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"Palmeirense vai me agradecer", diz Brunoro após deixar Palmeiras

Brunoro concede entrevista ao UOL Esporte em seu escritório - Danilo Lavieri/UOL Esporte
Brunoro concede entrevista ao UOL Esporte em seu escritório Imagem: Danilo Lavieri/UOL Esporte

Danilo Lavieri e Vanderlei Lima

Do UOL, em São Paulo

23/12/2014 06h01

José Carlos Brunoro se mostrou satisfeito com o trabalho que desempenhou no Palmeiras nos últimos dois anos, mesmo com a equipe tendo lutado para não cair para a Segundona na reta final do Brasileirão deste ano.

O ex-diretor executivo afirmou que comandou um longo trabalho de reestruturação para que o clube pudesse voltar a comemorar no futuro. Por isso, ele crava que os palmeirenses ainda falarão obrigado a ele.

Na entrevista ao UOL Esporte, ele ainda explicou quem são as pessoas que Paulo Nobre precisaria ouvir menos, admite erro com a novela de Kardec e conta porque ficou um pouco afastado do futebol nos últimos seis meses.

Agora sem trabalho em um clube, Brunoro segue envolvido com sua empresa particular e volta a buscar uma vaga para trabalhar no futebol.

Confira a entrevista completa ao UOL de José Carlos Brunoro:

UOL Esporte: Qual o seu sentimento após deixar o Palmeiras?
José Carlos Brunoro:
O sentimento é de dever cumprido, estou aliviado porque foram dois anos de muita pressão e muita dificuldade. Minha família, inclusive, queria que eu ficasse um pouco fora. Quando os resultados não chegam... Até botaram o meu cartão na internet e todo mundo ligando e xingando, aquela coisa toda. O meu contrato terminava agora em dezembro, então, provavelmente, eu também não continuaria por causa dessa pressão da família. Por isso, digo que estou aliviado neste sentido, mas também super satisfeito com o trabalho que foi feito. Infelizmente, o trabalho foi analisado só pelo futebol, mas o futebol pegava uma parte do meu trabalho, não 100%. Mas é assim. No futebol, o pessoal direciona pra uma situação. O certo é que o Palmeiras vai estar muito melhor a partir de janeiro, vai ser um clube muito solidificado, muito estruturado, um dos mais estruturados do futebol brasileiro.

UOL Esporte: Como foi essa pressão da família?
Brunoro
: Minha mulher é sempre preocupada com as minhas coisas. Os meus filhos são pequenos, um deles tem dez e outro tem oito anos. E tem muita coisa na escola também, aquela de a molecada encher o saco deles. Mas senti que minha filha não queria que eu saísse do Palmeiras. Um deles até falou para eu abrir outro Audax!

UOL Esporte: Você disse que a análise ficou muito focada no futebol e lamentou. Quais são evoluções que ninguém fala?
Brunoro
: Na realidade eu fui contratado pra ser o CEO do clube. Eu tinha que implantar a profissionalização do departamento jurídico, do marketing, do futebol de base e do profissional. Tive que me dividir em todas essas áreas e ainda trabalhar em partes com o financeiro. Estruturei todos esses departamentos. No jurídico, temos agora o (André) Sica, que é ótimo advogado e já tinha trabalhado no Palmeiras. O Damiani na base, o Paciello, no financeiro, o Marcelo no marketing.. Tudo começando em março e abril do ano passado, com um diagnóstico de que tudo precisaria mudar no clube. Essa reestruturação precisava de tempo. É como fazer um prédio, você precisa de alicerce e faz o buraco para a fundação, coisas que ninguém vê.

Brunoro - Cesar Greco/Ag Palmeiras/Divulgação - Cesar Greco/Ag Palmeiras/Divulgação
"Eu dificilmente continuaria porque a figura do CEO dentro do Palmeiras não funciona. O Palmeiras também é um clube muito político. A figura do CEO acaba se misturando. Eu mesmo fiz a recomendação de terminar com este cargo, porque tem muita coisa política", afirma Brunoro
Imagem: Cesar Greco/Ag Palmeiras/Divulgação

UOL Esporte: O Palmeiras teve política de pés no chão e, mesmo assim, aumentou a dívida no fim da gestão. Por quê?
Brunoro:
É simples. Nós estávamos funcionando no primeiro ano com 35% do orçamento e no segundo ano com 45%. Então, pra você manter tudo isso, é difícil. Por isso que eu digo que, a partir de 2015, o Palmeiras praticamente tem a plenitude do orçamento, porque não terá nenhum recebível antecipado. Aí vai ser a realidade do Palmeiras no aspecto financeiro.

UOL Esporte: Você participou dessa reestruturação e na hora de colher frutos foi mandado embora. Fica magoado?
Brunoro
: Eu dificilmente continuaria porque a figura do CEO dentro do Palmeiras não funciona. O Palmeiras também é um clube muito político. A figura do CEO acaba se misturando. Eu mesmo fiz a recomendação de terminar com este cargo, porque tem muita coisa política, tem muita coisa diferente que todo mundo quer interferir nos departamentos. Acho que o meu cargo não se justifica no Palmeiras neste momento.

UOL Esporte: Você diz ter feito todo o trabalho de reestruturação e que frutos serão colhidos. No futuro, os palmeirenses vão dizer "obrigado, Brunoro"?
Brunoro: Não, não vão falar nunca no Brasil. A memória é muito curta aqui, mas acho que sim, eles deveriam ser agradecidos a mim. O palmeirense ainda vai me agradecer. Mas eu sou um cara muito pragmático quanto a isso no Brasil. Há três anos fui para o Irã. Alguém soube que eu estava lá e a federação iraniana de voleibol me chamou, fez uma homenagem e tudo mais. E isso eu nunca recebi no Brasil. Por isso digo, aqui a memória é curta.

UOL Esporte: Em determinado momento, você se afastou do futebol. Por quê?
Brunoro
: Quando veio o Gareca, eu achava que era melhor vir um brasileiro. Mas depois concordei porque era uma figura que não dividia o clube. Mas, tecnicamente, sempre apostei em um brasileiro. Nessa época, os diretores estatutários se aproximaram mais e começaram a palpitar mais. E, no mesmo momento, o Gianubillo saiu do marketing. Alguém precisava assumir e eu topei. Mas no futebol achei que já tinha muita gente trabalhando, era o Maurício, Omar, Genaro e o próprio Paulo. Era muita gente falando.

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  • Leonardo Soares/UOL

    ele é uma pessoa que está acostumada a ser o centro das atenções. Todas as decisões, por mais simples que fossem, passavam por ele. É algo dele que dificilmente vai mudar

    Brunoro

UOL Esporte: Você tentou mostrar isso para o presidente? No meio do ano falava-se que ele estava tomando muitas atitudes centralizadoras.
Brunoro:
O Paulo é assim, o Paulo é uma figura extraordinária, muito palmeirense. Acho que ninguém conhece tanto o Palmeiras quanto ele, só que ele é uma pessoa que está acostumada a ser o centro das atenções. Todas as decisões, por mais simples que fossem, passavam por ele. É algo dele que dificilmente vai mudar. Às vezes ele estava tocando algum assunto e vinha depois na sala me deixar a par. Ele absorve tudo, é uma esponja. Mas acho que algumas lições foram aprendidas.

UOL Esporte: O time da Série B era melhor do que o de 2014 da Série A?
Brunoro
: Após a Série B, ficamos com uma base boa, que era Prass, Luis Felipe, Henrique, Márcio Araújo, Alan Kardec, Valdivia e o Leandro. Mas aí surgiram propostas, o Luis Felipe teve o problema de assinar contrato errado, não seguramos Márcio Araújo e perdemos Kardec. Para piorar Marquinhos Gabriel e William Matheus precisaram sair. Então o time era melhor, estava mais estruturado.

UOL Esporte: Faltou ao Palmeiras abrir mão de um pouco de dinheiro e apostar em alguns jogadores?
Brunoro
: Acho que tudo foi feito certo desde a saída do Barcos. E, quando o Alan Kardec adquiriu esse status, igual ao Barcos, aí é que foi o erro de repetir a mesma situação. Porque inicialmente eu não sabia o tamanho do Barcos para a torcida. Não poderia deixar que o Alan, que fazia esse mesmo caminho, sair. Então a gente errou duas vezes na mesma situação. Mas é que faltava muito dinheiro mesmo. Muito.

UOL Esporte: Na entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo você pediu cuidado a Nobre com os assessores. Quem são eles?
Brunoro
: O Paulo é um cara de um coração de tamanho de um bonde. Ele ouve muito as pessoas, vai ouvindo, vai ouvindo e, como disse, parece uma esponja, vai absorvendo tudo. Aí ele pega o problema só para ele. Ele tem de selecionar as pessoas que ouve. Não pode ouvir todo mundo. Precisa selecionar melhor em quem confiar.

Brunoro 2 - Rivaldo Gomes/Folhapress - Rivaldo Gomes/Folhapress
"Isso eu senti um pouco, porque sempre fui um cara que atendeu na hora que quis, da maneira que eu quis. Já passei por críticas duras e já fui muito elogiado, mas sempre atendi a todos", afirmou Brunoro
Imagem: Rivaldo Gomes/Folhapress

UOL Esporte: Foi em 2014 que ele passou a ouvir muita gente?
Brunoro:
Em 2014 ele ouviu bastante gente. Muita (risos). Então eu acho que aí é complicado. Hoje que sou casado e ouço, no máximo, a minha mulher antes de tomar decisão. Antes fazia sozinho. Porque se você começa a ouvir todo mundo, você fica indeciso demais, por isso que é bom em todas as tomadas de decisão você ter, no máximo, três ou quatro pessoas para dividir.

UOL Esporte: Você não acha que faltou esclarecer melhor algumas situações no momento que os fatos ocorriam?

Brunoro: Isso eu senti um pouco, porque sempre fui um cara que atendeu na hora que quis, da maneira que eu quis. Já passei por críticas duras e já fui muito elogiado, mas sempre atendi a todos. É só não falar do pessoal, e sim do meu trabalho. Até briguei uma vez com o UOL por causa disso. Mas isso de não falar muito é uma filosofia adotada no clube. Só podia falar quem a assessoria autorizasse. Quando você pertence a uma equipe, você tem que seguir isso. Mas eu acho que os diretores falam pouco mesmo. Nunca vi o Omar dar uma entrevista. Os diretores estatutários não falaram também. Eu acho que tem de dividir um pouco mais.
UOL Esporte: A palavra final, então, sempre era da diretoria de comunicação?
Brunoro: O Paulo ouve bastante o Fernando Mello (diretor de comunicação). Ouve por questões de confiança e amizade. Mas o Fernando precisa ficar realmente um pouco mais voltado para a comunicação. Mas como ele é solicitado para tudo, ele dá opinião para todos os segmentos. Mas nem sempre a gente entende de tudo e de todos os segmentos. Quem precisa escolher melhor a hora certa de falar é o Fernando. Ele conhece comunicação, mas pode não conhecer de futebol, de marketing... O cara é diretor de comunicação. Ele precisa fazer coisas da comunicação, não de diretor comercial. Essa mistura atrapalha a ele próprio.
(Nota da edição - Fernando Mello respondeu às críticas de Brunoro após ser contatado pela reportagem: "Discordo do Brunoro. Se o Paulo [Nobre], de fato, me ouvisse muito, ele teria sido demitido há um ano e meio pelo conjunto da obra".)
UOL Esporte: E daqui para frente? Quais serão seus projetos?
Brunoro: Vou ter um período sabático: dois sábados livres só (risos). Estou vendo coisas da minha empresa. Alguns clubes já me sondaram. Eu preferia ficar em São Paulo, mas não sei se vai dar. Então, se tiver uma proposta boa, vou me preparar para mudar.