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Ordens de equipe são "fantasma" que F-1 desistiu de combater há 8 anos

Fernando Alonso e Felipe Massa protagonizaram um dos momentos mais antiéticos da história da Fórmula 1. O brasileiro era primeiro na prova na Alemanha, em 2010, mas foi avisado para deixar o espanhol ultrapassar - AP
Fernando Alonso e Felipe Massa protagonizaram um dos momentos mais antiéticos da história da Fórmula 1. O brasileiro era primeiro na prova na Alemanha, em 2010, mas foi avisado para deixar o espanhol ultrapassar Imagem: AP

Julianne Cerasoli

Do UOL, em Sochi (Rússia)

01/10/2018 04h00

"Não tinha muito o que pensar", disse Sebastian Vettel. "Não precisa ser um cientista para entender", declarou o chefe da Red Bull Christian Horner: a ordem de equipe para Valtteri Bottas entregar a vitória do GP da Rússia para Lewis Hamilton foi amplamente compreendida dentro da F-1, mas não pelos fãs. Não é a primeira vez que esse tipo de reação acontece, mas as ordens estão tão enraizadas que até o próprio esporte já desistiu de tentar puni-las.

Desde 2010, as ordens de equipe estão oficialmente legalizadas, e só podem ser punidas por um artigo bastante amplo e que nunca foi usado para este tipo de esporte: o que impede equipes de "colocar o esporte em descrédito".

Quando a F-1 começou, na década de 1950, era permitido, inclusive, que um piloto parasse o carro no meio da corrida e o cedesse para o companheiro, caso seu equipamento tivesse alguma quebra. Ao longo das décadas, alguns títulos foram decididos por meio de ordens de equipe, ainda que elas nem sempre tenham funcionado. O caso mais famoso é o da Williams de 1981, quando Carlos Reutemann resolveu ignorá-las e prejudicou Alan Jones na luta com Nelson Piquet. Em um final que acabou sendo trágico, Gilles Villeneuve se irritou com uma posição que não foi cedida no final da corrida de Imola pelo companheiro Didier Pironi e, tentando bater o tempo do francês na corrida seguinte, na Bélgica, sofreu seu acidente fatal.

Apesar de algumas destas inversões de posição terem sido questionadas, o GP da Áustria de 2002, quando Rubens Barrichello deixou Michael Schumacher passar nos últimos metros da prova, ficou marcado como o pior da história do esporte, pois se tratava apenas da sexta corrida do ano e a Ferrari tinha vantagem considerável para os rivais.

Foi por conta de tal episódio que a F-1 tentou inibir esse tipo de prática, por meio de uma regra que bania, pelo menos oficialmente, as ordens. Porém, ainda que as mensagens que os pilotos recebiam não fossem tão claras, elas nunca deixaram de acontecer. Na Ferrari, houve inversões de posição entre Schumacher e Barrichello depois da Áustria, e os campeonatos de 2007 e 2008 tiveram ordens em momentos decisivos.

Mas seria somente o episódio com outro brasileiro na Ferrari que forçaria o esporte a rever o regulamento. No GP da Alemanha de 2010, 11ª etapa de um campeonato apertado e que chegou com quatro pilotos com chances de título na decisão, Felipe Massa ouviu a famosa mensagem "Fernando é mais rápido que você", uma ordem velada. O brasileiro abriu para o então companheiro Fernando Alonso, mais bem posicionado no campeonato, exatamente no dia em que completava um ano desde seu grave acidente na classificação da Hungria.

O episódio gerou grande desgaste e a solução acabou sendo reconhecer que as ordens de equipe nunca deixaram de ser realidade, mesmo quando proibidas.

Desde o fim da proibição, basicamente o que mudou foram os termos, bem mais claros, como aconteceu neste domingo em Sochi: no caso de Bottas, o engenheiro inclusive disse em qual curva o finlandês deveria tirar o pé, uma vez que o terceiro colocado, Sebastian Vettel, seguia ele e Hamilton de perto e poderia se aproveitar.

Com a vitória, Hamilton abriu 50 pontos na liderança do campeonato para Vettel, com cinco corridas em 125 pontos em jogo. Para Horner, que já usou ordens de equipe no passado com a Red Bull, o único 'pecado' da Mercedes foi na execução, uma vez que Bottas recebeu a explicação oficial de que Hamilton tinha bolhas nos pneus, o que não era exatamente verdade.

"Acho que, na situação em que eles estão, só precisam de dois abandonos [para perder a vantagem], e você está lutando por título. Existe uma batalha constante entre o campeonato do piloto e o interesse da equipe. Então dá para entender a racionalização por trás disso, só parece que a execução não foi discutida previamente".

Já o chefe da Mercedes, Toto Wolff, justificou a decisão de inverter as posições dizendo que não quer ser responsabilizado caso Hamilton perca o campeonato. "Alguém tem que ser malvado às vezes, e hoje fui eu. Você precisa avaliar as coisas. Preferi ser o cara mau do domingo do que ser o idiota de Abu Dhabi [última corrida do ano]".

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