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Igreja Universal já teve time de futebol que revelou jogadores e pastores

Adriano Wilkson

Do UOL, em São Paulo

14/08/2014 06h00

A construção do templo de Salomão no centro de São Paulo é a materialização do gigantismo da Igreja Universal do Reino de Deus. Na virada do milênio, o bispo Edir Macedo, representado em mais de 200 países e seguido por 1,8 milhões de fiéis só no Brasil, tentou expandir seu império de fé sobre um terreno diferente, o futebol. No ano 2000, foi fundado o Universal Futebol Clube, que jogou uma temporada na segunda divisão do Campeonato Carioca.

A ideia era “evangelizar através do futebol” e dar oportunidades para jovens talentos renegados por outros clubes. O objetivo era não apenas vencer em campo, mas também “salvar a alma dos homens” que passaram pelo projeto, de acordo com as palavras de Valdo Ferreira, fiel da Universal e antigo treinador do time.

Apesar de arrastar milhares de torcedores a cada jogo (os ingressos eram vendidos durante os cultos), a aventura durou pouco mais de um ano e foi logo abortada pela direção da igreja, incomodado com maus resultados.

Se o clube rendeu poucos frutos em campo, ao menos revelou talentos para os quadros da instituição. Alguns jogadores que passaram pela equipe, acabaram virando pastores da Universal.

Valdo Ferreira, treinador do Universal Futebol Clube, time que a igreja manteve no ano 2000 - Reprodução/Facebook - Reprodução/Facebook
Valdo Ferreira, treinador do Universal Futebol Clube
Imagem: Reprodução/Facebook

“Eram jogadores renegados de alguns clubes que a gente abraçou, trabalhou, condicionou”, lembra Ferreira, ex-atleta que passou por vários times do futebol carioca. “Eram jovens de comunidades carentes, de favelas, que não tinham dinheiro para participar de treinos nos clubes grandes. A igreja os acolheu gratuitamente e deu tudo de que precisavam.”

"Através do futebol nós conseguimos chegar naquelas pessoas que por via da evangelização comum nós não conseguiríamos", disse na época o presidente do clube, o bispo Sérgio Dias, ao Sportv. Ele foi um dos idealizadores do projeto.

O escritor britânico Alex Bellos, ghostwriter de uma autobiografia de Pelé, escreveu em 2002 um livro sobre o futebol brasileiro e ficou impressionado com a trajetória do Universal FC. De acordo com ele, o clube provocou uma revolução dentro e fora de campo.

Em primeiro lugar, os atletas eram proibidos de machucar o adversário ou mesmo de falar palavrões. Valdo Ferreira confirma esse comportamento. “Não é nem o caso de ser da Universal, mas palavrão é uma coisa que não combina com um cristão. É claro que no futebol às vezes você perde a cabeça, mas palavrão a gente não falava mesmo.”

O ex-lateral Marquinhos, que também participou do projeto, disse a Bellos que até os cânticos da torcida foram traduzidos para versões cristãs e expurgadas de palavras agressivas. “Juiz, ladrão, Jesus é a solução!”, cantavam os fieis que discordavam da arbitragem.

Ferreira diz que jogadores de qualquer religião eram aceitos na equipe e que, por isso, os atos de fé, como orações e o pagamento de dízimo, eram opcionais a cada atleta.

A equipe disputou amistosos com clubes grandes, como Vasco e Atlético-MG. Em Belo Horizonte, o Universal chegou a levar cerca de 50 mil pessoas ao Mineirão no auge da empolgação boleira da igreja.

O time não durou muito tempo porque, de acordo com o ex-treinador, profissionais com pouca experiência no futebol foram contratados e o projeto degringolou. “A Universal é uma potência no mundo. Onde eles veem uma oportunidade, eles querem aproveitar. E quando começou a não dar certo o bispo Macedo resolveu terminar”, afirma Ferreira.

Há quatro anos, houve rumores de que o time poderia vir a ser reativado, mas isso não aconteceu.

Procurada pela reportagem, a assessoria de imprensa da igreja não havia atendido ao pedido de entrevista até a publicação desta reportagem.

Hoje, uma camiseta do Universal FC é vendida como uma relíquia em sites como o Mercado Livre por até R$ 180.