No aniversário da conquista do ouro, relembre a trajetória da seleção masculina na Rio 2016
Faz exatamente um ano que um bloqueio de Lipe sobre Zaytsev rendeu à seleção brasileira masculina de vôlei a mais sofrida das três medalhas de ouro que conquistou em Jogos Olímpicos. Se uma geração de jovens jogadores encantou o país em Barcelona 1992 e uma das equipes mais vitoriosas da história do esporte se consagrou em Atenas 2004, foi com um time que seguiu à risca o ensinamento de transformar suor em ouro que o Brasil, na Rio 2016, quebrou uma escrita de seis anos sem títulos de grande relevo e fez a festa do torcedor no Macaranãzinho.
Vamos relembrar o caminho que levou a seleção à conquista da medalha de ouro naquela tarde de domingo, 21 de agosto de 2016.
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Jejum
Desde 2010, quando vencera a Liga Mundial na Argentina e o Campeonato Mundial da Itália, a seleção brasileira não subia ao topo do pódio em nenhuma das principais competições do voleibol internacional. Nesse período, o time comandado pelo técnico Bernardinho fora vencedor do Pan de Guadalajara 2011, da Copa dos Campeões 2013, dois torneios de relevo menor. Pesava na conta é que, desde então, além do bronze na Copa do Mundo 2011, havia sido prata nos Jogos de Londres 2012, no Mundial da Polônia 2014 e em quatro ligas mundiais.
Falar em "jejum" para uma seleção que em seis anos frequentara o pódio com tamanha assiduidade soa até injusto. Mas vale lembrar que, no Brasil, prevalece a ideia tosca de que "o segundo é o primeiro dos últimos". Por isso, quando a equipe nacional entrou em quadra contra o México, na estreia do torneio olímpico, a pressão sobre o time da casa era ainda maior.
Começo insosso
O bom voleibol apresentado pela seleção na Liga Mundial 2016 servia de alento para o torcedor brasileiro. Se, por um lado, o time colecionou mais um vice-campeonato, perdendo a final para a Sérvia (equipe que compensou a ausência nas olimpíadas concentrando esforço para levantar um título inédito), por outro, boas atuações especialmente diante da França, campeã europeia, e dos EUA, vencedora da Copa do Mundo, levavam a crer que o time brasileiro estava num bom caminho para a disputa no Rio.
No entanto, os dois primeiros jogos nas Olimpíadas – embora com resultados favoráveis – foram o sinal de que nem tudo estava bem.
Contra o México, seleção que chegou ao Rio graças a uma repescagem de nível técnico baixíssimo, o Brasil precisou virar para largar com vitória (3 a 1).
No jogo seguinte, diante do Canadá, que havia surpreendido com uma vitória por 3-0 sobre os EUA na estreia, a seleção se viu novamente atrás no marcador. Menos mal que a vitória por 3 sets a 1 assegurou mais três pontos aos brasileiros, mas pairava a sensação de que o time teria problemas nas três partidas seguintes, contra equipes do primeiro escalão do vôlei.
Turbulência
Enquanto o Brasil sofria para encontrar seu melhor voleibol, os EUA estavam desesperados. Não bastasse o revés contra o Canadá no primeiro jogo, os norte-americanos perderam por 3-1 para a Itália na segunda rodada e estavam zerados na competição.
Mas quando as duas seleções se encontraram na terceira rodada, prevaleceu o instinto de sobrevivência da seleção americana. Os EUA venceram o Brasil por 3 sets a 1 e arrancaram rumo a um lugar no pódio – terminariam na terceira posição.
A equipe brasileira, por sua vez, viu materializado o receio das partidas iniciais: àquela altura, não estava jogando o suficiente para confrontar grandes seleções. Caiu contra os EUA e, em seguida, sofreria uma derrota inédita para a Itália na quarta rodada.
Em sete duelos anteriores na história dos Jogos Olímpicos, o Brasil nunca havia perdido para a seleção italiana. Quando os europeus derrubaram o tabu com um 3 a 1, o time brasileiro se viu em maus lençóis: pela primeira vez desde 1996, chegaria à última rodada da primeira fase ainda na luta pela classificação.
Brasil vs. França
Apesar da derrota, o jogo contra a Itália trouxe modificações significativas ao time brasileiro. Ausente nas três primeiras rodadas por conta de uma lesão na coxa, o central Maurício Souza assumiu a titularidade da equipe, em lugar de Éder, ao passo que Lipe, no decorrer da partida, entrou no lugar de Maurício Borges e não saiu mais do time.
Assim, contra a França, o Brasil entrou em quadra com Bruno, Wallace, Maurício Borges, Lucão, Lucarelli, Lipe e Serginho, time titular que se manteve até o fim da competição.
Na prática, o jogo foi a primeira decisão que a seleção brasileira encarou na Rio 2016. Por conta de campanhas irregulares (vitórias sobre México e Canadá, derrotas para EUA e Itália), Brasil e França disputariam uma partida com apelo surpreendente: se antes se acreditava que as equipes pudessem até decidir o destino da medalha de ouro, a situação mudara radicalmente e os dois times lutavam pela sobrevivência numa improvável disputa pelo quarto lugar da chave.
Numa partida tensa e equilibrada, o Brasil venceu por 3 a 1 a França. Naquele dia, o time francês, caracterizado naquele ciclo olímpico pelo jogo sólido na defesa e eficiente no ataque, cometeu 33 erros – dois dos quais do oposto Antonin Rouzier, nos dois pontos finais da partida. A seleção brasileira seguiu nas olimpíadas e o genial Earvin N'gapeth voltou para casa.
Drama e revanche
Classificar-se na quarta posição do grupo na primeira fase levou o Brasil a um duelo contra a Argentina nos playoffs, equipe que não vencia a seleção brasileira principal desde as quartas de final em Sydney 2000.
Treinada por Julio Velasco, que havia colocado a Itália no topo da modalidade nos anos 1990, a Argentina havia vencido quatro das cinco partidas que disputara na Rio 2016 – batera, inclusive, a Rússia por 3-0.
O Brasil venceu a Argentina por 3 sets a 1, numa partida em que, além de lidar com uma aplicada seleção argentina, encarou problemas de ordem física na ponta: na primeira etapa, Lucarelli, lesionado, deu lugar a Maurício Borges, mas voltou à quadra no quarto set, no sacrifício, para substituir Lipe, que também se lesionou!
Com o moral agora elevado depois de duas vitórias difíceis, o time brasileiro encontrou a Rússia nas semifinais, num duelo em que a camisa do adversário impunha mais respeito do que a situação requeria.
Num ciclo olímpico tumultuado, em que conviveu com maus resultados, com um caso confirmado de doping (do ponta Markin, que foi absolvido, mas acabou fora da equipe olímpica) e com uma mudança no comando técnico a cerca de um ano dos Jogos, chegar às semifinais da Rio 2016 foi um prêmio para os então campeões olímpicos. Ainda mais, porque não puderam contar o central Dmitry Muserskiy, cortado das olimpíadas por lesão.
O fato é que, justamente diante da Rússia, o Brasil teve seu jogo mais tranquilo na caminhada para o título na Rio 2016: foi naquela semifinal que os brasileiros venceram seu primeiro jogo por 3 a 0.
Medalha de ouro
A Itália havia sido primeira colocada no grupo do Brasil e havia eliminado os EUA numa semifinal decidida em tie break. Ivan Zaytsev – que dera um show no saque contra os norte-americanos – era o protagonista (da equipe e do torneio) e tinha como coadjuvantes o ítalo-cubano Osmany Juantorena, que havia sido integrado à Azzurra um ano antes, e Filippo Lanza, que evoluíra da temporada. Dava, até, para dizer que os italianos eram ligeiramente favoritos ao ouro, até pela vitória sobre os brasileiros na fase classificatória.
Do outro lado, porém, a seleção brasileira tinha a seu favor, além da torcida que lotou o Maracanãzinho e do histórico de vitórias em jogos decisivos contra a Itália (semifinais em Los Angeles 1984, Pequim 2008 e Londres 2012, final em Atenas 2004), o fato de haver crescido no momento mais importante do torneio.
Num jogo de parciais parelhas (25-22, 28-26, 26-24), dois detalhes fizeram a balança pender para o lado brasileiro: Lanza falhou na recepção de um saque de Maurício Souza exatamente no set point da segunda parcial, e Zaytsev, que teve 65% de aproveitamento na partida, foi encaixotado por Lipe no match point.
Brasil 3 a 0. Ouro para o líbero Serginho, que, aos 40 anos, ganhou o prêmio de MVP do torneio e disputou sua última olimpíada, e também para o técnico Bernardinho, que, após 15 anos no cargo, deixaria o comando da seleção brasileira meses depois – ambos com a incrível marca de dois títulos em quatro finais olímpicas.
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