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Favela e choro. Bielsa teve uma "final para esquecer" contra o SP em 1992

Marcelo Bielsa é hoje um dos mais respeitados entre os treinadores de futebol - Daniel Ochoa de Olza/AP
Marcelo Bielsa é hoje um dos mais respeitados entre os treinadores de futebol Imagem: Daniel Ochoa de Olza/AP

Bruno Grossi*

Do UOL, em São Paulo

17/06/2017 04h00

Um dos técnicos mais folclóricos e respeitados do futebol atual, Marcelo "El Loco" Bielsa viveu um dos seus primeiros grandes momentos como treinador no vice-campeonato da Copa Libertadores de 1992. Comandando o Newell's Old Boys, ele passou por diversas situações para apagar da memória nos momentos que antecederam a partida e também durante o jogo daquele dia 17 de junho, que terminou com vitória brasileira por 1 a 0. 

Três momentos podem ser considerados como marcantes naquela decisão, seja por servir como combustível para o São Paulo ou para tirar Bielsa do sério. Confira abaixo três histórias de bastidores daquela decisão, que completa 25 anos neste sábado:

A LUZ NA FAVELA
O São Paulo foi impedido pelo Newell’s de fazer o reconhecimento do gramado do Gigante de Arroyito, palco da primeira decisão da Libertadores. O fato irritou Telê Santana e, principalmente, os dirigentes do Tricolor. Uma semana depois, os cartolas foram surpreendidos por gritaria no Morumbi. Era o técnico Marcelo Bielsa e seus jogadores indignados pelo fato do estádio estar às escuras no horário em que estava marcado o treino argentino. Kalef João Francisco lembrou-se do veto ma semana anterior e decidiu retribuir: “Falei que não seria possível ligar os refletores, pois o funcionário responsável já tinha ido embora. Bielsa se irritou, queria que chamássemos o rapaz de volta. Disse que ele morava na favela, que ninguém poderia ir até lá. Bielsa saiu andando e gritando que iria até a favela buscá-lo (risos)”.

AS LÁGRIMAS DO LOCO BIELSA
O vestiário do derrotado Newell’s no Morumbi teve choro desconsolado e uma ameaça de quebra-quebra – e tudo vindo da mesma pessoa, o técnico “Loco” Bielsa. “Ele nem conseguia falar. Berrava e ninguém entendia nada. Eu nunca estive em um vestiário tão triste. Você sabe o que é ver o Bielsa neste estado de descontrole? Ele parecia um elefante chorando”, relembra o zagueiro Pocchetino. Bielsa é famoso na Argentina pela frase “eu seria capaz de dar um dedo para vencer um clássico”, e seu jeito extremo de viver o futebol de fato atrapalhou o Newell’s naquela decisão. Ele foi expulso aos 33 do segundo tempo e pouco pôde motivar o elenco antes dos penais. Telê foi o seu oposto – sempre sereno e sem expressar reações nem com a conquista sacramentada.

PÔSTER PÉ-FRIO PREJUDICOU O NEWELL'S

Poster libertadores - Reprodução - Reprodução
Pôster com a equipe argentina como campeã
Imagem: Reprodução
 
Muito antes de torcedores do Palmeiras reclamarem de pôster do Santos campeão antes da segunda final da Copa do Brasil de 2015, o São Paulo passou pelo mesmo em 1992. Após perder o jogo de ida para o Newell’s em Rosário, o então diretor de futebol Kalef João Francisco ainda teve o desprazer de se deparar com um pôster da equipe argentina posando para foto e a inscrição abaixo: “Campeão da América 1992”. O que, de imediato, causou revolta acabou sendo uma arma do dirigente para motivar os atletas. Antes da partida de volta no Morumbi, cada jogador pôde ver o material, deixando o vestiário inflamado. Kalef guarda o pôster até hoje: “Acho que nunca tinha mostrado para ninguém, foi uma história que ficou guardada para mim. É um troféu”.

Legado: a "vingança" de Bielsa anos depois

Se não levou aquele título, Bielsa, pelo menos, pode se orgulhar de ter deixado um legado em seus jogadores após aquela decisão. Afinal, viu nove dos 13 jogadores que utilizou nas duas decisões tornarem-se técnicos, como discípulos de seu trabalho. A lista tem como mais famosos Gerardo Tata Martino, ex-comandante da seleção argentina e do Barcelona, Mauricio Pochettino, atual treinador do Tottenham, e Eduardo Berizzo, recém-contratado pelo Sevilla. Os outros são Julio Zamora, Cristian Domizzi, Gustavo Raggio, Alfredo Berti, Ricardo Lunari, Juan Manuel Llop e Fernando Gamboa. 

Comparando com o destino dos jogadores do São Paulo naquela decisão, pode-se dizer que a influência de Bielsa foi mais forte que a de Telê Santana. Dos campeões com o São Paulo, apenas cinco se aventuraram no banco de reservas: Müller, Palhinha e Zetti já não exercem mais a função, enquanto Pintado é atual auxiliar de Rogério Ceni no São Paulo e Antônio Carlos Zago deixou o Internacional recentemente.

* Colaborou Tales Torraga, do blog Patadas y Gambetas