Topo

Sem esgoto ou segurança, o Maracanã do Uruguai dá as costas para o futebol

Bairro do Maracaná, no Uruguai - PMB Montevidéu
Bairro do Maracaná, no Uruguai Imagem: PMB Montevidéu

Tales Torraga

Colaboração para o UOL, em Montevidéu (URU)

23/03/2017 04h00

Em vez de grandeza, pobreza. Montevidéu também tem seu Maracanã, mas ele está longe das façanhas ou de qualquer apreensão com a Celeste Olímpica que hoje enfrenta o Brasil no Estádio Centenário às 20h (de Brasília).

Casa no bairro de Maracaná, no Uruguai - Reprodução - Reprodução
Casa no bairro de Maracaná, no Uruguai
Imagem: Reprodução

O UOL Esporte visitou o bairro Maracaná (assim mesmo, com acento), na periferia da capital uruguaia. O Maracaná fica perto do Cerro, zona bem mais conhecida a quem percorre a capital uruguaia. Divide-se em duas partes: o Maracaná Sul, mais carente, de ruas de terra, e o Norte, com só dois acessos asfaltados e estrutura mínima de uma clínica médica e uma escola infantil. Fica na beira do cruzamento das estradas Ruta 1 e Camino Cibils, a 13 quilômetros do Estádio Centenário, no Parque Battle.

O bairro foi batizado em 1981, e a homenagem dos moradores ao “Maracanazo” é resquício de outro título do Uruguai em cima do Brasil - o do Mundialito daquele ano, conquistado pela Celeste no Centenário por 2 a 1, gols de Barrios, Victorino e Sócrates.

O nome Maracaná é a única referência ao futebol. Não há placas, bustos ou ruas com homenagens a jogadores. Lá vivem 10 mil pessoas, 5% das cerca de 200 mil que lotavam o Maracanã original de 1950.

Localização do bairro de Maracaná, no Uruguai - Google Maps/Reprodução - Google Maps/Reprodução
Localização do bairro de Maracaná, no Uruguai
Imagem: Google Maps/Reprodução

Sem Ghiggia, nem Suárez

O “Maracanazo’ é patrimônio histórico dos uruguaios, mas o futebol está longe de chamar atenção no Maracaná. Segurança, transporte e saneamento básico, sim. “Ouvimos os jogos da seleção, do Nacional e do Peñarol no rádio. Mas é diversão. Não temos energia para esses assuntos. Acordo às 3h para tomar o ônibus das 4h, senão não chego ao trabalho às 5h”, diz Javier Ascabar, de 35 anos, que passa nove horas por dia em uma quitanda a seis quilômetros dali, em um bairro chamado Las Torres. “As crianças brincam de bola, falamos de um gol ou outro, mas nada que tome muito nosso tempo.”

Nas conversas com mais três habitantes do Maracaná, apenas um sabia quem era Alcides Ghiggia, autor do gol da conquista de 1950. O nome do “El Pistolero” Luis Suárez tampouco importa. “Jogador de futebol? Tô pensando na comida de amanhã, filho”, respondeu o aposentado Matías Acosta, de 73 anos, que na sequência aconselhou a reportagem a sair do bairro para não correr perigo.

Bairro de Maracaná, no Uruguai - Reprodução/Subrayado - Reprodução/Subrayado
Bairro de Maracaná, no Uruguai
Imagem: Reprodução/Subrayado

O “Maracanazo” que se dane

Os moradores do Maracaná lutam para reverter o que consideram um grande descaso da prefeitura de Montevidéu, que não reconhece o espaço como bairro oficial. “Nossa intervenção no Maracaná é por meio do PMB”, responde a prefeitura, citando seu Programa de Melhora dos Bairros.

A informalidade trava consertos simples como a colocação de telefone público ou a melhora de calçadas nas duas únicas ruas de asfalto. “Se algum político resolver olhar para cá e der o seu nome para o bairro, pouco ligamos. Que me importa o Maracanazo?”, disse, entre um mate e outro, a dona de casa Yanina Silva, 42 anos.

De acordo com a associação de moradores do Maracaná, a oficialização do bairro está prevista para 2024, junto com a entrega do sistema de saneamento básico.