Esporte

Eleição da Fifa

Arnd Wiegmann/Reuters

Para parecer honesta

Escândalos levam a Fifa ao 1º grande pleito em 42 anos

Do UOL, em São Paulo
Arnd Wiegmann/Reuters

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Cachorro mordido por cobra tem medo até de salsicha. Por Juca Kfouri

A Fifa joga nesta eleição o seu futuro como entidade minimamente confiável. Menos por virtude, mais por necessidade diante da debandada e ultimatos de seus patrocinadores, cansados da crônica policial que os confunde com a mais poderosa organização esportiva do planeta.

A exemplo do que houve, parcialmente, no Comitê Olímpico Internacional , a Fifa precisa, ao menos, parecer honesta.

Acostumada com processos eleitorais viciados desde que João Havelange se elegeu presidente, em 1974, é possível que pela primeira vez desde então -- e lá se vão 42 anos! -- tenhamos um pleito sem compras de votos, porque cachorros mordidos por cobras têm medo de salsichas. 

Alguém mais cético haverá de garantir que apenas mudarão os métodos de convencimento, cercados de mais cautelas.

O atual secretário-geral da Uefa, Gianni Infantino, emerge como o favorito entre os cinco candidatos, novidade num processo eleitoral habituado a ter candidaturas únicas ou, no máximo, entre dois pretendentes.

Pesa contra ele o temor de nova europeização da Fifa, embora acene com um secretário-geral marroquino, que representa o maior número de eleitores, os do continente africano.

Infantino propõe ainda que a Copa do Mundo tenha 40 participantes e seja sediada por mais de um país, além de aumentar consideravelmente a distribuição do percentual dos lucros da Fifa entre as confederações continentais, algo que soa como música aos ouvidos da cartolagem mundial.

Dos quatro adversários na disputa pela presidência da Fifa, o xeque do Bahrein Salman Bin Ebrahim Al-Khalifa, presidente da Confederação Asiática; o empresário sul-africano Tokyo Sexwale; o príncipe jordaniano Ali Bin Al-Hussein, ex-vice-presidente da Fifa, e o francês Jèrôme Champagne, ex-secretário-geral adjunto da Fifa, este último é quem tem a melhor plataforma.

Champagne, apesar de francês, se opõe ao eurocentrismo, defende o desenvolvimento do futebol no Terceiro Mundo, é adepto da utilização de tecnologia na arbitragem dos jogos de futebol e combate o poder dos clubes europeus, seu calcanhar de Aquiles.

De passado inatacável, ele rema contra a maré da globalização ao se opor ao que há de mais bem-sucedido no mundo do futebol, a Liga dos Campeões da Europa.

De fato, quando os principais clubes do Velho Continente são verdadeiras legiões estrangeiras, parece ingênuo brigar contra eles, ainda mais diante do inegável sucesso do torneio que promovem anualmente.

Como se diz que o que sai das urnas é tão imprevisível como o que sai da cabeça de juízes, é até possível um resultado surpreendente no pleito desta sexta-feira, em Zurique, como a vitória do xeque (não cheque!) do Bahrein.

Certeza há apenas uma: Marco Polo Del Nero não estará entre os eleitores, encalacrado pelo escândalo que fez da Fifa uma transnacional criminosa.

Os candidatos

  • Jérôme Champagne

    francês, 57 anos, diplomata e atualmente consultor de futebol internacional. Trabalhou no COL da Copa do Mundo de 1998 e, na sequência, na Fifa - entre 1999 e 2010

    Imagem: Daniel Marenco/Folhapress
  • Príncipe Ali Al Hussein

    jordaniano, 40 anos, filho do rei Hussein da Jordânia e vice-presidente da Fifa para a Confederação Asiática. Foi candidato na tumultuada eleição de 2015

    Imagem: Dave Thompson/Getty Images
  • Xeque Salman Bin Ibrahim Al-Khalifa

    membro da família real do Bahrein, 50 anos, presidente da Confederação Asiática de Futebol

    Imagem: AP Photo/Vincent Thian
  • Gianni Infantino

    ítalo-suíço, 46 anos, formado em direito e com sua carreira consolidada na Uefa. Trabalha na entidade desde 2000 - é o secretário-geral desde 2009

    Imagem: FABRICE COFFRINI
  • Tokyo Sexwale

    sul-africano, 62 anos, empresário e ex-preso político da época do Apartheid

    Imagem: AFP PHOTO / JACK GUEZ

Blogueiros analisam futuro da entidade

Quem apoia cada um

  • Pelé e figurões

    Jérôme Champagne tem o Rei do Futebol, George Weah, Marco Van Basten, Lilian Thuran e Bernard Lama (ex-goleiro francês) como cabos eleitorais. Mas tem baixo apoio entre as associações nacionais.

  • Forte só em casa

    Príncipe Ali Al Hussein tem apoio da própria Federação da Jordânia e algumas entidades asiáticas

  • Pesos pesados

    Xeque Salman Bin Ibrahim Al-Khalifa tem como principal aliada a Confederação Africana (54 dos 209 votos da eleição), além dos votos de parte dos países da Ásia

  • Favorito

    Gianni Infantino conta com a simpatia de Figo, Roberto Carlos, Alex Ferguson, Davor Suker e votos de países da Concacaf, Conmebol, Comitê Executivo da UEFA, e a maioria das associações nacionais da Europa como Alemanha, Inglaterra, França, Espanha e Itália

  • Lanterna

    Tokyo Sexwale não tem apoios de relevância, ainda vê seu continente votar em bloco no Xeque Al-Khalifa. Não divulgou nem mesmo as federações que registraram sua campanha

O que prometem?

  • Jérôme Champagne

    Defende, principalmente, uma Fifa mais "humilde". O francês pauta sua candidatura em três partes: democratização da Fifa, vontade de lutar contra os desequilíbrios atuais, criticando o predomínio de fortes clubes europeus, e a mudança de governança da Fifa. Seu discurso é similar ao do ex-presidente Joseph Blatter. Entre algumas de suas promessas, ele pretende levar a Copa de 2022 para os EUA em caso de comprovações de irregularidades na campanha do Qatar. O diplomata ainda defende uma entidade com menos gastos em administração e organizações de eventos. Ele acredita que isso melhorará a imagem da Fifa.

    Imagem: AFP PHOTO/HO/SUPREME COMMITTEE FOR DELIVERY AND LEGACY
  • Príncipe Ali Al Hussein

    Como boa parte dos candidatos, fala em recuperar a desgastada imagem da entidade. Seu plano tenta "restaurar a credibilidade e reputação da Fifa", bem como "servir o futebol e às associações-membro". Promete a criação de um conselho da Fifa que priorize ex-jogadores, treinadores e árbitros, para ajudar a rever as alterações propostas. Sobre a Copa do Mundo, ele garante que irá proteger todas as vagas atuais, apesar de falar em reorganizar o acesso - possibilitando um aumento de países participantes a partir de 2026. Não esconde sua preferência por desenvolver o futebol chinês e fala sempre que pretende ver o país mais populoso do mundo sediando uma Copa em breve.

    Imagem: Arnd Wiegmann/Reuters
  • Xeque Salman Bin Ibrahim Al-Khalifa

    A principal ideia do candidato do Bahrein é separar a Fifa em duas instituições independentes: uma administraria apenas o futebol, enquanto a outra cuidaria dos interesses comerciais - financeiro, marketing, patrocínio e direitos de TV. Para ele, isso diminuiria os problemas recentes.

    Imagem: Fernando Moura/UOL
  • Gianni Infantino

    Pauta sua campanha em três pilares: reformas e boa governança, desenvolvimento do futebol e democracia e participação. O candidato ainda pretende criar um novo Conselho da Fifa, com nove integrantes da Uefa, cinco da Concacaf, cinco da Conmebol, três da Oceania, sete da África e sete da Ásia. Após anos de polêmicas na Fifa, Infantino promete controle rigoroso dos fluxos monetários. O italiano ainda diz que irá despejar mais de 50 milhões de dólares ao longo de quatro anos para o desenvolvimento das federações mais necessitadas - para projetos, deslocação e realização de torneios de jovens. Infantino pretende aumentar para 40 o número de seleções na Copa do Mundo, com a justificativa de uma maior representatividade mundial (5 vagas para Concacaf, 5 para Conmebol, 14 para Uefa, 7 para África, 6 para Ásia, 1 para Oceania, 1 do país-anfitrião e 1 vaga por mérito desportivo).

    Imagem: Clive Rose/Getty Images
  • Tokyo Sexwale

    Sem grandes propostas concretas, o sul-americano tem um objetivo claro na campanha: tirar a Fifa das mãos de europeus. Candidato com menos força política no futebol, ele quer um presidente africano ou asiático

    Imagem: REUTERS/Ueslei Marcelino
FABRICE COFFRINI/AFP

Como funciona a votação

São 209 associações nacionais que poderão escolher entre cinco candidatos quem será o sucessor do afastado Joseph Blatter pelos próximos quatro anos. Para ser eleito em primeiro turno, o postulante precisará ter dois terços dos votos – que são secretos. Se isso não acontecer – que é a tendência – haverá um segundo turno com os dois mais votados, precisando da maioria simples para assumir ser definido o próximo mandatário.

A cronologia da crise

E quem leva?

EFE/Cyril Zingaro EFE/Cyril Zingaro

O político

Secretário-geral da Uefa desde 2009 e membro da alta cúpula da entidade europeia há mais de uma década, Infantino é o candidato de maior peso político-esportivo do pleito. Com experiência em grandes torneios e decisões, além de influência direta em algumas das principais confederações do mundo, o dirigente ítalo-suíço assume o protagonismo da disputa ao contar com apoio de inúmeras países da Europa, Conmebol e Concacaf. Larga na frente na briga pela maioria dos 209 votos.

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O dono da grana

Se por um lado Gianni Infantino desponta como a grande figura política da histórica disputa, o Xeque Salman Bin Ibrahim Al-Khalifa surge como o principal ícone financeiro da briga pela cadeira principal da Fifa. Sem o peso esportivo do rival, o presidente da Confederação Asiática aposta alto na grana que tem para atrair eleitores. E foi assim que conseguiu um apoio considerado fundamental na briga: o da Confederação Africana e seus mais de 50 votos. Mesmo sem reconhecer a tática, é assim que ele soma esse eleitorado ao de algumas confederações asiáticas.

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