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Sonho da presidência, Perrella e ídolo. Bruno Vicintin abre o jogo

Bruno Vicintin conta como se tornou vice-presidente de futebol do Cruzeiro - Washington Alves/Light Press/Cruzeiro
Bruno Vicintin conta como se tornou vice-presidente de futebol do Cruzeiro Imagem: Washington Alves/Light Press/Cruzeiro

Thiago Fernandes

Do UOL, em Belo Horizonte

15/03/2017 04h00

É quase impossível falar sobre os bastidores do Cruzeiro e não tocar no nome de Bruno Vicintin. O vice-presidente de futebol se tornou peça-chave do clube desde agosto de 2015, quando foi nomeado para o cargo. Próximo de completar 20 meses no cargo, o dirigente concedeu entrevista exclusiva ao UOL Esporte e abordou todos os tipos de tema.

Na conversa com a equipe de reportagem, ele comentou o desejo de assumir a presidência do clube, demonstrou preocupação com a possibilidade de volta do senador Zezé Perrella, contou como deixou a organizada TFC para se tornar membro da cúpula e revelou quem é o seu maior ídolo.

Sobre a possibilidade de suceder Gilvan de Pinho Tavares, Vicintin é sincero: “Claro que 8 milhões de torcedores sonham. Hoje, estatuariamente, eu não posso. O doutor Gilvan deixou um legado grande para o clube, que é a honestidade, que era para ser obrigação e virou qualidade de dirigente no Brasil. Esse legado tem que seguir no clube. Mas eu só posso sucedê-lo caso haja mudança estatutária. Se não houver, eu trabalho até o dia 31 de dezembro com todo esforço e dedicação para colocar o Cruzeiro onde ele merece”.

“Caso o estatuto não mude e o doutor Gilvan decida por outro nome, vai ter meu total apoio e eu vou decidir se continuo ou não na diretoria, caso seja convidado. Mas, o mais importante é o bem maior, que é o Cruzeiro”, acrescentou.

Confira, abaixo, outros pontos abordados na conversa com o vice-presidente de futebol do Cruzeiro:

Bruno Vicintin, vice-presidente de futebol do Cruzeiro - Wahington Alves/Light Press - Wahington Alves/Light Press
Imagem: Wahington Alves/Light Press

Você assumiu a vice-presidência de futebol do Cruzeiro em um momento muito conturbado. Como tomou aquela decisão? Os familiares apoiaram?
Na verdade, aquele jogo Santos 1 x 0 Cruzeiro foi um jogo que me marcou muito. Eu estava saindo do Mineirão naquele dia, quando todo mundo estava muito triste e muito preocupado. Eu estava no carro com dois amigos e meu filho. O rádio estava ligado e tinha um comentarista falando sobre a necessidade de as pessoas ajudarem o Cruzeiro. E ele citou muito o meu nome sugerindo que me levassem para o profissional. Eu era superintendente da base. Meu filho tem sete anos e escutou aquilo. Ele falou uma coisa que me marcou demais e nunca vou esquecer. Ele disse: ‘Papai, o Cruzeiro precisa de você’. Sempre que eu conto essa história eu fico até emocionado. No dia seguinte, conversei com alguns conselheiros dentro do Cruzeiro, eu, Toninho, Gatti, Marcinho, doutor Lemos... nos reunimos e fomos na sede administrativa dar apoio ao doutor Gilvan e falar que todos ali queriam ajudar. Estávamos dispostos a qualquer coisa para que o Cruzeiro saísse daquele momento. Na hora, o Toninho sugeriu ao doutor Gilvan que me colocasse de vice de futebol. Eu fiquei até constrangido, porque poderia parecer que tinha sido algo combinado e não foi. Aí o presidente não falou nada e eu fiquei aliviado, porque teria que dar uma resposta ali sem consultar meus familiares, teria sido pego de surpresa. Depois fui para meu escritório trabalhar, e o Guilherme Mendes me ligou dizendo que o presidente queria falar comigo. O doutor Gilvan então me convidou para ser vice de futebol. Eu falei que ficava honrado e só teria que conversar com minha família antes de respondê-lo. Ele falou ‘tudo bem, a coletiva está marcada na Toca II só para daqui duas horas’. Eu liguei para a minha esposa, ela ficou assustada, surpresa, chorou bastante, mas me apoiou em tudo. Sabia que era um momento em que eu não podia me omitir, eu não ia aceitar me omitir. Para mim, seria muito mais cômodo não aceitar o convite. Mas não faz parte do meu feitio. Conversei também com meu pai e minha mãe, e eles me deram apoio. Só não cheguei a conversar com meus filhos, porque eles são muito novos ainda para entender isso. Então eu fui para a coletiva e o resto da história todo mundo sabe.

Em algumas entrevistas, você costuma brincar sobre o cargo de dirigente estatutário. Como faz para conciliar o trabalho fora do futebol e a necessidade de administrar o Cruzeiro ao lado do presidente Gilvan de Pinho Tavares?
O dirigente estatutário, que é meu caso, tem uma dificuldade grande, por ser um cargo não remunerado. E uma empresa como o Cruzeiro exige quase que tempo integral de quem esteja tocando ela. O doutor Gilvan dedica 100% do tempo dele e eu posso afirmar que dedico pelo menos 70% a 80% do meu. Sei que estou sacrificando minha família e minhas empresas pelo Cruzeiro, mas eles sabem que era um sonho que eu tinha e estão me apoiando nisso. Existe também um preconceito de que dirigente estatutário não entende de futebol. Em alguns casos, isso é verdade. Por isso acho importante que o dirigente estatutário ganhe experiência na base por alguns anos antes de assumir um cargo no profissional. Em alguns casos anteriores no Cruzeiro, isso não ocorreu. Hoje temos outros dirigentes estatutários na base, que fazem este trabalho voluntário, o Toninho, o Hermínio Lemos, o Leo Saraiva e o André Castro na Toca I, que ajudam muito o clube.

É um torcedor apaixonado pelo Cruzeiro. É possível ver isso em suas aparições no Twitter. Como deixou a torcida para se tornar um dirigente importante no cotidiano do clube?
O caminho foi longo. Começou com uma ideia de frequentar o clube para ajudar mesmo, como torcedor, comprando uma cota de sócio e estando sempre presente. Na época, eu e o Fabrício Reis, que hoje também é conselheiro, começamos a frequentar a confraria, a sede, o parque esportivo do Barro Preto. Fiz grandes amigos nessa caminhada, desde os tempos de arquibancada, de viajar para acompanhar o Cruzeiro fora de Minas e fora do Brasil. Amigos para a vida toda. O presidente da TFC, por exemplo, o Clebinho, foi quem me levou para a torcida organizada, me apadrinhou. Seguimos caminhos diferentes. Ele na bancada e eu do lado da diretoria, mas sempre com os mesmos princípios de fazer tudo pelo Cruzeiro e não ter nada do Cruzeiro.

Bruno Vicintin, novo vice-presidente de futebol do Cruzeiro - Washington Alves/Light Press/Cruzeiro - Washington Alves/Light Press/Cruzeiro
Imagem: Washington Alves/Light Press/Cruzeiro

Você assumiu o cargo de vice-presidente de futebol em meados de 2015. Como avalia sua gestão de lá para cá? O que melhorou e o que acha que ainda pode melhorar?
A gente acertou no primeiro momento em contratar o Mano Menezes. Ele foi importantíssimo naquele processo de salvar o Cruzeiro no final de 2015, quase classificamos para a Libertadores. Tomamos, com participação ativa do doutor Gilvan, uma série de medidas também que uniram os departamentos dentro do clube para reaproximar a torcida do time, como reduzir o preço dos ingressos, dos sócios e das camisas oficiais, mostrando ao torcedor que estávamos todos dispostos a mudar a chave juntos. Funcionou. Perdemos na saída do Mano. Como o time estava organizado e os jogadores mantidos, pensávamos que o Deivid, que tinha participado de todo planejamento de 2016 ao lado do Mano, pudesse dar continuidade ao trabalho. Não deu certo. A falta de recursos no início do ano também atrapalhou. Fazendo mea-culpa, eu acreditava que a gente conseguiria fazer com que as apostas se transformassem em realidade, o que, infelizmente, não aconteceu. Erramos muito. A partir do momento que vimos que tínhamos errado, aproveitando a renovação de contrato de TV, tivemos que ser agressivos no meio do ano de novo para salvar o clube no rebaixamento. Não ter sido rebaixado é o único título que o clube pode perder. Conseguimos estabilizar novamente. No início de 2017, finalmente conseguimos fazer uma equipe estruturada, com o Tinga na gerência, o Klauss na diretoria, o Toninho na base. Conseguimos fazer uma equipe para dirigir o Cruzeiro de alto nível. Com essa equipe a gente acredita que os resultados vão vir.

Como cruzeirense fanático, qual o seu maior ídolo? Por quê?
Meu maior ídolo eu não vi jogar, é o Piazza. Acho que é o maior ídolo da história do Cruzeiro. São 14 anos de clube. Ele só vestiu duas camisas em sua carreira. A do Cruzeiro e a da Seleção Brasileira, e foi capitão das duas. Foi capitão nos nossos títulos da Taça Brasil e da Libertadores, foi capitão da Copa de 74 e campeão do mundo em 70 com a Seleção. Sempre sonhei em ter atletas que passem a carreira toda no Cruzeiro. O Piazza é o grande exemplo disso.

Como vê a pré-candidatura de Zezé Perrella à presidência do Cruzeiro?
Como cruzeirense, eu vejo com preocupação, principalmente por ele ter ainda mais um ano no Senado. Isso representa um terço do mandato dele como presidente do Cruzeiro. Ele declarou que pretende trabalhar de quinta à tarde a sábado. A agenda de um senador é muito cheia. E o futebol mudou muito. O futebol hoje exige uma dedicação quase exclusiva dos dirigentes para se tocar. Eu não consigo ver nenhuma empresa no mundo que funcione com o presidente trabalhando só na sexta-feira, por melhor que seja a sua equipe. Nunca vi isso funcionar. Já tivemos exemplo negativo dessa ausência no próprio Cruzeiro, no segundo semestre de 2011, quando Zezé assumiu a cadeira no Senado. Vejo com preocupação. Se ele fosse abrir mão das outras coisas, eu não estaria preocupado como estou, embora tenhamos tido exemplos no Vasco e no Inter de dirigentes que tiveram muito sucesso no passado e voltaram para o clube e colheram resultados desastrosos. Isso prova que o futebol mudou muito. E olha que esses dirigentes que voltaram dedicaram o tempo todo ao clube. Uma pessoa que está há muito tempo longe do futebol, e ainda por cima dedicando pouca parte do tempo ao clube, acho perigoso.