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Com gestão capenga, futebol brasileiro ainda patina no faturamento

O consultor de marketing e gestão esportiva Amir Somoggi analisou os balanços dos clubes brasileiros - Divulgação
O consultor de marketing e gestão esportiva Amir Somoggi analisou os balanços dos clubes brasileiros Imagem: Divulgação
José Cruz

09/05/2019 04h00

O privilegiado refinanciamento da dívida fiscal dos clubes de futebol em 240 meses com perdão de multas e juro subsidiado, e o "legado" da Copa 2014 não ajudaram muito os principais clubes nacionais a evoluir de forma significativa em suas finanças. Apesar de estádios novos e outros modernizados, a principal fonte de renda não vem das bilheterias, mas da televisão e da venda de jogadores para o exterior.

"Em 2014, o faturamento dos clubes Top 20 era de R$ 3,1 bilhões. Atualmente é de R$ 5,3 bilhões (69% de crescimento). Mas não cresceu por boa gestão dos times ou exploração de oportunidades e, sim, pelo dinheiro da TV e venda de jogadores."
A observação é de Amir Somoggi, consultor de marketing e gestão esportiva da SportsValue, que anualmente analisa os balanços dos clubes para avaliar o tamanho do mercado do nosso futebol.

Em números mais atuais, Amir concluiu que em 2018 os 20 principais clubes faturaram R$ 5,26 bilhões, um recorde. Mas o crescimento sobre 2017 (R$ 5,14 bi) foi de apenas 2,4%. "Esse crescimento foi muito afetado pelas receitas com transferências, que atingiram R$ 1,3 bilhão em 2018, o maior valor da história", afirmou o analista.

A Copa de 2014 influenciou o desempenho financeiro dos clubes, em 2018?

Amir Somoggi - A Copa do Mundo afetou muito as finanças dos times brasileiros, alguns positivamente e muitos negativamente. Os novos estádios trouxeram novas receitas para os times que negociaram a bilheteria para si. Os que sonharam em ser sócios dos empreendimentos sofreram negativamente. Assim, Internacional, Flamengo, Athletico-PR e Palmeiras (que não estava na Copa, mas teve um novo estádio) ficaram com a bilheteria e junto com o sócio-torcedor conseguiram crescer. O Athletico é o único 100% dono de todas as receitas. Hoje fatura R$ 38 milhões com a arena, mas deveria faturar R$ 80 milhões por ano. Já o Palmeiras fatura R$ 164 milhões entre bilheteria e sócio-torcedor. Já Grêmio e Corinthians ficaram sem bilheteria e perderam receitas na comparação com outros. Os demais estádios da Copa são um fiasco.

Quanto o mercado de futebol cresceu no Brasil em comparação a 2014?

Em 2014, vivíamos um período de estagnação completa. As receitas dos times Top 20, representavam 81% do mercado de futebol no Brasil, era de R$ 3,1 bilhões, a mesma de 2013 e 2012. Atualmente o faturamento é de R$ 5,3 bilhões (69% de crescimento). Mas não cresceu por boa gestão dos times ou exploração de oportunidades e, sim, pelo dinheiro da TV e venda de jogadores. Em 2014, a TV pagava R$ 1,1 bilhão para os clubes e atualmente está em R$ 2,01 bilhões. Já as transferências que eram R$ 436 milhões em 2014 estão agora em incrível R$ 1,3 bilhão. Juntos, representam 62% do total faturado em 2018. Entre 2014 e 2018, a bilheteria passou de R$ 311 milhões para R$ 421 milhões (mais 35%). Já os patrocínios subiram de R$ 467 milhões para R$ 523 milhões (12%).

Quais os principais clubes exportadores de atletas e quanto eles faturaram em 2018?

Os times que mais faturaram são: Palmeiras (R$ 170 milhões), São Paulo (R$ 155 milhões), Grêmio (R$ 132 milhões), Fluminense (R$ 119 milhões) e Corinthians (R$ 119 milhões). O São Paulo é disparado o que mais fatura com atletas na história. Entre 2003 e 2018, gerou R$ 1,08 bilhão em transferências de jogadores.

O Profut, que refinanciou a dívida fiscal, ajudou a fortalecer as finanças dos clubes analisados?

O Profut foi mais uma tentativa frustrada de ajudar os clubes, pois começou errado. Os sonegadores receberam de presente em 2015 mais de R$ 700 milhões em receitas financeiras pelos descontos obtidos. Uma vergonha! E agora quatro anos depois, as dívidas fiscais subiram! O Profut não vai arrumar a gestão do futebol brasileiro, assim como a Timemania e a Lei de Moralização não conseguiram. O único caminho são punições severas por má gestão. Temos clubes como Corinthians, Cruzeiro e Atlético-MG sendo campeões e acumulando déficits. Aqui se premia a má gestão e se pune a boa administração.

As vendas de ingressos continuam inexpressivas frente às demais fontes de renda dos clubes. Qual o motivo?

Isso se deve à péssima gestão dos clubes. Nem o preço dos ingressos nem o horário dos jogos é motivo suficiente para tamanha incapacidade de gerar receitas. Os times vivem na cultura de só lotar os estádios quando vale algo em termos esportivos. Não sabem como encher os estádios em jogos de menor expressão. Muitos times têm 100 mil, 120 mil sócios, e médias abaixo de 25 mil por jogo. O caminho é estudar os modelos bem-sucedidos no mundo e explorar oportunidades. Os times falham muito na gestão.

Qual o clube que melhor explorou a sua marca comercialmente?

Foi o Palmeiras (R$ 95 milhões), seguido do Flamengo (R$ 90 milhões) e Corinthians (R$ 43 milhões). São valores ridículos, já que o Palmeiras só fatura isso por conta do apoio da Crefisa.

Quais as principais fontes de receitas dos clubes em 2018?

As principais receitas dos Top 20 em 2018 são: TV (38%), Transferências (24%), Sócios (12%), Patrocínios (10%), Bilheteria (8%) e Outras (8%).

Como estão as finanças da CBF segundo o balanço de 2018?

Em 2018, a CBF teve um faturamento de R$ 617 milhões, com crescimento de 13% sobre o ano anterior. Isso significa que a CBF teve um lucro líquido de R$ 52 milhões, sendo que o lucro acumulado nos últimos 16 anos é de R$ 640 milhões.

E o desempenho dos patrocínios?

As receitas com patrocínios caíram 23% em três anos. Eram R$ 411 milhões em 2016 e são R$ 318 milhões em 2018. Já os salários e gastos administrativos somaram R$ 166 milhões. Mas aqui cabe uma comparação: os Top 20 times do Brasil tinham R$ 86 milhões em caixa em 2018. O Corinthians, por exemplo, registrou R$ 1,1 milhão em caixa, enquanto a CBF tem R$ 517 milhões. Realmente tem algo muito errado no futebol brasileiro.

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