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Saque e Voleio

Silêncio é maior prova de que Brasil precisa de atletas com poder de voto

Alexandre Cossenza

29/11/2017 07h00

Quem passou pelo Saque e Voleio ontem viu um longo texto sobre a polêmica votação na assembleia geral do COB e como a Confederação Brasileira de Tênis (CBT) votou por uma representação menor de atletas nas tomadas de decisão do órgão que comanda o esporte olímpico no país. Rafael Westrupp votou por cinco atletas quando havia a opção por 12 desportistas com poder de decisão.

O texto publicado nesta segunda-feira também registra as opiniões dos atletas que quiseram se manifestar sobre o assunto. Rogerinho foi o único a se mostrar claramente contra o voto da CBT e de outras 14 confederações. Bruno Soares, por sua vez, declarou ter entendido a opção de Westrupp. Bia Haddad Maia, Thomaz Bellucci, Thiago Monteiro, Marcelo Melo, Marcelo Demoliner e até André Sá, presidente da comissão de atletas, preferiram não opinar.

O que diz o silêncio dos atletas? Muita coisa. A começar pelos motivos para esse não pronunciamento. Não vou presumir quem se encaixa em qual caso, mas é fácil elencar uma série de razões. Alguns não têm conhecimento do assunto. Outros não têm vontade de se inteirar da questão. Uns não têm vontade e nem conhecimento. Também há aqueles com interesses pessoais que podem ser prejudicados no caso de críticas à entidade que controla o tênis (e dá ajuda financeira).

Basta ir a um torneio profissional – eu fui a três recentemente – para ouvir todo tipo de queixa sobre a CBT e seu presidente. Questões envolvendo treinamento de jovens atletas, os critérios escolhidos para distribuir auxílio financeiro e as academias parceiras (como Tennis Route e ADK) e até o salário de Westrupp, cuja composição parece ser um mistério para alguns. Coisas que ouvi de pais, tenistas profissionais (vários deles têm várias queixas), managers e treinadores.

Gente que não tem coragem de falar em público porque teme represálias, boicotes e o fechamento da torneira que ajuda alguns a iniciarem e/ou prolongarem suas carreiras. E teme com razão porque a CBT adotou um duro regime de represálias durante a gestão Jorge Lacerda – da qual Westrupp foi parte integrante e atuante – que incluiu ameaças a árbitros, juvenis e veteranos que disputassem eventos da promotora Try Sports, veto ao credenciamento da jornalista Diana Gabanyi em eventos da CBT e inclusive a não indicação de Thomaz Koch ao Commitment Award da Copa Davis.

O tênis brasileiro, não é segredo nenhum, sempre teve conflitos de interesse. De todo tipo, e todo mundo sempre soube disso. É o integrante de conselho fiscal dono de hotel oficial de torneios da CBT, é o presidente de federação integrado de graça à equipe da Copa Davis, é comentarista que capta dinheiro para torneio via CBT e depois elogia o presidente na TV, é empresário de jogador envolvido em questões que vão além do atleta… Tem jornalista envolvido também. Cada um corre atrás do seu e se defende como pode.

Aonde quero chegar? Que é compreensível que este ou aquele atleta não queira se manifestar contra a CBT, uma entidade que há anos não lida muito bem com opiniões contrárias. Egoísta, mas compreensível. E é por isso – exatamente por isso – que o Brasil precisa de mais atletas com poder de decisão. Com mais atletas envolvidos no processo, menor a chance de politicagem. Menor a chance de políticos se eternizarem no poder fazendo seu joguinho de troca de favore$$$.

Os motivos e as respostas evasivas

Diante de tudo que coloquei acima, que vale para o tênis, mas para um bocado de outras modalidades (já cobri, em menor volume, futebol, judô, remo, tiro, vela, vôlei e basquete e acompanhei todo tipo de briga de bastidores), fica a pergunta: por que será, então, que 15 confederações queriam uma representação menor de atletas nas assembleias do COB?

É infeliz a postura do presidente da CBT, Rafael Westrupp. Não só no voto pelos cinco atletas (em vez de 12), mas na falta de uma justificativa coerente. Se ele quer mesmo uma representação menor de atletas, que pelo menos saia e explique o porquê. Acha que 12 é muito? Tudo bem, então que diga isso em público. Em vez disso, Westrupp deu respostas evasivas e que podem até enganar quem lê. Uma delas está no post de ontem e que foi devidamente comentada lá, por isso não a reproduzirei aqui.

A outra foi um email enviado a atletas no qual Westrupp afirma, entre outras coisas, que votou a favor da "ampliação do colégio eleitoral do atletas, passando do atual 1 voto, para 5 votos. Ou seja, cinco vezes mais do que o estatuto anterior. Eu ainda propus para que daqui 2 anos possamos revisar o estatuto e então até ampliar ainda mais os votos dos atletas." Afirmação verdadeira, mas enganosa.

Em momento algum, o dirigente revela aos tenistas que havia a possibilidade de aprovar 12 votos de atletas. Em momento algum, Westrupp menciona que não havia a possibilidade de manter o colégio eleitoral dos atletas em um voto. Propôs revisar e talvez ampliar daqui a dois anos? Por que não agora? Por que não explicar? Por que não colocar as cartas na mesa e esclarecer sua posição? Em vez disso, Westrupp adotou um tom heroico para falar de do que ele classificou como "enorme passo que demos à democratização do esporte olímpico brasileiro." Só que democratização pede transparência, o que não vem ocorrendo na gestão Westrupp.

Conselhos de Ética, de Administração e Fiscal

Em sua carta aos tenistas, Westrupp também comemora a "criação de 3 Conselhos: Ética, De Administração e Fiscal". Entretanto, o Fiscal já existia, e o de Administração vai substituir um órgão que exercia a mesma função (o extinto Conselho Executivo). De novo mesmo, só o Conselho de Ética. Houve, sim, alterações, e qualquer um com um mínimo de interesse pode se informar no site do COB).

O que digo agora, no entanto, não diz respeito ao tênis, mas ao esporte em geral. Embora a composição dos conselhos dê margem para otimismo, é bom manter certa cautela e vigilância em respeito aos três órgãos. Exemplos por aí não falta. A FIFA, por exemplo, tinha Comitê Executivo, Comitê de Ética, Comitê de Finanças… e nada impediu os escândalos que acompanhamos nos últimos dois anos. A CBT sempre teve conselho fiscal, mas o manuseio da verba é sempre questionado (e, em alguns casos, investigado federalmente). Enfim… conselhos e comitês são ótimos, mas apenas se sua composição não for viciada e se seus integrantes forem fiscais íntegros – e também ajuda se eles forem fiscalizados com a rigidez necessária. Por enquanto, dado o histórico de instituições esportivas no Brasil, recomenda-se uma colherinha de cautela em cada copo cheio de otimismo.

Coisas que eu acho que acho:

É óbvio que ninguém é obrigado a se envolver em nada. Cada um tem suas preocupações, suas carreiras, seus problemas e suas prioridades. Mesmo assim, continuo a lamentar muito a falta de interesse de Bruno Soares, Marcelo Melo e André Sá em muitas questões que envolvem críticas à CBT. Os três são pessoas esclarecidas, belíssimos atletas e que já não dependem financeiramente de entidade nenhuma para nada. O tênis ganharia muito se pelo menos um dos três se envolvesse mais, cobrasse mais, perguntasse mais.

No vôlei, os atletas gritaram. Usaram suas redes sociais, deram entrevistas e redigiram uma carta assinada pela Comissão de Atletas. Por isso, CBV voltou atrás na votação do COB e anunciou que vai se colocar a favor de 12 atletas na próxima assembleia. Por que os nomes de peso do tênis também não se manifestaram?

Tenho respeito enorme pelo que os mineiros fizeram e continuam fazendo dentro de quadra, mas um já me disse que não quer se envolver nesse tipo de assunto, um não gosta nem de ler críticas à CBT e o outro é um presidente de Comissão de Atletas que não se manifesta nem quando a entidade vota justamente contra atletas. Só não vale, lá na frente, se o tênis brasileiro estiver enfiado em um buraco ainda mais profundo, alegar isenção de culpa. Quem se omite também tem sua parcela de responsabilidade.

É muito fácil alguém ler este longo post e dizer "nossa, que cara chato". Eu já sei que muita gente pensa assim. Se pedir transparência, explicações e atitude é ser chato, continuarei assim. Não tenho nada pessoal contra ninguém. Algumas das críticas feitas aqui, aliás, são direcionadas a pessoas que gosto bastante, mas não sei ser diferente. Não faço questão de agradar a todos. Se alguém quiser conversar comigo, meus contatos são bastante conhecidos. Quem quiser continuar me evitando, fique à vontade para fazê-lo.

Sobre o autor

Alexandre Cossenza é bacharel em direito e largou os tribunais para abraçar o jornalismo. Passou por redações grandes, cobre tênis profissionalmente há oito anos e também escreve sobre futebol. Já bateu bola com Nadal e Federer e acredita que é possível apreciar ambos em medidas iguais.
Contato: ac@cossenza.org

Sobre o blog

Se é sobre tênis, aparece aqui. Entrevistas, análises, curiosidades, crônicas e críticas. Às vezes fiscal, às vezes corneta, dependendo do dia, do assunto e de quem lê. Sempre crítico e autêntico, doa a quem doer.