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Como a F-1 ajudou Montreal a sair do vermelho após Olimpíada de 1976

Montreal é palco do GP do Canadá de F1. Imagem da corrida de 2015 - Mathias Kniepeiss/Getty Images
Montreal é palco do GP do Canadá de F1. Imagem da corrida de 2015 Imagem: Mathias Kniepeiss/Getty Images

Julianne Cerasoli

Do UOL, em Montreal (CAN)

07/06/2018 11h31

Quarenta anos. Foi o tempo que a cidade de Montreal, no Canadá, demorou para se recuperar das dívidas adquiridas com a realização das Olimpíadas de 1976, cuja última parceria foi paga apenas em 2006. Uma série de eventos e denúncias de corrupção fizeram a cidade ficar com um grande “elefante branco”, o estádio Olímpico, e poucas estruturas feitas para os Jogos acabaram sendo utilizadas nas décadas seguintes.

Um dos espaços esportivos que ajudaram Montreal a sair do buraco, contudo, não tem nada a ver com a competição: é o circuito que recebe anualmente a Fórmula 1 desde 1978. A receita tem a ver com o baixo custo de manutenção do evento, a cultura forte de automobilismo no Canadá e no norte dos Estados Unidos e uma pitada de sorte.

Corrupção e o “Grande Débito”
Para entender essa história, primeiro é preciso volta aos Jogos. Os custos da Olimpíada acabaram sendo 13 vezes mais altos do que o estimado inicialmente por uma série de fatores: denúncias de corrupção marcaram especialmente a construção do estádio olímpico, para o qual foi destinado US$ 1,1 bilhão do custo total de US$ 1,6 bilhão, além de uma série de greves de movimentos trabalhistas e protestos de movimentos separatistas da província de Quebéc que atrasaram a obra, terminada a toque de caixa e que quase não ficou pronta para a abertura, o aumento drástico do preço do aço, que triplicou entre a confirmação da Olimpíada e sua realização, e a necessidade do aumento em 80% dos gastos com segurança após o atentado terrorista que marcou a Olimpíada anterior, em Munique.

Não que o estádio tenha sido terminado e tenha terminado de gerar prejuízos após os Jogos. Aconteceram alguns acidentes com a estrutura, que necessitou de grandes reparos desde então. Além disso, o projeto do teto retrátil acabou não saindo do papel e as tentativas de usar soluções mais baratas foram frustradas: em uma cidade que acumula cerca de 50cm de neve por mês no inverno, a cobertura atual não pode ser utilizada com mais de 3cm, o que afastou potenciais franquias a utilizarem o estádio. A solução, segundo os técnicos, seria derrubar todo o complexo.

Não por acaso, o estádio, que seria conhecido como Big O (O grande O, em inglês) por conta da Olimpíada, acabou ganhando o apelido de Big Owe (Grande Dívida).

Ajuda inesperada
A receita para pagar os débitos olímpicos, portanto, teve de vir de outras fontes. A própria cidade acabou pagando caro, ficando décadas sem grandes melhorias estruturais. Mas duas estruturas esportivas acabaram ajudando: O Centro Esportivo Claude Robillard Sports Centre se tornou importante para o desenvolvimento do esporte canadense, que costuma figurar até hoje no top 10 em Olimpíadas, e o complexo da Ilha de Notre Dame, onde se disputaram as provas de canoagem e o remo nos Jogos e, logo depois, onde foi construída a pista.

A ilha é artificial, feita com as rochas tiradas do solo durante a construção do metrô de Montreal, nos anos 1960. Nela, foi feito o Parc Jean-Drapeau. Em 1978, o parque começou a receber a Fórmula 1, o que se tornou um negócio lucrativo por uma série de fatores. A pista é usada ao longo do ano pelos usuários rotineiros do parque, e não para corridas de carros, e há anos o único evento do calendário é a F-1, para o qual é montada uma estrutura temporária e de baixo custo de arquibancadas e boxes.

O evento também acabou contando com a sorte: com a descontinuidade de eventos da F-1 nos Estados Unidos, que passou a maior parte dos anos 1990 e entre 2008 e 2012 fora do campeonato, o GP do Canadá se beneficiou sendo a única prova da América do Norte. Com isso, conseguiu negociações vantajosas com os promotores, sendo uma das poucas provas a pagarem menos de 20 milhões anuais, e atrair um público fiel, mantendo-se constantemente no top 5 das provas com mais ingressos vendidos, superando com frequência os 350 mil espectadores ao longo do final de semana. Para efeito de comparação, o número é bem superior aos 140 mil torcedores reunidos pelo GP do Brasil nos últimos anos.

Mesmo com o sucesso do evento, entretanto, a Olimpíada ensinou Montreal a gerenciar melhor os gastos com esportes. Durante a última década, os promotores da F-1 pressionaram os canadenses a trocar a estrutura provisória, hoje a pior do campeonato, por boxes e um paddock permanente, mas o projeto só começou a sair do papel após a prova do ano passado e a assinatura de um novo contrato garantindo a realização da prova até 2029. A nova estrutura tem previsão de entrega para o GP do ano que vem.

A prova canadense deste ano será realizada neste final de semana. Os treinos livres começam nesta sexta-feira, a partir das 11h e das 15h pelo horário de Brasília. A classificação será no sábado, às 15h, e a corrida tem largada no domingo, às 15h10.

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