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Estados Unidos denunciam Del Nero e Ricardo Teixeira

Marcelo Sayão-22.out.2015/EFE
Imagem: Marcelo Sayão-22.out.2015/EFE

Do UOL, em São Paulo

03/12/2015 17h41

A Justiça dos Estados Unidos denunciou nesta quinta-feira Marco Polo Del Nero, presidente da CBF, e Ricardo Teixeira, ex-presidente da entidade. A solicitação foi feita pela procuradora-geral Loretta Lynch, do Departamento de Justiça de Nova York, e pelo procurador do Brooklyn, Robert Capers, com base em investigação iniciada em 2013. Os dirigentes brasileiros foram acusados de formação de quadrilha, com diferentes confederações, federações regionais, na Fifa e também em alguns laços com empresas de marketing para receber dinheiros indevidos.

No momento em que era anunciado nos Estados Unidos o seu indiciamento, o presidente da CBF, Marco Polo Del Nero, estava no prédio da entidade, no Rio de Janeiro, recebendo presidente de federações estaduais, por causa de um almoço de confraternização que está marcado para esta sexta-feira. A assessoria da Confederação ainda não sabe informar se o mandatário fará qualquer tipo de pronunciamento.

Secretário-geral da CBF, Walter Feldman afirmou que o posicionamento da entidade será dado por meio de uma nota publicado no site oficial.

Del Nero e Teixeira residem no Brasil; a Constituição estabelece que nenhum brasileiro pode ser extraditado, salvo o naturalizado, ou em caso de comprovado envolvimento em tráfico de drogas.

No entanto, os dois poderiam cumprir penas caso a Justiça brasileira dê prosseguimento às investigações feitas pelos Estados Unidos. "A respeito de pessoas que estão em outros países, temos alguns acordos com alguns países e não com outros. Não estou autorizada a dar detalhes específicos, mas posso dizer que faremos tudo o que for possível para trazer as pessoas para nossa jurisdição e faremos tudo o que for possível. Essa investigação é baseada nas evidências, temos diferentes caminhos para os inquéritos", afirmou Loretta Lynch, em entrevista coletiva.

"A mensagem desse indiciamento deveria deixar claro para todos os indivíduos culpados que querem permanecer nas sombras, esperando escapar da nossa investigação: vocês não nos deixarão fora. Vocês não escaparão do nosso foco", prosseguiu Loretta, que agradeceu ao Brasil e Colômbia pela ajuda nas investigações.

A procuradora-geral de Nova York pediu nesta quinta a prisão de outros cartolas, todos eles ligados a confederações latino-americanas e por razões parecidas: corrupção em acordos de transmissões de torneios das Américas, como a Copa América. 

Loretta Lynch afirmou que o esquema teve início em 1991. De acordo com ela, o FBI investiga o suborno e propina de US$ 200 milhões (quase R$ 800 milhões) em ações envolvendo o mundo do futebol nas novas ações.

Oito envolvidos aceitaram se declararam culpados e aceitaram fazer delação premiada, entre eles, dois brasileiros:  José Margulies, dono das empresas Valente e Somerton, e Fabio Tordin, ex-CEO da Traffic USA e executivo na Media World. O primeiro se declarou culpado por um esquema de de corrupção, fraude eletrônica e duas acusações de lavagem de dinheiro e terá que devolver US$ 9,2 milhões (R$ 34,9 milhões). Já o segundo se disse culpado por três acusações de fraude eletrônica e uma por sonegação de impostos. Ele terá que devolver mais de US$ 600 mil (R$ 2,2 milhões).

Além de Del Nero e Teixeira, foram pedidas os indiciamentos de Reynaldo Vasquez (Vice-presidente da Federação de El Salvador), Carlos Chávez (Ex-presidente da Federação boliviana de futebol e tesoureiro da Conmebol), Eduardo Deluca (Federação Argentina), José Luis Meiszner (Federação Argentina e ex-Secretário-Geral da Conmebol), Luis Chiriboga (Federação Equatoriana), Ariel Alvarado (Presidente da Federação Panamenha), Romer Osuna (Presidente da Federação Boliviana), Héctor Trujillo (Secretário-geral da Federação Guatemalteca), Manuel Burga (Ex-presidente da Federação Peruana), Rafael Callejas (Federação Hondurenha), Brayan Jiménez (Presidente da Federação Guatemalteca) e Rafael Salguero (Ex-presidente da federação guatemalteca de futebol e membro do Comitê executivo da Fifa). 

Durante a coletiva, Loretta foi questionada sobre a declaração de Joseph Blatter, presidente da Fifa, que afirmou que os Estados Unidos só se envolveram no caso após perderem o direito de sediar a Copa do Mundo.

“Chamo isso de ultrajante inconcebível. Nossa investigação é baseada em fatos e provas. Acho que ele está ciente das nossas acusações. Imagino que ele passou muito tempo lendo o indiciamento, o que fala por si só. Isto cobre anos de conduta por dezenas e dezenas de pessoas do passado para o futuro”.

O pedido de prisão dos cartolas acontece horas depois de a polícia suíça prender o presidente da Conmebol, Juan Angel Napout, e o presidente da Concacaf, Alfredo Hawit, que foram a Zurique participar de reunião da Fifa.

O procurador-geral do Brooklin, Robert Capers, explicou que muitos negócios que foram planejados por estes dirigentes envolviam competições que sequer aconteceram.

“Esses direitos eram vendidos para empresas que tinham contratos com as federações. Sabemos que os esquemas de corrupção envolviam fraude, lavagem de ativos e pagamento de propinas. Esses pagamentos eram feitos através de contatos entre executivos que ocupavam cargos muito altos, que recebiam e vendiam, de alguma forma, direitos de transmissão e benefícios para outras associações”, começou a explicar Capers, antes de detalhar mais as investigações.

“Os pagamentos de propina e suborno foram identificados por parte de empresas de marketing esportivo para diferentes executivos da Concacaf e Conmebol. Partidas das Eliminatórias da Copa foram vendidas desta forma. Alguns negócios não aconteceram, seriam negócios futuros e que visavam as Copas de 2018 e 2022. São milhões de dólares em propinas num esquema que se alastra por décadas”, ressaltou Capers.

Antes de finalizar seu pronunciamento, Caper ainda salientou que diversas informações foram obtidas a partir de delações e pedindo que, pessoas envolvidas no esquema e que ainda não tenham sido identificadas, se apresentem para atenuar suas punições.

“Três presidentes da Concacaf e três presidentes consecutivos da Conmebol estão relacionados com esses esquemas. Os seis eram parte do comitê da Fifa. Eles cooperam com as atividades de suas federações por mais de 25 anos, em alguns casos. Com as novas acusações, fica clara nossa intenção e aproveito a oportunidade para dizer que estamos investindo mais recurso e tempo para descobrir de onde vem esses pagamentos. Para nós, chega. Se você estiver envolvido em algum esquema, o momento é agora para você se aproximar e confessar”, concluiu Capers.

Entenda o caso

Em 27 de maio, sete dirigentes foram detidos, entre os quais José Maria Marin. Del Nero saiu às pressas da Suíça um dia depois das prisões efetuadas em Suíça. Desde então, Del Nero não fez mais viagens internacionais, faltando a seguidos compromissos pela Fifa e CBF.

Del Nero renunciou ao cargo no Comitê Executivo da Fifa na semana passada (26 de novembro), três dias depois de a Justiça dos EUA abrir processo contra ele.

Depois de anos morando na Flórida, nos Estados Unidos, Ricardo Teixeira voltou a morar no Rio de Janeiro quando tomou conhecimento das investigações contra ele, coordenadas pelo FBI.

Autoridades norte-americanas reuniram materiais que ligariam Del Nero a um esquema envolvendo José Maria Marin, Ricardo Teixeira, entre outros.

A empresa de marketing Traffic, controlada por José Hawilla, detinha exclusividade no gerenciamento das transmissões do torneio promovido pela CBF até então. No entanto, a partir de 2011, a Traffic teria sido obrigada pela cúpula da CBF a compartilhar contratos da Copa do Brasil com a empresa Klefer.

Segundo O Estado de S. Paulo, a Klefer pagaria à CBF R$ 128 milhões para ter direito aos torneios de 2015 a 2022, deixando a Traffic de Hawilla em segundo plano.

Em áudio obtido pela Justiça dos EUA após conversa telefônica entre Hawilla e Marin, foi levantado que a Traffic pagava propina de R$ 2 milhões por ano à CBF para continuar com os direitos da Copa do Brasil, torneio disputado anualmente.

Em determinado momento da suposta ligação telefônica obtida pelas autoridades, Marin pede a Hawilla para que Teixeira não receba mais parte da propina.

Del Nero declarou em 27 de maio que os contratos suspeitos e investigados pela Justiça norte-americana foram assinados por ex-presidentes da CBF.

O FBI também analisa o acordo entre CBF e a fornecedora de materiais esportivos Nike, nos anos 90, que contou com a intermediação da Traffic. Teixeira teria levado US$ 15 milhões em propinas; Hawilla com outros US$ 15 milhões.

Teixeira nega irregularidades quando esteve à frente da CBF e diz que Hawilla criou inverdades por vingança.

A Justiça dos EUA contou com a colaboração de José Hawilla, ex-parceiro comercial de Teixeira. Para não ser preso em regime fechado, J. Hawilla relatou detalhes de esquemas feitos na época em que comandava da Traffic, tendo Teixeira gerindo a CBF.