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Iniesta volta, e inovação tática do Barcelona vira dilema em duelo com PSG

Iniesta foi reserva do Barcelona contra o Celta, e isso virou um dilema para o técnico Luis Enrique - David Ramos/Getty Images
Iniesta foi reserva do Barcelona contra o Celta, e isso virou um dilema para o técnico Luis Enrique Imagem: David Ramos/Getty Images

Do UOL, em São Paulo

08/03/2017 10h00

Passou por uma mudança tática uma das melhores apresentações do Barcelona na atual temporada, no último sábado (04), quando os catalães bateram o Celta por 5 a 0 em duelo válido pelo Campeonato Espanhol. Em sua primeira partida depois de ter anunciado que sairia no meio deste ano, o técnico Luis Enrique, 46, apostou numa formação mais fluida, com linha de quatro defensores nos momentos em que a equipe estava sem bola e uma espécie de 3-4-3 nas fases ofensivas, com o brasileiro Rafinha, 24, aberto pela direita.

O "problema": esse desenho só foi possível porque o espanhol Andrés Iniesta, 32, foi poupado. Nesta quarta-feira (08), contra o Paris Saint-Germain, pela Liga dos Campeões da Uefa, o camisa 8 voltará a figurar nos 11 iniciais do Barcelona. E isso transformou a solução encontrada pelo treinador em um enorme dilema.

O Barcelona perdeu o primeiro duelo contra o Paris Saint-Germain, em Paris, por 4 a 0. Na história da Liga dos Campeões, jamais houve uma virada dessa proporção – o registro mais próximo aconteceu em 2004, quando o Deportivo La Coruña venceu o Milan por 4 a 0 na Espanha após ter sofrido um 4 a 1 na partida de ida. Na tentativa de obter um feito inédito, portanto, Luis Enrique terá de escolher entre um dos pilares de sua equipe e o modelo que funcionou contra o Celta.

Iniesta é produto e produtor de um dos momentos mais prolíficos da história do Barcelona. Moldado nas “canteras” catalãs desde os 12 anos, destacou-se em todas as equipes inferiores e chegou ao profissional em 2002, sob comando do holandês Louis van Gaal. Foi usado inicialmente no setor ofensivo, nos lados do campo, como opção a jogadores como Giuly e o brasileiro Ronaldinho.

Em 2006, o Barcelona que bateu o Arsenal na decisão da Liga dos Campeões da Uefa tinha Edmilson, Mark Van Bommel e Deco no meio-campo. Iniesta, 22 anos na época, participou da decisão (entrou no lugar de Edmilson), mas a presença do jogador no meio-campo ainda era mais exceção do que regra. Na Espanha, era comum a crítica dizer que ele e Xavi não tinham o poder de marcação de Edmilson ou Van Bommel e que tampouco atacavam como Deco.

A ascensão de Iniesta e Xavi, portanto, é muito mais do que uma simples tomada de posição. Os dois subverteram conceitos e se tornaram símbolos de um novo modelo de meio-campista. Num futebol que havia se afeiçoado a limitar volantes e meias, mostraram que é possível ter uma abordagem mais sistêmica. Criaram uma simbiose que alicerçou um Barcelona vitorioso e levaram o sucesso também à seleção espanhola – a equipe nacional venceu duas edições da Eurocopa (2008 e 2012) e uma Copa do Mundo (2010).

O futebol talvez leve décadas para compreender a exata relevância de Xavi, o armador, e Iniesta, o toque refinado, autor do gol que deu à Espanha o título mundial de 2010. São jogadores parecidos, com dinâmicas similares, e ao mesmo tempo complementares. São talento, valorização da posse de bola, soluções em espaço curto. São tudo que serviu como base para o Barcelona de Pep Guardiola e que virou característica indelével do próprio time.

Iniesta também virou resposta ao imediatismo. Deslanchou depois dos 24 anos, em função e posição diferentes do que desempenhava no início da carreira. Teve uma resiliência rara no ambiente em que estavam inseridos. “Em anos anteriores a isso, Messi, Xavi e Iniesta não teriam sido sequer aceitos numa escola de futebol. Havia um critério de buscar jogadores mais prontos e fisicamente mais fortes”, exemplificou o ex-atacante francês Christophe Dugarry em um programa da TV “SFR Sport”.

Nos anos seguintes, o Barcelona passou a ser o time de Xavi, Iniesta e Messi. Pensar na equipe catalã sem o tripé passou a ser algo tão difícil quanto imaginá-la sem o azul e o vermelho do uniforme.

Saída de Xavi e declínio de Iniesta

Xavi deixou o Barcelona em 2015. O meio-campo catalão passou a ser apenas de Iniesta, que recebeu a braçadeira de capitão e a responsabilidade de representar a identidade que o clube havia construído. Em 2016, o camisa 8 ultrapassou Puyol e se tornou o segundo atleta com mais partidas com a camisa da equipe espanhola – perde justamente para Xavi.

A questão é que o próprio Iniesta entrou em declínio. O jogador que chegou a distribuir 16 assistências na temporada 2012/2013 do Campeonato Espanhol deu apenas três passes para gol na soma das três últimas edições. Outrora dono do meio-campo, passou a conviver com problemas físicos e se distanciou da velocidade que apresentava no início da carreira.

A saída de Xavi e o declínio de Iniesta foram movimentos de desconstrução do Barcelona das últimas temporadas. A derrota para o Paris Saint-Germain nas oitavas de final da Liga dos Campeões talvez tenha sido o ápice nesse processo. Os catalães se classificaram ao menos para as quartas nas últimas nove edições do torneio europeu.

Depois daquele revés, o Barcelona emplacou quatro vitórias consecutivas. Anotou 15 gols e sofreu apenas dois. Mais: mostrou que a reação é possível. “Podemos marcar seis gols no Paris Saint-Germain”, avisou o técnico Luis Enrique em entrevista coletiva antes da partida.

Em três desses triunfos, Iniesta não figurou entre os titulares do Barcelona. Foi assim contra o Celta, por exemplo – o camisa 8 entrou na etapa final e disputou apenas 23 minutos.

Para Luis Enrique, o jeito mais simples de reconduzir Iniesta ao time titular seria a saída do brasileiro Rafinha. Entretanto, isso obrigaria o espanhol a jogar aberto para não alterar a estrutura que o time teve contra o Celta, e o camisa 8 não tem mais a explosão muscular que o permitia atuar assim no início da carreira.

Segundo o jornal catalão “Mundo Deportivo”, Luis Enrique considera ao menos sete opções de montagem de time para o jogo contra o PSG. Nem todas dependem de peças diferentes – em algumas, apenas o posicionamento é alterado. O maior dilema do treinador, no entanto, não é como o Barcelona vai se posicionar. Em busca da maior virada da história da Liga dos Campeões, o que ele precisa é escolher entre o bom momento e a história.