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Medellín mostrou que a tragédia da Chapecoense é universal

Felipe Pereira e Gustavo Franceschini

Do UOL, em Medellín (Colômbia)

01/12/2016 13h06

Até segunda-feira gritar o nome de outro time era um sacrilégio. A regra foi subvertida no Estádio Atanasio Girardot nesta quarta e o mundo aplaudiu. A manifestação coletiva comove, mas a solidariedade do povo de Medellín vai muito além. Está também nas atitudes invisíveis que não serão televisionadas para o mundo.

Mauricio não aceita que o repórter do UOL Esporte pague a corrida. O motorista do Uber justifica a gentileza dizendo que ajudar quem leva informações ao Brasil é a única maneira ao alcance dele de auxiliar as famílias das vítimas do acidente. Ainda lamenta que o valor da contribuição é pequeno porque a corrida é curta.

Os parentes também são a preocupação dos 222 voluntários que se apresentam no aeroporto de Medellín a partir das 6h30 da manhã. Psicólogos, tradutores e assistentes sociais querem ser úteis às mães, pais e irmãos dos mortos. Acreditam, e com razão, que é uma forma de confortar os familiares.

A comoção mundial por tantas vidas que se foram é compreensível. Mas a Chapecoense já carregava a simpatia dos brasileiros. Trata-se de um sentimento difuso que fazia grande parte dos torcedores de qualquer equipe terem uma quedinha pelo time de uma cidade que até outro dia tinha um aeroporto com cara de rodoviária.

Talvez seja justamente a origem do clube o motivo da identificação. A Chape não nasceu Corinthians, nem Flamengo, precisou ralar muito. Repetiu no futebol o esforço diário de milhões de brasileiros que procuram um lugar ao sol. Para isso, o clube precisou de força de vontade, profissionalismo, humildade e perseverança.

Ou seja, a ascensão da Chapecoense representa valores que os pais desejam que seus filhos aprendam. Os moradores de Medellín reagiram da forma que todos gostariam ser tratado nos momentos de grande perda.

O clima de solidariedade nascido da conexão Chapecó Medellín se alastrou pelo planeta. Gigantes como Real Madrid, Barcelona, Bayern e PSG prestaram homenagens. Num jogo da bilionária liga inglesa os torcedores do Leed’s e Liverpool, time com lema we will never walk alone, homenagearam a Chape.

Mas o time catarinense que sonhou com a glória internacional terminou abatido em solo estrangeiro. As investigações estão em curso, mas se sabe que o avião não tinha combustível e não se respeitou as regras internacionais de abastecimento. Parece fazer sentido a linha de trabalho de que a companhia indicada pela Conmebol tentou economizar na querosene de aviação.

Caso se confirme que a ganância tenha derrubado a aeronave, a Chape foi vítima de apego a outro tipo de valor, o valor monetário. A história será ainda mais exemplar. O time que fazia tudo certinho sofre por causa da sede humana por encher o bolso.

Os dois caminhos da vida ficarão escancarados. Caberá a cada torcedor escolher que lado deseja estar. Aos parentes das vítimas, não resta escolha. Vão receber as pessoas que mais amam em caixões lacrados.