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Palmeirense morto entrou em briga por causa de amigo e lutava contra câncer

Beatriz Cesarini e Emanuel Colombari

Do UOL, em São Paulo

14/07/2017 04h00

Leandro de Paula Zanho tinha 38 anos quando foi morto nesta quinta-feira (13). Torcedor do Palmeiras, participou de uma briga entre palmeirenses e corintianos a cerca de 2 km do estádio Allianz Parque, em uma borracharia próximo à Avenida General Olímpio da Silveira, região central de São Paulo. Horas antes, seu time de coração havia perdido para o Corinthians por 2 a 0.

Leandro – conhecido como "Landão" entre os vizinhos mais antigos, ou como "Perigoso" entre os colegas de trabalho – era o segundo dos três filhos do casal formado por Wilson e Odete Zanho. Os dois tiveram ainda duas filhas: Carla, a primogênita, e Renata, a caçula.

Morador da Vila Valparaíso, em Santo André, Leandro perdeu o pai ainda na adolescência – Wilson assistia a uma corrida de Fórmula 1 na televisão quando sofreu um infarto fulminante. Tinha pouco mais de 40 anos. Coube a Odete, vítima de poliomielite ainda na juventude, criar os três filhos.

“Ele sempre teve que ser o homem da casa”, conta a dona de casa Kelly Cristina de Souza, 38 anos, amiga de infância de Leandro. “Ele sempre foi muito brincalhão. Gostava de zoar, brincar. Era muito sorridente. A falta do pai não fez com que ele fosse um menino mau. Pelo contrário: ele conseguiu levar a vida e caminhar”, acrescentou.

Leandro de Paula Zanho no trabalho - Leonardo Medeiros/Acervo pessoal - Leonardo Medeiros/Acervo pessoal
Leandro de Paula Zanho trabalhava como mecânico montador havia duas décadas; no trabalho, era conhecido pelo bom humor
Imagem: Leonardo Medeiros/Acervo pessoal
Já adulto, Leandro passou a trabalhar como mecânico montador – profissão na qual estava havia quase duas décadas. Na empresa, era considerado um profissional querido pelos colegas graças a seu jeito brincalhão.

“Ele nunca deixou a tristeza pegar ele. Alegre, contente. A gente fala que ele é insubstituível”, conta Leonardo Medeiros, 27 anos, colega de trabalho de Leandro. “É uma comoção geral de todos que trabalham com ele. Ele tem brincadeira com todo mundo, sempre respeitou todo mundo”, acrescentou.

Segundo Leonardo, torcedor do Corinthians, o palmeirense Leandro nunca foi de fazer provocações no trabalho por conta do time de futebol. “A gente tinha brincadeira, (mas) como amigos. Não a ponto de se ofender, de se sentir incomodado”, conta. “Tanto que o Leandro é um cara bem brincalhão mesmo. Era ele que botava apelido nas pessoas.”

Há cerca de dez anos, Leandro se casou com Tábata. Juntos, os dois tiveram três filhos: Guilherme (atualmente com 12 anos), Lucas (com 8) e Rafael (com 3). A família mora ainda hoje em uma casa construída sobre um terreno deixado por familiares do torcedor. Os filhos costumavam acompanhá-lo em jogos do Palmeiras.

Nos últimos anos, porém, a saúde virou uma preocupação. Leandro sofreu com um tumor ocular, que fez com que tivesse que retirar o olho esquerdo e substituí-lo por uma prótese. Por conta da doença, entrou na Justiça em 2015 para requerer o uso de pílulas de fosfoetanolamina, desenvolvidas por um químico da Universidade de São Paulo para o tratamento do câncer. A eficácia do remédio não foi comprovada.

Recentemente, a situação vinha se agravando. O câncer se espalhara para outras partes do corpo, atacando o fígado e provocando dores no corpo. No trabalho, já cogitava até mesmo o caso de uma aposentadoria, embora não gostasse de pensar na possibilidade. Temia que, com o afastamento, passasse tempo demais em casa, pensando apenas na saúde.

Na sexta-feira, Leandro deveria passar por mais uma etapa do tratamento. “Sexta-feira agora, ele ia tomar a aplicação (de medicamentos quimioterápicos). O câncer dele desceu (do olho), era um caso raro”, conta Rodrigo de Paula, um dos amigos presentes na briga que vitimou Leandro. “Mas ele estava sempre feliz.”

Como torcedor, sem vínculos com organizadas, Leandro costumava ir aos jogos do Palmeiras na companhia do amigo Rodrigo. Na quarta-feira, chegou a dizer no trabalho que não iria ao clássico contra o Corinthians por falta de ingressos – mas teria mudado de ideia e tentado, sem sucesso, adquirir entradas nos arredores do Allianz Parque momentos antes da partida. De fora, viu o jogo em um bar. Na noite da briga, vestia um casaco do Palmeiras, verde com as mangas brancas.

“A gente tinha amizade de muitos anos. Não dava para ir a todo jogo por causa de trabalho, mas a gente ia quando o horário permitia. A gente inclusive evitava ir de trem, de ônibus, para evitar briga. Então ia de carro”, contou Rodrigo, relembrando a briga da madrugada da quinta-feira, quando os amigos voltavam da região do Allianz Parque.

“Nós estávamos indo embora. Estávamos subindo o Minhocão e o farol fechou. Eles (torcedores corintianos envolvidos na briga) estavam na frente da borracharia e provocando os palmeirenses que passavam. Meu parceiro (identificado apenas como Felipe) quis descer do carro. A gente tentou segurar, mas não adiantou. Aí eles entraram em luta corporal”, contou.

Na briga, Leandro levou uma facada na perna desferida por um dos torcedores. Na sequência, foi alvo de golpes de facão no abdômen, desferidos por um outro torcedor. Ainda vivo, foi socorrido pelos amigos e levado à Santa Casa de São Paulo. No entanto, não resistiu aos ferimentos e morreu na manhã de quinta-feira.

Até a noite desta quinta-feira, o corpo de Leandro ainda não havia sido liberado. O velório estava marcado para começar ainda na quinta-feira, na quadra da Mocidade Fantástica de Vila Alice, escola de samba da cidade de Santo André. No dia seguinte, nesta sexta-feira, o corpo de Leandro deve ser enterrado em São Bernardo do Campo.