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Presidente do sindicato dos árbitros de SP usou votos fraudados em eleição

Vanderlei Lima e Vinícius Segalla

Do UOL, em São Paulo

04/02/2016 06h00Atualizada em 04/02/2016 16h41

A assembleia geral em que o presidente do Sindicato dos Árbitros de Futebol do Estado de São Paulo foi eleito para o cargo, em 12 de outubro de 2014, contou com, pelo menos, 14 votos fraudados, de árbitros ou auxiliares que não estavam presentes na sede da entidade no dia da votação. Seus nomes e assinaturas foram incluídos na lista de presença posteriormente, conforme mostram documentos analisados pela reportagem (veja abaixo). Alguns desses árbitros estavam atuando nos gramados em outras cidades do país na mesma data em que ocorreu a assembleia.

O presidente do sindicato dos árbitros (Safesp) é Arthur Alves Junior. Ele era candidato único, e ainda assim fraudou a lista de presença da assembleia em que foi eleito. Procurado pelo UOL Esporte para explicar o ocorrido, ele preferiu não se pronunciar.

Esta não foi a única vez em que Alves Junior fraudou uma ata de assembleia do sindicato que preside. Conforme revelou o UOL Esporte no dia 14 de janeiro, a ata da assembleia geral da entidade do dia 30 de setembro do ano passado traz a assinatura de 163 árbitros ou auxiliares. Desses, no entanto, 59 não participaram da reunião, e tiveram seus nomes incluídos dias ou até semanas após a assembleia.

No dia 22 de janeiro, em virtude das fraudes nas atas e outras denúncias que pesam sobre o cartola do apito, como uso de verbas do sindicato para benefício próprio (veja mais abaixo), o vice-presidente do Safesp, Leonardo Schiavo Pedalini, enviou um requerimento administrativo à diretoria executiva do sindicato solicitando a suspensão e posterior exclusão de Arthur Alves Junior do quadro social da entidade.

“O atual Presidente da SAFESP, Senhor Arthur Alves, tem sido alvo de série de denúncias gravíssimas, quanto a sua conduta como dirigente, com sucessivos escândalos. (...) A postura do dirigente supracitada, que é de conhecimento de todos, mostra grave violação as normas estatutárias desta entidade”, afirma o documento. 

Agora, caberá à comissão de ética apreciar a denúncia de que seu presidente teria ferido dois aspectos do artigo 6º do estatuto do Safesp:

"c) zelar pelo patrimônio e serviços do Sindicato, cuidando de sua correta aplicação;

f) pautar sua conduta profissional conforme os princípios da ética

Caso seja considerado culpado, uma assembleia geral será convocada para votar sua expulsão da entidade. Caso também se comprove que Alves Junior utilizou dinheiro do sindicato para o pagamento de contas pessoais, poderá ser aberta uma queixa-crime contra o dirigente, que então teria que responder pelos seus atos na Justiça criminal. 

A votação para presidente

Consta na ata de eleição do Safesp de 12 de outubro de 2014 que “foram registradas as presenças de 195 votantes, constatando-se um total de 195 assinaturas de associados do sindicato”.

A ata é acompanhada de cinco folhas de assinaturas. Os presentes assinam em ordem, cada um na linha abaixo ao anterior (apenas uma linha - rasurada - não conta com qualquer assinatura).

Na quinta e última folha, a assinatura do árbitro Leandro Bizzio Marinho consta na linha de número 183. No dia da votação, no entanto, ele estava apitando um jogo em Salvador, na Arena Fonte Nova, entre Bahia e Chapecoense. Como as assinaturas na lista de presença são colocadas em ordem, isso significa que, obrigatoriamente, todos os 13 árbitros que assinaram a lista depois de Marinho também não o fizeram na assembleia.

Leandro Bizzio Marinho falou com o UOL Esporte e confirmou que estava, sim, apitando um jogo em Salvador no dia da votação do sindicato. Perguntado sobre o que teria ocorrido para que seu nome e assinatura constassem na lista de presença da assembleia, ele disse: “Eu não sei o que ocorreu. Precisaria ver este documento, não sei dizer agora.”

Já o árbitro auxiliar Rogerio Pablos Zanardo, que assinou a lista de votação na posição 186, e que também estava atuando na Fonte Nova, no mesmo jogo de Marinho, tem uma explicação para o ocorrido: “Realmente, eu não estava na assembleia. Mas, um tempo depois, eu fui no sindicato, e o Arthur (Alves Junior) me passou uma série de documentos para assinar. Entre eles, acredito que estava o desta votação, eu devo ter assinado por engano”.

Repare assinatura de Rogerio Pablos Zanardo (nº186) na lista de presença da assembleia em SP; no mesmo dia em que ele estava apitando em Salvador

 

Calendário de árbitro da Federação Paulista de Futebol - Arte/UOL - Arte/UOL
Como se pode constatar no site da Federação Paulista de Futebol, o auxiliar Rogerio Pablos Zanardo atuava em Salvador no dia da eleição do sindicato de árbitros de São Paulo. Ainda assim, seu nome e assinatura constam na lista de presença (linha 186) da assembleia em que Arthur Alves Silva foi eleito presidente do Safesp
Imagem: Arte/UOL



Outras denúncias e pedido de afastamento

A fraude em atas de assembleia não é a única denúncia que pesa contra o presidente do Safesp. Conforme o UOL Esporte também revelou no dia 14 de janeiro, o cartola do apito foi demitido do cargo na comissão de arbitragem que ocupava há dez anos na FPF (Federação Paulista de Futebol) após ter sido acusado de assédio moral e sexual pela árbitra Fifa Regildênia de Holanda Moura. A corregedoria da federação analisou a denúncia e acabou por recomendar a demissão de Junior, que nega ter feito qualquer coisa.

Além disso, o próprio vice-presidente do sindicato (Safesp), Leonardo Schiavo Pedalini, afirma haver indícios de que Arthur Alves utilizou o dinheiro da entidade para fins pessoais. Diz também que o presidente da entidade impede a diretoria a ter acesso às contas da entidade. Já um dos membros do Conselho Fiscal do sindicato diz que Arthur o compeliu a assinar o relatório de contas do ano passado sem ter tido acesso às notas correspondentes aos custos anunciados.

Após a publicação da reportagem do dia 14 de janeiro, Arthur Alves Junior - por meio de seu advogado - convidou os repórteres do UOL Esporte para uma visita à sede do sindicato, onde seriam exibidos documentos contábeis que provariam a improcedência das acusações, e também as atas de assembleia sob suspeita de fraude.

Quando a reportagem chegou no local, porém, o presidente do sindicato disse não estar de posse dos documentos contábeis. Afirmou que seu tesoureiro tivera que sair, e ele não sabia onde estavam. Já a lista de presença da assembleia eleitoral foi exibida. Quando, no entanto, os repórteres pediram para fotografar o documento (a fim de confrontar os nomes dos presentes com o calendário oficial de jogos de futebol), Arthur Alves Junior não permitiu, alegando que aquele documento seria apresentado para a Justiça e que, por esse motivo, não deveria ser publicado. Depois deste episódio, Alves Junior não atendeu mais as ligações do portal.

Ocorre que atas de assembleias de sindicatos são documentos públicos, e o UOL Esporte obteve uma cópia junto ao Ministério Público do Estado de São Paulo, que instaurou um inquérito para verificar a lisura do pleito.