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Entenda a questão legal que adiou o julgamento do caso Victor Ramos

Victor Ramos tem inscrição no ano passado analisada pelo Tribunal Arbitral do Esporte - AFP PHOTO / Heuler Andrey
Victor Ramos tem inscrição no ano passado analisada pelo Tribunal Arbitral do Esporte Imagem: AFP PHOTO / Heuler Andrey

Marinho Saldanha *

Do UOL, em Porto Alegre

05/04/2017 04h00

O previsto eram oito horas, mas depois de pouco mais de cinco, os árbitros do Tribunal Arbitral do Esporte (TAS) optaram por suspender a audiência que analisa o pleito do Internacional no caso Victor Ramos. A questão para isso é a capacidade do Tribunal em avaliar o caso. Até quinta-feira a decisão de prosseguir ou não será anunciada, e todos os envolvidos consideram seguras suas alegações.

O pedido partiu do Vitória. Segundo o clube rubro-negro, o recurso do Inter não poderia ser levado ao TAS sem ser julgado no STJD, um caso conhecido como "supressão de instância", que é quando determinada ação vai para um tribunal superior sem passar pelo anterior. O Procurador-Geral do STJD, Glauber Navega Guadelupe, optou pelo arquivamento em 19 de dezembro do ano passado. Assim, o caso não foi julgado na Justiça Desportiva do Brasil. 

Para sustentar tal alegação foi convocada participação do advogado Wladimyr Camargos. Ele foi apresentado como especialista e explicou durante aproximadamente 30 minutos como funciona a Justiça Desportiva do Brasil. Depois da participação, por volta das 9h pelo horário brasileiro, os árbitros suspenderam a audiência, para descontentamento do Internacional. Irão avaliar a jurisdição do TAS sobre a pauta.

Segundo apurou a reportagem do UOL Esporte, o clube gaúcho considera que, uma vez que foi analisado o mérito do caso, é necessário garantir o 'direito de recurso'. Ou seja, a parte descontente tem a garantia de procurar uma instância superior. E a corte acima do STJD, adequada para isso, é o TAS.

A questão é polêmica e divide opiniões. Juristas ouvidos pela reportagem têm análises diversas sobre o caso. Na avaliação de Felipe Ezabella, não caberia recurso ao TAS. Ele ainda questionou a eficácia de qualquer decisão do Tribunal. "Ele é um tribunal recursal. Na Justiça Desportiva hoje vivemos um limbo, sem a certeza de qual o melhor caminho a percorrer. A decisão deles terá validade no Brasil? É outra discussão importante", disse citando o artigo 90-C da Lei Pelé, que impede que decisões desportivas sejam submetidas à arbitragem. 

Inter deve ter a chance do julgamento

Mesmo com debate, a tendência ainda é positiva ao Internacional, ao menos no que diz respeito a ser julgado pelo TAS. A garantia de recurso à corte prevista pela CBF e o ato de arquivar como 'decisão' podem pesar na análise dos árbitros.

"O TAS é o revisor das decisões do futebol. Há um termo chamado julgamento 'de novo'. Ou seja, o TAS está livre para receber inteiramente a demanda, considerando fatos novos e provas que não foram apreciados ou submetidos ao juízo de origem. Não estou analisando o processo, mas cabe o julgamento, sim", sublinhou Marcelo Franklin, especialista em direito desportivo. "O Inter está correto em recorrer. Sem entrar no mérito, mas o órgão acima do STJD é o TAS, então os recursos caem para lá. Eu diria que a tendência é que recebam o pedido", completou. Tal tese é mais forte também na análise de outros profissionais ouvidos pela reportagem.

A análise, porém, é rebatida pelo diretor jurídico do Vitória, Augusto Vasconcelos, que volta de Lausanne, na Suíça, onde fica localizado o TAS, ainda nesta quarta-feira (5). "Consideramos que isso [TAS julgar o caso] não é possível. O pedido de arquivamento é feito pelo Procurador. O que o presidente do STJD pode fazer é nomear um outro Procurador para avaliar se faz a denúncia ou não. Mas jamais o Presidente pode fazer a denúncia sem antes ter o aval da Procuradoria, porque não teve processo. Já imaginou quantos tipos de denúncia deve chegar à Procuradoria, infundada... Iria parar todos os campeonatos, do Brasil, do mundo...", defendeu.

"Esse argumento do Inter de inscrição irregular de atleta é uma pirotecnia jurídica. É uma manobra para reverter o resultado que não obteve em campo", acrescentou Augusto.

O depoimento que levantou dúvidas

O único depoimento que ocorreu na audiência realizada na terça-feira foi de Wladimyr Camargos. O jurista, renomado por participação na construção do CBJD e em diversos processos nacionais, falou por aproximadamente 30 minutos. Respondeu três perguntas dos árbitros e uma dos advogados do Inter.

"Não sou advogado de nenhuma das partes, fui convidado pelos advogados do Vitória para ser arguido enquanto especialista. Falei em termos processuais, como funciona o CBJD, era mais para esclarecer como funcionam os processos no STJD. Não é nada conclusivo. Eles fazem as perguntas, respondemos. Não participei do restante da audiência, só deste momento", disse ao UOL Esporte.

Camargos não tem autorização para emitir qualquer opinião sobre o caso. "Não houve pergunta específica sobre artigo ou peculiaridade do STJD, mas questionamentos gerais. Eles são todos estrangeiros, não sabiam como funciona a Justiça Desportiva brasileira. Foi importante para esclarecer tudo", finalizou.

Até quinta-feira uma manifestação oficial irá partir do Tribunal. São quatro opções que se apresentam: considerar que não há capacidade para analisar o caso e simplesmente desconsiderar; considerar que não há capacidade de julgar o caso e ordenar que o STJD julgue; considerar que há capacidade de julgar o caso e marcar uma nova audiência; ou considerar que há capacidade de julgar o caso e analisar as argumentações a partir do que foi entregue por escrito.

* colaborou Marcello De Vico