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"Estou louca para me aposentar", diz Mari, 31, campeã olímpica no vôlei

Mari, vôlei

  • As pessoas têm que entender que tenho um lado germânico, a minha cara não esconde. Mas eu tenho amor à camisa da seleção brasileira, não da Alemanha

    Mari, campeã olímpica de vôlei

Bruno Doro e Karla Torralba

Do UOL, em São Paulo

22/11/2014 06h01

Quem não se lembra da semifinal da Olimpíada de 2004 contra a Rússia em que o Brasil sofreu uma virada histórica que abalou o vôlei feminino? E a superação de quatro anos depois, em Pequim, com o ouro em cima dos Estados Unidos? Mari foi protagonista desses dois momentos e é lembrada até hoje por eles. Hoje, a campeã olímpica deixou a seleção e joga no pentacampeão nacional Osasco. Aos 31 anos, ela aguarda ansiosamente a aposentadoria.

“Todo mundo chega a um nível em que fala: 'Já deu'. Ainda não cheguei ao meu, mas está perto. Sinto que tenho coisas a acrescentar, mas acredito que minha carreira não passe de cinco anos, no máximo. Talvez três”, disse em entrevista ao UOL Esporte.

Esse duelo entre a vontade de seguir em quadra e o desejo de se livrar das dores da carreira profissional existe em vários atletas. Mas está muito mais presente na vida da ponteira do Molico/Nestlé, que é favorito ao título da Superliga.

“Vilã” e campeã pela seleção brasileira, Mari brigou com o técnico que a cortou da que seria sua terceira Olimpíada, José Roberto Guimarães, em Londres-2012, e enfrentou mais operações nos últimos anos do que a maioria de nós vai passar por uma vida inteira – foram três, uma em cada joelho e uma no ombro.

“O que eu era com 20 anos, eu não vou ser mais. Você joga mais na experiência, mais no jeito que na força. Ninguém chega aos 35 anos voando. Faço parte das pessoas normais”, explica a jogadora.

Normal mesmo: perto de se aposentar, ela não sabe o que vai fazer. E sonha com carreiras que estão bem longe do vôlei. Em alguns anos, você pode ouvir falar de Mari, a especialista em reformas de veículos. Ou a ex-jogadora que virou protetora dos cachorros de rua. Até mesmo da campeã olímpica que abriu um café de sucesso. Quem sabe? Ela é suficientemente normal para cada uma delas...

Confira a entrevista:

UOL Esporte: Você ainda pensa em seleção brasileira, depois de tudo o que aconteceu?
Minha história na seleção teve um ponto final. Já fiz muita coisa para o Brasil. Ajudei muito, passei tudo que podia dar. Me sacrifiquei, dei meu sangue, meu tempo, meu joelho. Acho que o que eu podia fazer, eu fiz. E fiz bem feito.

UOL Esporte: E sua relação com o Zé Roberto?
Acho que o Zé Roberto é um assunto à parte. Não tenho nada a ver com ele, então acho que não tenho nada a falar. Ele me ajudou, assim como eu o ajudei. Mas não posso comentar sobre essa ruptura.

Mari, vôlei

  • Acredito que minha carreira não passe de cinco anos, no máximo. Talvez três. Eu não quero ficar me arrastando

    Mari, campeã olímpica pelo Brasil

UOL Esporte: Sobre você jogar pela seleção da Alemanha. Existe essa chance?
É uma conversa superficial, não tem nada certo. Foi uma programação que pode vir acontecer em algum momento. Não tem nada certo ou programado. Foi uma coisa que surgiu há anos. O Giovanni (Guidetti, técnico da Alemanha) é meu amigo. E fala isso há bastante tempo.

UOL Esporte: A sua identificação com a torcida brasileira pesa para defender a Alemanha?
A torcida pesa. Não apenas a torcida, mas o meu carinho pelo Brasil e tudo que fiz na seleção também pesa. Não é fácil largar uma seleção que me dediquei tanto e depois de vários anos trocar. Eu tenho amor à camisa da seleção brasileira, não da Alemanha. Eu tenho uma possibilidade de mais uma Olimpíada como experiência. A minha família tem descendência e não vejo problema. Não vou jogar por amor. Amor à camisa foi o Brasil e isso não vai mudar nunca.  As pessoas têm que entender que tenho um lado germânico, a minha cara não esconde. As pessoas têm de ter um respeito comigo e com a minha decisão. Eu não vou trocar nunca, amor é pelo Brasil. Se for por experiência, por bagagem nova. As pessoas têm que respeitar a minha decisão.

UOL Esporte: Você está em uma fase de retomada de carreira. Acha que pode voltar a jogar no mesmo nível de antes?
Depois de uma lesão, a gente chega à estaca zero. Chega ao nível de uma pessoa paraplégica, anda de cadeira de rodas, não consegue nem pisar no chão. A volta de cirurgia, para todos os jogadores, tem uma queda de rendimento. Às vezes, nunca mais volta ao nível. Eu diria que, três lesões graves depois, eu estou até bem. É claro que não vou ser mais o que era quando tinha 20 anos. Eu já tenho 31.

Mari, vôlei

  • Ajudei muito a seleção brasileira, passei tudo que podia dar. Me sacrifiquei, dei meu sangue, meu tempo, meu joelho

    Mari, campeã olímpica pelo Brasil

UOL Esporte: Já pensa em se aposentar?
Estou louca para me aposentar. Todo mundo chega a um nível em que fala: 'Já deu'. Ainda não cheguei ao meu, mas está perto. Sinto que tenho coisas a acrescentar, mas acredito que minha carreira não passe de cinco anos, no máximo. Talvez três. Eu nem quero ficar me arrastando, sentir dor todo dia. Eu sei que meu momento de parar não vai demorar muito. Estou tentando fazer outras coisas, me preparando. Tem muita atleta que não quer parar, fica desnorteada, em um deserto. Estou me preparando desde a segunda lesão no joelho.

UOL Esporte: O que você pensa em fazer após se aposentar?
São várias coisas. Eu gosto muito de carros antigos. Venho pesquisando, vou a eventos, palestras. Também tenho conversado para montar uma ONG para ajudar animais de rua. E gosto muito de café, acho bacana ter uma cafeteria gourmet. E também queria morar fora, por isso não posso me enraizar muito. Devo ter mais de 10 ideias. Tenho que escolher uma e me focar.

UOL Esporte: Carros antigos?
Os carros são um hobby interessante. Os antigos valorizam. Quanto mais antigo, mais original, vale mais. Comprar um carro antigo é como euro, você deixa guardado e depois vende. Eu acho muito legal. Tenho uma coleção pequena, com dois fuscas e uma caminhonete. Estou à procura do quarto, mas ainda não tenho tempo para me jogar e fazer as coisas. A restauração é cara e de difícil acesso. Enquanto não tenho tempo, vou dando passinhos.