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Ceni revela choro por aposentadoria e diz: "Seria muito egoísmo jogar"

MARCUS DESIMONI / UOL
Imagem: MARCUS DESIMONI / UOL

Guilherme Palenzuela

Do UOL, em Goiânia

05/12/2015 20h41

Rogério Ceni e a delegação do São Paulo chegaram a Goiânia por volta das 19h deste sábado (5) com a definição de que o capitão, aos 42 anos, já se aposentou e não poderá jogar aquele que seria seu último jogo da carreira, contra o Goiás, no Serra Dourada, domingo, pela última rodada do Brasileirão. Uma lesão ligamentar no tornozelo direito impede que o goleiro, que tentou treinar ainda pela manhã de sábado, consiga entrar em campo. Ao chegar em Goiânia, Ceni atendeu à imprensa e falou durante quase trinta minutos, avaliou que seria egoísta se optasse por jogar e admitiu que chorou nos últimos dias por causa da aposentadoria.

"Quando tive a lesão achei que fosse uma coisa grave, mas não que demorasse tanto tempo para curar. Sempre tive uma boa recuperação de lesões, mas rompeu esse ligamento tíbio-fibular, e é uma coisa... O tornozelo incomoda demais. Tentei voltar a treinar, estou com muita dor. Insisti na dor, ontem amanheceu muito dolorido, eu não tinha condições de treinar. Joguei o rachão, meio ali parado, com o pessoal, mas sem condição nenhuma de jogo. Seria muito egoísmo da minha parte tomar uma decisão de estar em campo sem ter o mínimo de condição e sem poder oferecer o que o Denis e o Renan podem oferecer. Para aqui. Incentivo moral, a palavra, para que todos eles possam fazer o resultado e para que tenham um futuro importante", disse Rogério Ceni.

"Eu também já chorei bastante. Dias sozinho, passando esses últimos dias sozinho no CT. Tendo que começar a arrumar as coisas no meu quarto, eu moro há 22 anos lá dentro... Moro não, mas concentro há 22 anos no mesmo quarto. Parte da vida, tudo tem um começo, meio e fim. Como atleta esse fim chega amanhã, mas tenho mais do que tudo agradecer. Não é todo atleta que consegue chegar a quase 43 anos jogando num clube como é o São Paulo. A gente fica triste por parar, mas fica olhando para trás e fica muito feliz pela vida ter me propiciado tudo isso", completou, ao ser questionado sobre o sentimento dos últimos dias e da última concentração como jogador de futebol.

Rogério Ceni também afirmou que na sexta-feira já soube que não conseguiria entrar em campo neste domingo. Ainda assim, tentou treinar neste sábado, quando voltou a sentir dores, e sacramentou a decisão de não atuar em Goiânia.

"Na minha cabeça, na sexta-feira, quando não consegui treinar. Eu precisava da força para conseguir treinar, não podia ficar fazendo só transport, bicicleta, fortalecimento. É muito diferente de ter ritmo de treino. Quando treinei na quarta, senti bastante dor, mas você sempre tem esperança. Na quinta amanheceu pior, e na sexta foi quando eu disse pro [Ricardo] Sasaki, nosso fisioterapeuta: 'Eu prefiro ficar porque hoje, se eu for para o treino, eu não aguento no sábado, e não vou ter uma melhora em 48h'. Aí hoje, de novo, fiz bota, fui para o campo, mas quando pisei no gramado, vi que não ia ter condições de jogar. Já nos primeiros movimentos vi que não ia ter condições de jogar", falou.

Confira a entrevista de Rogério Ceni na íntegra

Treinou neste sábado no rachão, na linha
"Nesse último dia, atrapalhei eles um pouco no rachão (risos), fiz um gol até, mas perdemos. Mas foi bom, e agora aproveitar essa última viagem. Depois, tentar me preparar para não passar vergonha na sexta-feira, no jogo da minha despedida, porque vou jogar só com craque, só com fera, então eu quero tratar mais nesses cinco dias para chegar bem"

Sentimento pela aposentadoria
"Eu fico feliz por tudo que pude passar na minha carreira, por trabalhar por tanto tempo. Deus me permitiu ter saúde para isso. E um pouco triste pelo fato de não ter condições reais para jogar nesse finalzinho de carreira. Mas nesse momento estou focado na busca pela Libertadores. Me sinto parte disso e gostaria de ver esse time jogando uma Libertadores. Eu tento relevar numa boa, a ficha vai acabar caindo depois de sexta-feira, de fato meu último momento no Morumbi. Agora, a gente ainda tem o jogo, essa é minha última viagem, última concentração. Fiz questão de vir, e todos os caras que estão no Reffis também fizeram, para reunirmos energias especiais"

Frustração pela lesão
"Me corta o coração. Se for olhar os últimos 30 dias, você fica revoltado com a situação em que você se colocou, mas se você olhar os últimos 25 anos, você agradece a Deus todos os dias por ter levado tudo. Uma pena que tive aquela lesão com um minuto de jogo, não pude nem aproveitar aquele jogo de 28 de outubro. O destino é algo que foge ao nosso controle. A minha contribuição que posso fazer estou tentando, quero que se concretize com um empate ou uma vitória amanhã"

Avaliação do próprio 2015
"Um ano com mais lesões do que o normal, relativamente compreensível pela idade. Sofri muito para estar em campo, como aquele 3 a 0 no Ceará, no último do último da minha condição. Era um momento importante, assim como hoje também é. Tomei as mesmas injeções, todo o tratamento que precisei fazer, dois períodos todos os dias. Entro às 8h30 no CT e saio às 16h30, 17h. Mas fico 30 dias sem treinar, para alguém de 42 anos... O problema é que para o lado direito eu não consigo, não tem a força do tornozelo"

Avaliação do 2015 do São Paulo
"O São Paulo nesse ano, conseguindo a vaga para a Libertadores, é um ano em que ainda, com todos os percalços, as dificuldades que a gente passou, ainda pode ser um ano razoável com a vaga para a Libertadores"

Sentimento pelo clube
"Eu só tenho a agradecer o carinho do torcedor são-paulino. Agradecer esse clube para o resto da minha vida. Esse clube mudou a minha vida, para mim o São Paulo está acima de qualquer outra coisa. 'Ah, mas teve problema...' Você ter problema com uma ou outra determinada pessoa ao longo de 25 anos, isso é completamente natural. Mas a instituição jamais será esquecida, meu coração para sempre estará aqui"

Todos os jogadores viajaram a Goiânia, até os lesionados
"Eu disse que eu viria, aí o Luiz Eduardo, o Breno, que estavam tratando comigo todos os dias falaram: "Será que dá para a gente ir?". E aí a gente viu, o Milton foi muito importante nisso, e viemos completos. Em 27 caras, exceto o Leo, que está com caxumba, mas todos os outros jogadores estão aqui"

Vai jogar a despedida no gol ou na linha
"Jogar no gol é mais fácil porque posso tomar gol à vontade e não muda em nada minha vida nesse jogo, mas eu quero tentar ao menos um pouco jogar na linha, para o torcedor ver a diferença. Para o torcedor que estará lá, vai ser bacana"

Palavras na última preleção com o time
"A palavra é de todos, é que parece que sempre esperam a minha. Todos se manifestam naquela hora que a gente fecha para subir. O que eles vão colher no jogo de amanhã é a previsão do futuro para o próximo ano. É jogar uma Libertadores num primeiro semestre que só tem Campeonato Paulista, jogar a Libertadores é uma diferença absurda para a carreira de um jogador, é algo que pode mudar o rumo também do clube nesse mês de dezembro e de janeiro, que é um mês de contratação. O que eles fizerem amanhã é o benefício que vão trazer para si próprios e para o torcedor em 2016"

Como avalia a própria carreira e o tamanho como jogador de futebol
"Como atleta, goleiro no futebol brasileiro, vejo um ciclo que ajudou muito no crescimento em alguns detalhes. Há 20 anos, reposição de bola, jogar com os pés, que é característica de todos os goleiros hoje no futebol brasileiro. Ainda não me sinto defasado em relação aos outros. Sinto que pude iniciar algumas coisas na frente daqueles daquela época. Hoje, os goleiros atingiram nível bom. Denis e Renan no São Paulo mesmo fazem isso. Na maioria dos times, o goleiro é o primeiro armador dos times. Como atleta do São Paulo, fiz meu melhor. Deito todo dia tranquilo, acertei, errei, perdi, ganhei, feliz, triste, respondi boas perguntas, algumas vezes dei respostas que não deveriam ser dadas, por ser franco e honesto, mas tem de saber enrolar, porque vocês buscam o momento mais difícil do jogo, naquela saída de campo. Mas fui o melhor comigo mesmo, o melhor profissional do dia a dia que pude ser. Consciência tranquila que trabalhei o máximo pelo São Paulo e fui o mais profissional possível para tentar não ser exemplo, mas visto e respeitado pelos outros e meus companheiros"

Futuro fora de campo
"Não tenho futuro definido. A partir de 15 de dezembro, quando acabam compromissos dentro e fora do São Paulo, descansar trinta, quarenta dias. Depois tem muitas possibilidades, mas nada definido. Vou usar esses dias para tomar uma direção a partir de 1º de fevereiro"

Momentos finais com o torcedor
"Todos [autógrafos] foram e são especiais. Nesse momento final, as pessoas vibram e valorizam mais o calor do momento. Como profissional, sempre tentei dar atenção a todos. Aeroporto é difícil. Para mim também é muito especial. Naturalmente vai mudar com o passar do tempo e dos anos. É um ciclo da vida que se completa"

Como será o Rogério Ceni torcedor
"No São Paulo, futebol como torcedor, [você] vai me ver no Morumbi, certamente. Principalmente se classificar para a Libertadores, pode ter certeza que estarei como mais um torcedor. [Você] não vai me ver porque estarei no meio da multidão, mas sempre estarei torcendo. Alguma relação profissional? A princípio, a carreira precisa ter um ponto final para, quem sabe no futuro, ter alguma outra relação diferente. Mas se faz necessário um ponto final"

Convite de Osorio para visitar seleção mexicana
"Não fui convidado. Eu falei com ele. Disse: “Profe, quando for para seleção mexicana... Já tinha falado com [Jürgen] Klinsmann, quando esteve com os Estados Unidos aqui no Brasil, disse que queria acompanhar o trabalho dele na seleção americana, depois de encerrar a carreira. Coincidiu de o Osorio sair do São Paulo para seleção mexicana, que tem proximidade com o país, e gostei muito do trabalho de campo do Osorio, de treinamento. Aprendi coisas novas nesses quatro meses. Já tinha falado com ele pessoalmente que gostaria de acompanhar o trabalho dele na frente de uma seleção importante nas Américas. Ele disse que as portas estariam abertas. Espero um dia passar um tempo observando o trabalho dele de perto e de uma seleção, que é bacana para ver como se trabalha"

O melhor jogo da carreira
"Gosto muito do jogo com o Rosário Central no Morumbi, a volta do São Paulo à Libertadores após dez anos, um jogo perdido nos pênaltis. Agora, lógico, lembro de final no Mundial, Libertadores, Brasileiros, a final da Conmebol 94, a final da Taça São Paulo de 1993, de 2000 contra o Santos com gol de falta, em uma decisão. Normalmente, [você] lembra dos jogos emblemáticos, que fecharam com títulos e vitorias. Mas tem muito jogo no meio de campeonato que foi marcante. Fica no caminho por não ter tanta importância. Contra Católica, aos 40 anos, foi excepcional a partida. Muitos ficam pelo caminho, você não lembra"

O gol mais importante
"Fiz 131 na carreira, todos são fantásticos. Um só escolheria o primeiro, através dele todos os outros saíram. Se não sai aquele em 15 de fevereiro de 1997, em março poderia não ter mais essa parte da história da carreira como goleiro"