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Fila de ingresso para final tem xaveco, bebedeira e torcedor sem banho

  • Luiza Oliveira/UOL

    Após ficar acampada em dois locais da cidade, Jéssica esconde o cansaço por trás dos óculos

Luiza Oliveira

Do UOL, em Belo Horizonte

22/07/2013 06h02

Enfrentar fila não é das tarefas mais agradáveis. Uma fila que dure uma semana torna o fardo ainda mais pesado para qualquer mortal. Pior ainda se vier somado a horas seguidas sem banho, passando fome, frio e ainda tendo que aturar as chatices dos vizinhos sem qualquer parede de proteção.  Só mesmo muito amor pelo time do coração para valer a pena.

A fila dos atleticanos para comprar ingresso para a final da Copa Libertadores se formou em frente à sede do Atlético-MG antes mesmo de a equipe perder para o Olimpia por 2 a 0 o primeiro jogo da decisão, na última quarta-feira.

Nem a derrota no Paraguai tirou a confiança dos torcedores que lá estavam há pelo menos dois dias. Jéssica Ricardo bem que tentou dormir naquela noite em sua barraca de camping, mas não conseguiu. Seus colegas de fila corriam em volta do quarteirão aos berros de “Eu acredito”, um dos novos lemas do time para superar situações adversas, até as 4 horas da manhã.

Só pararam após uma pequena intervenção da polícia que pediu que eles tivessem um comportamento mais adequado para um bairro residencial na área nobre de Belo Horizonte.

“Tinha um pessoal bem esquisito, bem diferente. Eu contei dois dias, foram 48 horas que eles ficaram sem tomar banho, sem levantar da mesa de truco, bebendo o tempo inteiro. Depois do jogo, depois de muito beber, saíram dando volta no quarteirão gritando até às 4h”, disse ela, ao lado do irmão caçula que balançava a cabeça confirmando a informação.

  • Luiza Oliveira/UOL

    Irmã de Jéssica Ricardo desmonta barraca após passar uma semana na fila para comprar ingresso

Quem também passou por situação indelicada com os companheiros de fila foi a estudante Adriana Carolino. Para ela, inimigos piores que a fome e o frio na madrugada dos dois dias em que ficou na fila no Mineirão só os xavecos indesejáveis.

“Tinha um cara que não saía do meu pé. Ficava falando comigo o dia inteiro, perguntava se eu queria pão com presunto, se eu queria bala. E eu não tinha como sair de perto porque não podia deixar meu lugar na fila”, diz, agora aos risos após exibir seu ingresso e soltar o grito de ‘Galo’ sempre que alguém se aproximava.

Os cuidados pessoais com a higiene também foram um problema, especialmente para as mulheres. Quem estava acampado na sede de Lourdes, passou a usar o shopping Diamond Mall, em frente ao local, como segunda casa. Mas após as 22 h as regalias acabavam.

“Para uma pessoa que nunca acampou na vida e preza pela privacidade e higiene, não foi fácil. A barraca no chão deixava tudo frio demais à noite, de manhã batia o sol e era calor demais. Quando o shopping estava aberto tinha coisa para comer, mas quando fechava só carrinho na rua, tinha que segurar o xixi a noite inteira”, conta Jéssica.

Ela e seus três irmãos passaram por ainda mais uma complicação. O único posto de venda de ingressos era o Mineirão, mas as pessoas que estavam acampadas na sede ganharam uma senha para terem o direito de pegar suas entradas no local. Jéssica não conseguiu o código distribuído pelos policiais e precisou se mudar de mala, barraca e cuia para a frente do Mineirão já na sexta-feira.

Depois de todo o sufoco, ela desabafa. “Foi difícil, mas valeu. Estou com ingresso na mão. Agora é esperar quarta para erguer a taça. Vai ser sofrido como sempre, mas vai dar certo”.

Antonio Carvalho passou apenas uma noite na fila, mas já sentiu os efeito no corpo. Por volta de 12h, ele exibia orgulhoso os ingressos e lembrava do passar do tempo. “Cheguei  11 h da noite. Banho nem pensar, estou sem comer até agora e minhas pernas estão doendo. Mas pelo Galo vale tudo”, comemora.