Em velório de torcedor assassinado, amigos cantam samba e hino do Palmeiras
O torcedor Leandro de Paula Zanho, que tinha 38 anos, foi sepultado na tarde desta sexta-feira (14) sob o olhar de mais de uma centena de amigos, parentes, colegas de trabalho e vizinhos do bairro de Valparaíso, em Santo André, na grande São Paulo.
Minutos antes, durante seu velório, ao lado de guirlandas oferecidas por escolas de samba e pela torcida organizada Mancha Alviverde, seus amigos entoaram emocionados o samba "A amizade" do grupo Fundo de Quintal, canção apontada como a preferida de Leandro.
Em seguida, como se estivessem em um estádio de futebol, cantaram o hino do Palmeiras. "O time era a vida dele", disse um amigo de infância.
Leandro, que foi enterrado vestido com uma camiseta da Mancha, foi assassinado na madrugada da última quinta-feira, a 2 km do Allianz Parque depois que seu time perdeu um clássico contra o Corinthians. Um de seus agressores era corintiano. No velório, seus amigos diziam que ele não era uma pessoa violenta e lamentavam que o grupo em que ele estava tivesse "caído na provocação" dos corintianos. Em imagens de segurança, Leandro é visto espancando um torcedor rival antes de ser morto.
"No nosso país a gente não consegue nem sair na rua com camisa de time de futebol que corre o risco de sofrer uma tragédia", lamentou o mecânico Dorival, tio de Leandro. Ele disse que um rapaz resolveu aparecer no velório com uma camisa do São Paulo, mas foi orientado pela família a mudar de trajes: no local havia dezenas de integrantes da Mancha.
Amigos disseram que, apesar de Leandro não ser membro da organizada, ele tinha amizades e frequentava festas da torcida. Convidado a se filiar, declinou. "Ele falava que preferia cuidar do pessoal dele", afirmou o amigo Eduardo "Corvo". Muitas pessoas apareceram no velório com camiseta da Valparaíso, o time de várzea do qual Leandro era presidente.
Eles disseram que, apaixonado por futebol, o metalúrgico tinha decidido há três anos reerguer um antigo clube de várzea da cidade. Assim renasceria o Valparaíso, cujas cores branca e grená se misturaram ao alviverde palmeirense durante o enterro do torcedor-cartola.
Um dos momentos mais tocantes da tarde aconteceu quando jogadores e torcedores da equipe se reuniram em volta do caixão para rezar um pai-nosso e uma ave-maria, orações que eles sempre repetiram em campo antes dos jogos na várzea. "Era também uma forma de meter medo, impor respeito ao adversário", disse um dos jogadores.
No caminho até a sepultura, o time começou a cantar o grito de guerra que a torcida costumava cantar nos jogos do Valparaíso.
O metalúrgico sofria de uma forma incomum de câncer, que lhe havia feito perder um dos olhos. "Ele usava prótese e nunca se envergonhava disso", afirmou "Corvo". "Todo mundo sabia que ele tinha câncer e ninguém nunca o viu abatido por causa disso. Ele dizia: 'Não é um negócio desse tamanhinho que vai derrubar um cara de 90 kg'."
Os amigos que estavam com Leandro no momento de sua morte também compareceram ao enterro e pareciam muito abalados.
Ele deixou três filhos e uma esposa, que é dona de casa.
A polícia prendeu dois suspeitos de envolvimento com sua morte, e um terceiro pode se apresentar nos próximos dias.
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