil e tem mecânico de verdade

Maurício Dehò

Do UOL, em São Paulo

01/05/2014 06h00

Brincadeira inocente, pilotar carrinhos de controle remoto é uma das diversões preferidas da criançada. Mas não é porque garotos crescem que isso não pode virar um passatempo adulto e muito mais sério. Neste fim de semana, a cidade de Paulínia (SP) recebe mais de uma centena de “crianças-grandes” que estão gastando em torno de R$ 10 mil e levando até mecânicos em busca de uma adrenalina que eles juram ser igual a de pilotar um carro de verdade – a até 60 km/h.

De empresários a ex-pilotos frustrados por lesões, o Sul-Americano de Automodelismo Off Road atrai competidores de cinco países e até figuras inusitadas. Que o diga Shi Heng, que trocou seu trabalho em pastelarias – “coisa de chinês”, brinca ele – pelo mundo dos carrinhos de controle remoto, como mecânico. Ele tem uma loja de peças e manutenção em São Paulo e vai acompanhar pilotos ao lado da pista, acertando todos os detalhes que se veem em qualquer automóvel de competição: do motor à suspensão, do chassis às trocas de pneus e reabastecimentos.

“Eu brincava com um pessoal, praticava um pouco. Depois que vendemos a pastelaria, eu fiquei um mês à toa e, como conhecia, comecei a mexer um pouco nos carrinhos, quebrar um galho, regular motor... Até que virei mecânico e só trabalho com esses carrinhos mesmo”, conta Heng, desde 1999 no ramo, mas há quase três décadas praticante de automodelismo.

Não basta pegar um controle remoto e sair acelerando. Para Heng, ser especialista no assunto é uma necessidade. Os pilotos que levam a sério a disputa às vezes têm até dois mecânicos para cuidar de um carrinho. “Na parte de acerto de chassis, é igualzinho a mexer um carro de F-1, ou qualquer outra prova. Tem acerto de suspensão, óleo de suspensão, diferenciais... O trabalho do mecânico com o piloto é muito próximo. Cabe ao piloto falar como o comportamento do carro está e nós também analisamos para fazer os acertos e regulagens, que mudam pra cada piloto”, explica.

Peças, gastos e adrenalina

No Sul-Americano deste fim de semana, todos os carros operam com metanol e não bastasse reabastecimentos, eles também trocam pneus regularmente. Para a competição off-road, em uma pista de terra, é necessário ter três modelos de pneus, cada um com variações de dureza, e ainda quatro ou cinco jogos de reposição. As peças de reposição se somam, vão destas mais descartáveis a mais fundamentais, como motor e suspensão, por exemplo.

O responsável pela pista de Paulínia é Rodrigo Bergamo, que costuma competir, mas fará o esforço de não entrar na pista para acompanhar todos os detalhes externos à competição. O Sul-Americano terá 110 pilotos: Brasil, Argentina, Chile, Venezuela e Bolívia estão na disputa, além de dois norte-americanos convidados que não concorrem ao título.

Automodelismo - Divulgação - Divulgação
Os carros passam por reabastecimento a cada cerca de dez minutos em ação. Pneus também são trocados constantemente para buscar o melhor acerto. Cada piloto leva tipos diferentes de texturas e compostos
Imagem: Divulgação

“A logística é quase como a de uma corrida de Fórmula 1. Teremos treinos livres, treino cronometrado para definição de grid e as provas são em mata-mata, partindo das quartas de final até a final, sempre com 12 carros por bateria”, explica Bergamo. Serão duas categorias na pista, ambas em escala 1:8 em relação a carros reais: bug e trug.

Sobre os gastos, ele admite que não é barato entrar na brincadeira. “Para iniciar nessas corridas, gasta-se em torno de R$ 4 a 5 mil reais para ter o equipamento. Mas no dia da prova tem custo de combustível, de pneus, mecânico... Temos as ‘Ferraris’ e os equipamentos mais simples, mas dá para gastar em torno de R$ 10 mil só para um fim de semana”, detalha ele, que aos 38 anos trabalha em uma agência de publicidade e tem a pista como hobby. O conjunto carro/motor pode custar R$ 4 mil.

O perfil dos competidores é variado e ainda há muito poucos profissionais no Brasil. Alguns adolescentes costumam aparecer, mas a maioria já são pilotos com mais de 30 anos, muitos deles empresários que trabalham de segunda a sexta e querem uma diversão diferente no fim de semana.

“A gente investe, ganha pouco, mas é porque gosta. A competição é uma miniatura de uma corrida de carro, de caminhão, o que seja. E é mais seguro, o cara escolhe algo mais tranquilo, mas a adrenalina é a mesma de pilotar um carro”, garante Bergamo.

“Tem telemetria, é preciso de habilidade na mão, comunicação com o boxe... É toda uma logística de corrida. O pessoal fala: ‘vocês brincam de carrinho’. Mas é mais que isso. São carros que aceleram a até 60 km/h, voam mais de 5 metros nas rampas... É bem maluco!”. Como ele diz, é tudo na raça. A competição não traz premiação em dinheiro e a recordação aos vencedores fica na memória e em formato de troféu.