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Ex-goleiro Rafael reduz Democracia Corintiana a "quatro traíras"

Vanderlei Lima

Do UOL, em São Paulo

13/09/2013 06h00

A Democracia Corintiana não fazia sucesso entre os goleiros. Criticado várias vezes por Emerson Leão, o movimento liderado pelos atletas alvinegros na década de 1980 tem mais um opositor que vestiu a camisa 1 da equipe. Atualmente trabalhando como técnico do Primavera do Leste, da segunda divisão do futebol do Mato Grosso, Rafael Cammarota reduziu a união de atletas a quatro traíras.

“De democracia não tinha nada. Era um movimento bom para os que comandavam, mas os outros só batiam palma. A Democracia Corintiana tinha os quatro traíras: Sócrates, Wladimir e Casagrande, que era bocudo, além do Adilson Monteiro Alves”, declarou o ex-goleiro ao UOL Esporte.

Nascido em 1953, Cammarota começou nas categorias de base do Corinthians e estreou entre os profissionais em 1974. Depois da derrota para o Palmeiras na decisão do Campeonato Paulista daquele ano, o goleiro foi emprestado à Ponte Preta.

Na equipe de Campinas, o goleiro fez parte do elenco vice-campeão paulista de 1977. Ele ainda passou pelo Grêmio Maringá até 1981, ano em que retornou ao Corinthians. A segunda passagem de Cammarota pelo Parque São Jorge coincidiu com a formação da Democracia Corintiana.

O técnico do Corinthians na segunda passagem de Cammarota era Mário Travaglini. Ele chegou a barrar o goleiro, atitude que motivou um pedido de desculpas após dez anos.

“Ele me disse que num jogo contra o Flamengo os jogadores se reuniram e pediram para eu não jogar. Conclusão: fiquei no banco. Não esperava uma atitude assim do Wladimir, que tinha sido meu companheiro nos juniores. A Democracia Corintiana só foi boa para a imprensa e para acabar com a ditadura do Vicente Matheus, mas deu abertura demais. O Mário Travaglini perdeu o comando do time”, relatou Rafael Cammarota.

A segunda passagem do goleiro pelo Corinthians foi tão efêmera quanto a primeira, acabou no fim de 1981 e gerou um recado de Cammarota ao sucessor: “Quando saí, o Leão estava chegando. Encontrei com ele e disse: ‘Você vai ver o que é trabalhar aqui’. Eles enrolaram para renovar o meu contrato e só me liberaram para jogar fora do Estado. Disseram que eu tinha problemas disciplinares”.

DEMOCRACIA CORINTIANA PARTICIPOU DE MUDANÇA POLÍTICA NO PAÍS

  • Renato dos Anjos/Folhapress

    Foi denominado Democracia Corintiana o regime interno adotado no clube no início da década de 80.

    Os jogadores tinham voz ativa junto à diretoria para as decisões ocorridas no departamento de futebol, de contratações a decisões sobre programações para jogos. Liderada por Sócrates e Casagrande, a Democracia Corintiana teve importante papel político nacional, pois defendeu as eleições diretas, evocando a necessidade de “Diretas Já!”.

Cammarota foi para o Atlético-PR, time em que conquistou três títulos do Campeonato Paranaense. Ele conseguiu mais duas taças da competição regional quando vestia a camisa do Coritiba.

No Coritiba, o goleiro ainda venceu o Campeonato Brasileiro de 1985. Depois do título, Rafael Cammarota recebeu um telegrama de Adilson Monteiro Alves, dirigente do Corinthians: “Ele me deu parabéns por conquistar a taça com um time humilde. Eu respondi que o clube não tinha nada de humilde. Era grande e tinha eliminado eles num Morumbi com 80 mil torcedores”.

A resposta ao dirigente corintiano não foi o único desabafo do goleiro após o título nacional conquistado com vitória nos pênaltis sobre o Bangu no Maracanã. “Eu disse que a Democracia Corintiana tinha implodido e que o Rafael tinha vencido”, recordou o goleiro.

No entanto, Cammarota diz que não tem mágoa da Democracia Corintiana: “O zagueiro Gomes, que tinha feito parte do movimento, foi contratado pelo Coritiba. Eu podia ter atrapalhado a negociação, mas o recebi bem. Fomos campeões juntos”.

O que o ex-goleiro guarda é o amor pelo clube que o revelou. “Sempre fui corintiano e nunca gostei de jogar contra. Não me sentia bem. Hoje a maioria lembra do Rafael do Corinthians e depois do Rafael do Coritiba. O Marcos, em um programa de TV, disse que só há dois santos no futebol brasileiro: São Marcos e São Rafael”, contou Cammarota.

Aos 60 anos, Cammarota diz ter “corpo de 35 e mentalidade de 40”. Ele conserva cabelo e bigode iguais aos que usava quando era atleta. A grande mudança nesse aspecto foi a aparição de uma série de fios grisalhos.

Cammarota também conserva o jeito assertivo. Quando era atleta, isso rendeu a ele o apelido de “maluco”. “Eu não era polêmico, mas rebatia o que falavam. Quem faz isso hoje é o Rogério Ceni, que fala o que pensa. Eu era assim”, encerrou o ex-goleiro.