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Copa do Brasil mostra que arbitragem ainda precisa aprender com o VAR

O árbitro Wagner do Nascimento Magalhães consulta o VAR na final da Copa do Brasil - Marcello Zambrana/AGIF
O árbitro Wagner do Nascimento Magalhães consulta o VAR na final da Copa do Brasil Imagem: Marcello Zambrana/AGIF

Thiago Rocha

Do UOL, em São Paulo (SP)

18/10/2018 15h13

A Copa do Brasil de 2018, a partir das quartas de final, entrou para a história como a primeira competição nacional a adotar a revisão de lances por meio do árbitro de vídeo (VAR, na sigla em inglês). Implantada com sucesso na Copa do Mundo da Rússia e já em vigor em ligas por Europa e Ásia, a tecnologia entrou em campo para dar novo respaldo à arbitragem brasileira, rotineiramente envolta em decisões polêmicas e erros grosseiros de interpretação.

O jogo de volta da final, que consagrou o Cruzeiro como campeão ao vencer o Corinthians por 2 a 1, na última quarta-feira (17), em Itaquera, evidenciou que o quadro de árbitros da CBF ainda tem muito o que aprender com o VAR. Mesmo com recursos para analisar replays por vários ângulos antes de tomar uma decisão final, o juiz de campo, Wagner do Nascimento Magalhães, usou critérios questionáveis para reverter duas marcações e, de certa forma, influenciou no placar final.

Para se convencer de que Thiago Neves cometeu pênalti em Ralf, no início do segundo tempo, Magalhães reviu o lance na tela à beira do campo em apenas 13 segundos, a maior parte do tempo com a imagem em câmera lenta - e o futebol, definitivamente, não se disputa nessa velocidade. Já para anular o gol de Pedrinho, ao entender que Jadson cometeu falta em Dedé fora do lance, foram 12 segundos de revisão.

Dedicar mais alguns segundos de análise, por diferentes câmeras e velocidades de imagem, evitaria que o árbitro da final da Copa do Brasil fosse colocado em xeque? É uma linha tênue. A recomendação do Comitê de Arbitragem da Fifa cobra agilidade nas consultas ao VAR para que o jogo fique paralisado o mínimo possível, mas com o máximo de precisão possível nas tomadas de decisões. A impressão deixada é que Magalhães, na afobação de não errar, acabou se atrapalhando com a interferência do árbitro de vídeo.

Na última Copa, segundo a Fifa, a média de interrupção por conta do VAR foi de 38 segundos por partida. Apenas no lance em que marcou pênalti para o Corinthians influenciado pela revisão de vídeo, o tempo total desperdiçado por Magalhães foi superior a três minutos. 

Em participação no programa "Seleção SporTV" desta quinta (18), o ex-árbitro Paulo Cesar Oliveira defendeu que, para se adaptar melhor ao VAR, os juízes brasileiros precisam respeitar o protocolo de uso definido pela Fifa e ter mais segurança em suas convicções.

"O árbitro de vídeo veio para dar uma segurança ao árbitro, para corrigir as grandes injustiças. Mas, na prática, infelizmente, o protocolo não está sendo seguido, e a gente tem feito essa crítica desde a Copa do Mundo. O árbitro de vídeo (no Brasil) está recomendando o uso em casos de interpretação. Não é isso o que diz o protocolo (da Fifa), e o árbitro, que era para apitar com mais segurança, sabendo que ele vai ter uma segunda chance, está inseguro", analisou o comentarista do Grupo Globo.

"Na minha interpretação, (Magalhães errou) sim. De acordo com o protocolo, o árbitro de vídeo deve corrigir uma decisão claramente errada da arbitragem, uma aberração. No meu entendimento, o Wilton Sampaio (árbitro de vídeo de Corinthians x Cruzeiro) não deveria ter chamado o Wagner Magalhães para rever a jogada. A revisão (dos lances) foi muito rápida. Precisa colocar na cabeça do árbitro que a decisão final é dele", completou Oliveira.

Nas fases anteriores da Copa do Brasil, não houve repercussão tão grande quanto ao uso do recurso. Mas ficou claro em alguns momentos que tanto árbitros como jogadores tinham dúvidas sobre em quais momentos solicitar ou não a tecnologia. Na primeira semifinal entre Palmeiras e Cruzeiro, no Allianz Parque, o atacante Dudu pediu VAR para confirmar um lateral, o que não é permitido.

A reportagem do UOL Esporte procurou Marcos Marinho, chefe de arbitragem da CBF, para comentar sobre as impressões da entidade quanto ao uso do VAR na Copa do Brasil, mas ele não atendeu às ligações nem respondeu às mensagens de texto enviadas.

Quando o VAR agiu (ou não) na Copa do Brasil

VAR - Marcello Zambrana/AGIF - Marcello Zambrana/AGIF
Imagem: Marcello Zambrana/AGIF

Quartas de final – ida – Santos 0 x 1 Cruzeiro
Foi o primeiro jogo da história em nível nacional a utilizar o VAR no Brasil. Houve atuação direta em apenas uma situação. Aos 11 minutos do segundo tempo, Gabigol caiu na área em lance com Lucas Romero, mas Wilton Pereira Sampaio deu sequência. Quando a bola saiu pela linha de fundo, ele ouviu via ponto eletrônico o árbitro de vídeo, Bráulio da Silva Machado, recomendar a não marcar o pênalti. Após apenas 27 segundos de paralisação, Sampaio manteve a decisão.

Quartas de final – ida – Corinthians 1 x 0 Chapecoense
Aos 36 minutos do segundo tempo, os jogadores da Chapecoense reclamaram de um toque de mão na bola de Romero dentro da área. Wagner do Nascimento Magalhães deixou seguir e esperou a bola sair para ouvir a análise da equipe de vídeo, chefiada por Pericles Bassols na partida. Após 52 segundos de paralisação, a partida seguiu sem mudar a decisão do árbitro de campo.

Quartas de final – ida – Bahia 0 x 0 Palmeiras
Pela primeira vez, o VAR ajudou o árbitro de campo a voltar atrás e anular uma marcação em torneios de nível nacional. Alertado por Leandro Vuaden, que chefiava a arbitragem de vídeo na Arena Fonte Nova, Anderson Daronco cancelou o cartão vermelho dado para George após pênalti em Artur, punindo o volante do Bahia apenas com o amarelo. No entanto, o jogo ficou paralisado por seis minutos, entre a marcação da infração e a decisão final da arbitragem. Depois, Daronco usou a revisão de lance para expulsar o atacante Deyverson, que acertou uma cotovelada em Mena.

Quartas de final – volta – Flamengo 1 x 0 Grêmio
Em dois momentos, Ricardo Marques Ribeiro aguardou as conclusões das jogadas para ouvir a equipe de árbitro de vídeo, sob a chefia de Raphael Claus, em pedidos de penalidades sobre Lucas Paquetá e Cortez, ambos no primeiro tempo. As decisões de campo, de não marcar as infrações, foram mantidas.

Quartas de final – volta – Chapecoense 0 x 1 Corinthians

Aos 26 minutos do primeiro tempo, Rafael Theyre marcou de cabeça para a Chape, mas Leandro Vuaden anulou o gol ao assinalar impedimento. A equipe do VAR, chefiada por Rafael Traci, revisou o lance e orientou o árbitro a manter a marcação. No entanto, Vuaden se confundiu na sinalização e fez o gesto da tela de TV com as mãos, usado apenas quando o lance será revisto à beira do campo, o que não foi o caso.

Semifinal – ida –Palmeiras 0 x 1 Cruzeiro
Aqui, um exemplo de como a arbitragem abdicou do VAR para evitar polêmica. No último lance do jogo, após cruzamento na área, Fábio largou a bola após uma dividida pelo alto, mas o árbitro Wagner Reway apitou a falta enquanto o zagueiro Antônio Carlos concluía para o gol. Revoltados, os jogadores do Palmeiras pediram a revisão do lance, alegando não ter havido infração no goleiro do Cruzeiro. Se Reway tivesse esperado a conclusão da jogada, como recomenda a Fifa, o árbitro de vídeo poderia ter sido acionado. Como apitou antes, ele anulou qualquer chance de revisão.

Final – jogo de volta – Corinthians 1 x 2 Cruzeiro

Mesmo com o uso do VAR, Wagner do Nascimento Magalhães tomou decisões polêmicas no jogo decisivo em Itaquera. No início do segundo tempo, ele anotou pênalti de Thiago Neves em Ralf após rever o lance à beira do campo – o jogo ficou interrompido por cerca de três minutos. Da mesma forma, anulou o gol de Pedrinho, aos 24 minutos, ao entender como falta de Jadson em Dedé em dividida fora do lance. Wilton Pereira Sampaio comandou a equipe de árbitro de vídeo nos dois jogos da final.