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Como ser chamado de 'espetacular' atrapalhou Wilson Matias no Inter

Wilson Matias defendeu o Internacional e foi atrapalhado por um rótulo - Divulgação/AI Inter
Wilson Matias defendeu o Internacional e foi atrapalhado por um rótulo Imagem: Divulgação/AI Inter

Marinho Saldanha

Do UOL, em Porto Alegre

12/10/2016 06h00

Entre 2010 e 2012, qualquer citação ao volante Wilson Matias, do Inter vinha precedido de um adjetivo dado pelo vice de futebol Fernando Carvalho: Espetacular. A alcunha acompanhou cada passo do marcador em Porto Alegre. E o atrapalhou muito, na avaliação que faz quatro anos após deixar o clube. 

"Foi o que mais me prejudicou", dispara. "As pessoas tomaram que eu era espetacular. Sou um volante, não sou um Zidane. Se criou uma expectativa e quando eu ia mais ou menos diziam que eu não jogava bem", completa. 
 
Depois do Inter ele passou por Toluca, Veracruz, Chiapas, Dorados e Querétaro, todos no México. Hoje, de volta a Porto Alegre, onde quer residir após jogar por mais três anos profissionalmente, se prepara para um novo desafio. Está sob os cuidados do preparador físico Diego Mello e promete voltar no ano que vem aos gramados. 
 
Foram conquistas de Recopa, Libertadores, Gauchão, e o trauma de ter jogado na dura queda no Mundial de Clubes contra o Mazembe. Jogo que gerou seus piores dias como profissional. O diagnóstico da queda para os africanos, o sentimento que guarda em relação ao Inter, tudo você confere em entrevista exclusiva concedida ao UOL Esporte. 
 

Wilson Mathias, volante do Internacional - Daniel Cassol/UOL Esporte - Daniel Cassol/UOL Esporte
Imagem: Daniel Cassol/UOL Esporte

Como você avalia sua passagem pelo Inter... O que faltou para ter melhor aproveitamento? 
O que eu levo de melhor foi a conquista. Participei dos dois jogos da final Libertadores, foram as melhores coisas que tive, a experiência do Mundial... Mesmo que se tenha criado uma expectativa desnecessária. O Fernando Carvalho (vice de futebol do Inter) é uma grande pessoa, ele deu a entrevista e as pessoas tomaram que eu era espetacular. Sou um volante, não sou um Zidane. Se criou uma expectativa e quando eu ia mais ou menos diziam que eu não jogava bem. Mas depois fui para o México, fiquei lá jogando como titular por cinco anos... No Inter joguei com jogadores de muita qualidade como Kleber, com D'Alessandro, Guiñazu, jogadores muito bons... Damião, Oscar... Foi benéfico. Hoje posso falar que sou um dos poucos jogadores que ganhou a Libertadores, o Gaúcho em cima do Grêmio, e fui ainda campeão da Recopa pelo Inter. No Mundial não foi o resultado que queríamos, mas joguei e tiro sempre o lado positivo. O negativo foi o rótulo... 
 
Esta situação te prejudicou muito no Inter?
Foi o que mais me prejudicou. Os jogos que eu fiz, eu acho que fiz bem, mas sempre criavam e esperavam algo fora do normal. No jogo contra o São Paulo no Morumbi, fiz gol, a imprensa de São Paulo me colocou como um dos melhores do jogo. Eu acho que superei a expectativa, mas este rótulo fazia todos esperarem mais. Tirando isso, só tenho que agradecer ao Inter, à torcida, quem apoiou, quem criticou, isso só me fez crescer. Eu queria ter ficado mais, mas são coisas que acontecem e vamos crescendo. Pude voltar para o México para uma situação econômica melhor.
 
Você saiu do Inter em 2012...
Eu fui para Portuguesa, fiquei só dois meses jogando lá, o Geninho era um técnico muito bom e me colocou de capitão. Mas voltei e fui vendido para o Toluca. Lá no México eu já conhecia a Liga e tinha companheiros que jogaram antes comigo. Foi mais fácil adaptar. Não tive dificuldade, tinha jogado quatro anos e meio lá. Foi legal, foi bom para família, minha esposa não tinha morado fora e foi uma experiência boa. Agora eu estava no Dorados, o dono dos meus direitos era o Veracruz, não tinha feito pré-temporada por causa de lesão e isso me atrapalhou um pouco. E acabou que teve uma situação que eles não me pagaram, ficaram devendo uns quatro meses. Falei com meu empresário que era o momento de fazer um acordo e me recondicionar fisicamente para jogar mais uns três anos em alto nível. Fui eu que pedi para sair. Tinha mais um ano de contrato, até junho do ano que vem, mas optei por sair e fizemos um acordo. Minha esposa queria voltar, e vamos residir aqui. 
 
O que você pretende fazer, seus planos...
Meu empresário tem contato com times do México. Ainda estou pensando se volto para lá. Estou livre. Posso fazer qualquer coisa, voltar para o Toluca, já tem até algumas conversas. Mas minha ideia é ficar no Brasil. Já que vou morar aqui em Porto Alegre. Tem minha filha, minha mulher, estou buscando mais a estrutura da família do que o lado profissional. Fiz uma história bonita lá, mas se tiver algo legal no Brasil, pode ser. O futebol é dinâmico. 
 
Você estava no Mundial de 2010, foi titular contra o Mazembe, o que aconteceu naquele jogo? Como o Inter acabou perdendo? 
Eu acho que foi uma experiência boa ter ido, mas má de ter perdido o jogo. Chegamos lá e estavam jogando Pachuca e Mazembe. Fomos ver e foi um jogo horrível. Achamos que íamos fazer uns quatro gols neles fácil. No dia do jogo mesmo, estávamos muito confiantes. Quando tomamos o gol, deu uma desestruturada. O grupo confiou pela nossa qualidade que chegaria e ganharia, mas foi um jogo atípico. Tivemos chances, não entrou... Foi mais porque confiamos muito. O Mazembe, Pachuca, qualquer um deles achamos que iríamos atropelar. Quando se pega um jogo assim, sabendo que tem um grande time contra um time bem mais fraco, se relaxa. Se fosse um time mais forte teríamos mais cuidado. Mas entramos relaxados e acabou acontecendo isso. Perdemos e não tinha mais explicação. Uma vergonha, os piores dias que passei como profissional. Não era só o Rio Grande do Sul, era todo o Brasil. E a cobrança maior é nossa. Me cobrei muito. Depois dali tive para ir para o Zaragoza, muta gente não sabe, muitos falaram que saí do Inter por dinheiro, nada disso aconteceu. Tive proposta do Cruz Azul muito mais alta, não saí por dinheiro, estava feliz queria jogar no Inter. Não tinha que sair. 
 
Então você queria ficar...
Por mim eu estava disposto a ficar e trabalhar, reverter a situação, a expectativa criada. Mas o futebol é dinâmico, o Inter queria recuperar o investimento, tive um bom crescimento financeiro... Mas fui com uma espinha na garganta, me cortando, pensando que poderia ter dado um pouco mais, contribuído mais para um time grande como o Inter que me abriu portas, mas infelizmente saí da forma que foi. Assim é o futebol. É levantar e seguir a vida. O Mundial foi um jogo atípico, um jogo em que nada dá certo, os caras acharam os dois gols e jogaram o tempo todo se defendendo, fazendo cera. Jogador por jogador, do Inter e Mazembe, éramos muito superiores. Tanto que na disputa de terceiro lugar, vencemos fácil um adversário parecido. Entramos doídos contra eles. Se tivéssemos entrados assim, se não tivesse visto o jogo deles, estaríamos mais focados, mais ligados no jogo. 
 
Hoje você vê o Internacional em situação delicada... Tem acompanhado? Acha que o clube sai desta situação? 
Estou na torcida. Tenho amigos no Inter como o Celso Roth, pessoas que me apoiaram como o Fernando Carvalho. É uma tristeza, mas é uma fase. Quando eu estava no clube, o Roth tinha opções sobrando, eu no banco, o Tinga também, era muita gente, agora não tem tantas opções. Eu torço para não cair, o Inter é muito grande, é uma tristeza ver o Inter nesta situação. Para o bem do futebol, não pode cair. Estamos na torcida. 
 
Você guarda alguma mágoa do Inter?
Não guardo mágoa do clube. Só me proporcionou coisas boas. A torcida cobrar quando perde é normal. Só agradeço a Porto Alegre, ao clube, e por isso decidi morar aqui. Tomei decisão pessoal de ficar aqui. Só tenho a agradecer e tenho orgulho de ter participado do grupo vitorioso do Inter. Por mais alguns comentaristas tenham falado muita coisa, estou na história do Inter. Participei de jogos importantes e fica marcado, nada vai mudar nem apagar isso. As medalhas estão aqui em casa. Agora tenho é que agradecer a chance e também além do Inter, a família da minha esposa, minha filha, nasceu fora mas é gaúcha ficará aqui. Vamos criar raízes e torcer para ela ser Inter e não Grêmio. (Risos) Não tenho mágoa e minha meta é só treinar para estar bem quando fechar com um time. Ficar no Brasil e mostrar que tenho qualidade para jogar aqui, lá no México não preciso provar, mas aqui quero jogar para minha família, minha filha crescer e ver o Brasil, não só o México. E o Inter é o Gigante, se tivesse mágoa seria ingrato. Pela chance de vestir a camisa. Muitos passam, poucos conquistam e eu participei disso no Inter.