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Brasil mostra maturidade e, à la Espanha, enfim consegue furar retranca

Philippe Coutinho chuta para abrir o placar contra a Costa Rica, que resistiu até os acréscimos à pressão - Richard Heathcote/Getty Images
Philippe Coutinho chuta para abrir o placar contra a Costa Rica, que resistiu até os acréscimos à pressão
Imagem: Richard Heathcote/Getty Images

Bruno Grossi e Dassler Marques

Do UOL, em São Paulo (SP) e São Petersburgo (Rússia)

22/06/2018 18h05

O Brasil de Tite previa encontrar retrancas em sua participação na Copa do Mundo e imaginava que esse tipo de estratégia seria um de seus maiores desafios. Fossem elas com linha de cinco na defesa ou simplesmente equipes extremamente retraídas e compactadas, o estilo era um problema a ser solucionado. O medo se provou justo pelo desespero que tomou conta dos brasileiros na estreia contra a Suíça, mas foi derrubado nesta sexta-feira com paciência e um toque - ou muitos deles - espanhol na vitória por 2 a 0 sobre a Costa Rica.

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A paciência para trabalhar a bola e encontrar o melhor momento para definir as jogadas foi o grande segredo dos comandados de Tite. Diante dos suíços, o Brasil não consegui manter a posse por muito tempo, seja por querer decidir no desespero ou por prender demais a bola e ser encaixotado pelos marcadores. Contra os costa-riquenhos, principalmente no segundo tempo, a seleção provou o resultado da autocrítica. A bola circulou mais rápido entre os atletas, mas sem pressa para definir a jogada.

Os toques eram precisos e passeavam pela entrada da área adversária para tentar encontrar uma brecha na linha de cinco defensores. E não importou o pênalti cancelado pelo árbitro de vídeo ou a grande atuação de Keylor Navas, que salvava as melhores chances brasileiras. A equipe de Tite se manteve focada na estratégia até o fim. O primeiro gol, já nos acréscimos, é um reflexo disso. Marcelo lançou na área, mas não era um chuveirinho aleatório. A bola foi na cabeça de Roberto Firmino, que fechava no segundo pau, no espaço entre Douglas Costa e Gabriel Jesus. 

Com a área povoada, sobrou espaço para Philippe Coutinho chegar de trás e completar a jogada. "É difícil fazer gol contra linhas baixas, seja de quatro ou cinco, não importam os times. Não é simples. É difícil colocar um a mais (ter mais jogadores atacando do que defensores rivais), então primamos pela construção das jogadas", ponderou o auxiliar Sylvinho, após o suado triunfo em São Petersburgo.

Essa paciência e essa fidelidade à ideia de jogo são exemplificadas pela evolução do Brasil em uma estatística. Na primeira rodada, a seleção foi apenas a oitava que mais trocou passes:

  • 521 tentativas e 460 acertos, gerando 88% de eficiência e 52% de posse de bola.

Em que pese a diferença técnica dos suíços para a Costa Rica, o desempenho nesta sexta foi muito melhor e deu ao time o segundo melhor número de passes de todo o Mundial: 

  • 732 tentativas e 662 acertos, gerando 90% de eficiência e 66% de posse de bola.

A estratégia tem muita relação ao que é praticado há anos pela seleção espanhola, que só nesta Copa já teve de encarar duas retrancas e trocou os passes necessários até criar chances claras contra Portugal e Irã. Diante dos iranianos, a Espanha conseguiu o recorde do Mundial até agora, com 805 tentativas e 718 acertos - a posse de bola foi de 70%.

A diferença entre Brasil e Espanha está em quanto se investe em jogadas individuais para que as oportunidades claras de gol surjam com mais frequência. Os europeus só tiveram Isco com esse papel na estreia contra Portugal, mas perceberam a necessidade de mais fontes de improviso e apostaram em Lucas Vásquez contra o Irã. 

A seleção brasileira tem mais jogadores com essa capacidade, ainda que Neymar seja o ponto destoante da estratégia de Tite. O camisa 10 prende demais a bola e dá menos opções em tabelas, porque sempre quer ser o início dos lances. Na única vez em que se movimentou para oferecer opção, selou a vitória brasileira sobre a Costa Rica. Willian é outro com a característica, mas que não correspondeu ainda e viu o time crescer ao ser trocado por Douglas Costa.

O ponta da Juventus arriscou mais dribles e centralizou menos as jogadas mesmo sendo canhoto e tendo entrado na ponta direita, o que favoreceria lances de corte para o meio. A sonhada amplitude no gramado foi alcançada por Tite: "Primeiro constrói, depois finaliza. Se pegar a foto do momento do gol, tem o Marcelo fazendo cruzamento, tem dois na área, Coutinho infiltrando, o Douglas Costa dando amplitude e o Casemiro na frente, de 'reboteiro', com Fagner do outro lado. Naquele momento é como estamos preenchendo os espaços".

Se o Brasil mostra evolução e adaptação às retrancas, há agora uma expectativa de como o time vai reagir diante da necessidade da Sérvia atacar na última rodada. A seleção do leste europeu só avança para as oitavas de final da Copa se ganhar do Brasil. E a Suíça, apesar da temida retranca, levou mais problema aos brasileiros justamente quando surpreendeu e avançou suas linhas, dominando o meio de campo. 

Na próxima quarta-feira, às 15h, poderemos ver um jogo aberto, com espaço para as individualidades brasileiras contra-atacarem, ou então o mesmo time assustado que não sabia como conter os ataques suíços no segundo tempo da estreia.