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Gustavo Nery recorda não convocação para Copa 2006: "nem eu sei o porquê"

Gustavo Nery conquistou a Copa América 2004, mas ficou fora da Copa de 2006 - AP Photo/Ivan Sekretarev
Gustavo Nery conquistou a Copa América 2004, mas ficou fora da Copa de 2006 Imagem: AP Photo/Ivan Sekretarev

Marcello De Vico e Vanderlei Lima

Do UOL, em Santos e São Paulo

24/07/2016 06h00

Dezoito anos jogando futebol por 13 clubes e três títulos de expressão conquistados ao longo da carreira: Campeonato Brasileiro em 2005, pelo Corinthians, Copa Sul-Americana em 2008, pelo Internacional, e Copa América em 2004, pela seleção brasileira. Mas poderia ter sido ainda melhor, nas palavras do próprio ex-lateral esquerdo Gustavo Nery. O que faltou? Em entrevista exclusiva ao UOL Esporte, o jogador que teve o São Paulo como clube mais marcante não esconde que a ausência na lista da Copa do Mundo de 2006 ainda não saiu da sua cabeça.

“Faltou essa Copa de 2006 para mim. Aliás, alguns amigos falam: ‘Por que você não foi para a Copa?’, e eu respondo: ‘Nem eu sei falar o porquê’, não sei explicar para os meus amigos. Eu falo: ‘Isso faz parte’. Vai ficar um buraco, eu já parei, segue a vida. Fica uma coisa que é marcada para os filhos, né?”, diz Gustavo Nery, que recorda tudo que passou na época da convocação – ele defendia o Corinthians e, no ano anterior, havia conquistado o Brasileiro.

“Eu tinha me machucado no Corinthians e eles ficaram em dúvida, e aí não me levaram, acabaram levando o Gilberto, mas estava tudo pronto na Granja [Comary], dava para eu ter sido convocado. Eu não sei se o motivo de eu não ter sido convocado, acho que foi por eu ter ficado um tempo parado, e naquela época eu estava disputando a Libertadores, queria jogar pelo Corinthians e acabei não jogando, e ficaram nessa dúvida, me levar e chegar lá e, de repente, machuca e é cortado”, conta o ex-lateral, que foi campeão da Copa América em 2004.

“Eu nem entrei no mérito, não perguntei nada para eles, e acabou não acontecendo. Naquele momento eu fiquei muito triste, psicologicamente me abateu um pouco. O Parreira não me falou nada. Depois da Copa América de 2004 eu me machuquei na Alemanha, tive que operar o braço, mas logo depois o Parreira voltou a me convocar. Eu estava num momento muito bom: em 2005 eu fiz parte das Eliminatórias e até em 2006, na primeira convocação, eu fui convocado. Depois foi quando veio a lesão e acabei não sendo convocado”, relembra.

Se eu encontrar [o Parreira] eu pergunto: ‘Pô, professor. Por que a não convocação para a Copa de 2006? O que aconteceu?

Gustavo Nery conta ainda que Parreira até teve oportunidade de lhe esclarecer a sua opção por Gilberto, mas não o fez. “Teve [oportunidade], mas não me esclareceu o porquê. Se eu encontrar eu pergunto: ‘Pô, professor. Por que a não convocação para a Copa de 2006? O que aconteceu? O que houve?’. Mas é isso aí, depois dali a vida seguiu”, acrescenta.

Tévez provoca e se dá mal

Um dos parceiros que Gustavo Nery teve ao longo da carreira profissional foi Carlos Tévez. Ambos fizeram parte do forte elenco corintiano que acabou sendo campeão brasileiro de 2005. Um ano antes, porém, eles estiveram em lados apostos: Brasil x Argentina, final da Copa América. A Argentina vencia a decisão por 2 a 1 até o fim do jogo; foi quando o atacante começou a provocar o time brasileiro, que precisou de poucos minutos para responder. Quase aos 48min, Adriano fez o gol que levou a partida para os pênaltis. Na decisão, o Brasil levou a melhor e fez a festa sobre os argentinos, que também contava com Andrés D’Alessandro.

Gustavo Nery comemora gol marcado pelo Corinthians contra o Grêmio, em 2007 - Eduardo Knapp/Folhapress - Eduardo Knapp/Folhapress
Imagem: Eduardo Knapp/Folhapress

“O detalhe que eu lembro é o Tévez na linha de fundo, juntamente com o Maicon na marcação, tentando esconder a bola na linha de fundo, fazer o tempo passar, e a gente em cima, e ele fazendo aquela catimba que é normal, né? Para tentar fazer o tempo passar mais rápido. E no lance seguinte desenhou uma jogada e a bola sobrou para o Adriano, e ele conseguiu fazer o gol de empate. Depois disso aí foi para os pênaltis, e pênalti é loteria. E foi um xinga daqui, outro xinga de lá. Inclusive depois eu encontrei o D’Alessandro, eu fui para o Zaragoza, fiquei seis meses no Zaragoza, e encontrei a turma toda lá no Zaragoza... E brasileiros, para eles [argentinos], é complicado. E depois, em 2008, eu encontrei com ele no Internacional e ele falou: ‘Não, não, passou’. Mas sempre fica aquela mágoa, aquela rixa”, diz.

Ainda antes das passagens por Inter e Zaragoza, Gustavo Nery passou pelo Corinthians, onde mais uma vez teve a companhia de argentinos: Tévez e Mascherano. “Recebi os dois em casa, para você ver... Não tive nenhum problema com eles quando convivi no Corinthians, foram pessoas que sempre me trataram bem. Sobre este lance da Copa América, a gente brincava, dava peteleco um na cabeça do outro: ‘olha, tá vendo, fez o que fez e a taça veio para gente’. O Tévez falava: ‘Tá bom, tá bom de m... [risos]’, brincando. Depois o Mascherano veio e falou: ‘Gustavo, preciso de uma camisa da seleção’. Trocamos camisa da seleção, a rivalidade foi mesmo dentro de campo, porque fora eu não tenho o que falar deles”, acrescenta.

Início da carreira: meia ou lateral?

A história de Gustavo Nery poderia ter sido totalmente diferente, não fosse uma decisão tomada antes de uma peneira no Santos, clube pelo qual se profissionalizou. A ideia era fazer o teste como meia, posição na qual atuava. Mas diante de tantos candidatos para a posição no meio-campo, Nery resolveu arriscar. E se deu bem.

Quando eu cheguei pra fazer o teste no Santos, eu vi uns 300, 400 moleques. Aí eu resolvi fazer o teste na lateral.

“Na época, quando eu cheguei pra fazer o teste no Santos, eu vi uns 300, 400 moleques. Aí eu resolvi fazer o teste na lateral esquerda”, recorda. E deu certo. Como lateral, Gustavo Nery chegou a ser eleito melhor jogador da posição no Campeonato Brasileiro de 2005, pelo Corinthians. Mas foi o São Paulo o clube pelo qual Gustavo Nery mais jogou: quase 100.

“Eu estreei já fazendo gol no Morumbi. Eu era um pouco franzino, fui entrando, tendo as oportunidades, e no São Paulo foram praticamente quatro anos. Eu vivi ali, tive oportunidade pelo São Paulo de ter participado da Copa América de 2004 no Peru, foi o São Paulo que me projetou para isso tudo. Depois eu tinha assinado um pré-contrato na Alemanha com o Werder Bremen, e aí eu fui pra lá”, relembra Gustavo Nery.

Laranja podre?

Outro episódio que ficou marcado na carreira de Gustavo Nery aconteceu justamente no São Paulo, em 2001. Ele foi afastado do elenco pelo técnico Nelsinho Baptista, junto com os companheiros Rogério Pinheiro e Carlos Miguel, e foi chamado de ‘laranja podre’ pelo treinador, que acreditava que os jogadores prejudicavam o grupo tricolor. Ainda assim, ele afirma não guardar mágoas do treinador, com quem trabalhou anos depois, no Corinthians.

Gustavo Nery defendeu o São Paulo por quatro anos e foi com a camisa tricolor que foi chamado de "laranja podre" pelo então técnico Nelsinho Baptista - Fernando Santos/Folhapress - Fernando Santos/Folhapress
Imagem: Fernando Santos/Folhapress
“Isso foi resolvido, passou. Eu encontrei com ele no Corinthians depois, aquilo passou. Claro que fica marcado, a gente sente um pouco pelo fato de ter acontecido naquele momento. Eu dei a volta por cima do que foi falado e aí passou, ele veio conversar comigo e falou: ‘Cada um segue o seu trabalho, nos respeitando profissionalmente. É para esquecer aquele fato ocorrido na época do São Paulo, agora a gente está aqui numa nova etapa, vamos seguir o nosso trabalho aqui’. É claro que naquele momento você sente o baque, mas seguimos o nosso trabalho e nos entendemos de uma forma normal, mas eu não tenho mágoa porque eu não sou de ficar guardando mágoa”, declara o ex-lateral.

E agora, o que fazer?

Fã de futebol, Gustavo Nery, hoje com 39 anos, planeja continuar trabalhando com o esporte. Aposentado dos gramados desde 2012, ele revela que tem algo especial em vista, mas diz não poder revelar.

“Tem muita coisa que a gente está estudando e que pode acontecer. Vai ser para o início de agosto, com futebol. Estou esperando uma resposta, estou me preparando psicologicamente, vai ser muito bacana, uma oportunidade fora do Brasil que envolve futebol, gerência, gestão, treinador, envolve de tudo isso um pouco. Não era uma coisa que eu pensava para a minha vida, que eu imaginava que poderia acontecer na minha carreira, porque eu gosto todo dia de treinar, e eu vou ter que largar isso um pouco. O convite foi de fora do Brasil”, completa.