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Valentim consagrou Oseás e já foi "melhor do Brasil", mas sofreu na Itália

Alberto Valentim antes do jogo contra o Cruzeiro; hoje técnico, ele brilhou na lateral - Daniel Vorley/AGIF
Alberto Valentim antes do jogo contra o Cruzeiro; hoje técnico, ele brilhou na lateral Imagem: Daniel Vorley/AGIF

Napoleão de Almeida

Colaboração para o UOL

03/11/2017 04h00Atualizada em 03/11/2017 17h06

Alberto Valentim é o nome da moda no futebol brasileiro. Assumiu o Palmeiras e, quatro jogos e dez pontos depois, reduziu a vantagem para o líder Corinthians de 14 para cinco pontos, podendo chegar a dois se vencer o rival no dérbi de domingo, 17h em Itaquera.

Nem todos se lembram, mas esse não é o primeiro grande momento de Alberto no futebol brasileiro. Melhor lateral do Brasileirão pelo Atlético Paranaense há mais de 20 anos, quando consagrou Paulo Rink e outro ídolo do Palmeiras, Oséas, o jogador foi pivô de uma obscura negociação que o levou para a Itália, onde defendeu a Udinese. Lá, viveu um drama com uma suspensão por uso de passaporte falso, mas acabou fazendo uma carreira sólida que o rendeu o rótulo de “Série A”, como ele costuma ser chamado dentro do Palmeiras.

Um Furacão pela direita

Alberto Valentim, hoje técnico do Palmeiras, na época da transferência do Atlético-PR para a Udinese - Arquivo Folha - Arquivo Folha
Alberto Valentim nos tempos de jogador; eleito melhor do Brasil, foi jogar na Itália
Imagem: Arquivo Folha

Em 1996 o Atlético Paranaense voltava à primeira divisão do Brasileirão com um time avassalador, campeão da B em 95 e que viria a derrubar a invencibilidade do Palmeiras de Luxemburgo, contando com Paulo Rink e Oséas, dupla sensação no ataque. Quase que invisível, pela direita, um lateral consagrava os artilheiros com cruzamentos perfeitos.

“Dispensa comentários o Alberto batendo na bola. Quem ficava feliz eram Oseinha da Bahia e Paulo Rink, ele já chegava cruzando e nós só colocávamos para dentro”, disse, rindo com as lembranças, o ex-atacante Oséas, campeão da Libertadores com a camisa verde. “Fico feliz pelo trabalho que Alberto vem fazendo. Quando jogávamos juntos no Atlético eu não fazia nem ideia da qualidade que ele teria como treinador. É uma pessoa de grupo, extrovertida, de bom caráter”, conta o artilheiro das trancinhas, que hoje mora em Salvador e administra seus imóveis como fonte de renda.

“Ele chegava no vestiário nos treinamentos com aquela alegria, contagiando o grupo, brincando. A gente tinha um grupo muito forte”, relembra sobre o time que acabou a primeira fase em 4º lugar e foi eliminado nas quartas pelo Atlético-MG. Sem o título nacional, Alberto ao menos pôde comemorar outra honraria: foi escolhido o melhor lateral-direito do Brasil na Bola de Prata da Revista Placar, o que despertou os olhos da Europa para ele.

Negociação estranha lesou Atlético em US$ 5 milhões

No fim de 1999, após ajudar o Atlético a ganhar a Seletiva da Libertadores, os jornais já noticiavam o interesse da Udinese em levar o lateral atleticano, que havia rodado por empréstimo por São Paulo, Flamengo e fez parte do quarteto que reforçou o Cruzeiro apenas para a decisão do Interclubes contra o Borussia Dortmund em 97, ao lado do zagueiro Gonçalves e dos atacantes Bebeto e Donizete “Pantera”. Mario Celso Petraglia, atual presidente do Conselho Deliberativo do Atlético, comandava o clube na ocasião, ao lado de Ademir Adur e Nelson Fanaya, e havia trazido da Inter de Limeira o lateral revelado no Guarani e hoje técnico do Palmeiras.

Detalhe do contrato do lateral Alberto Valentim com o Rentistas, do Uruguai - Reprodução - Reprodução
Detalhe do contrato que cedeu Valentim do Atlético-PR ao Rentistas, do Uruguai
Imagem: Reprodução

Em 10 de dezembro de 99 o Atlético vendeu o então lateral-direito Alberto para o Rentistas, do Uruguai, clube ligado ao empresário Juan Figer, por US$ 1,5 milhões (veja o documento, que só recebeu o carimbo da Associação Uruguaia de Futebol em 12 de janeiro de 2000).

Apenas 19 dias depois, em 29 de dezembro de 1999, o Rentistas vendeu Alberto à Udinese por US$ 6,650 milhões, uma diferença de US$ 5,1 milhões de dólares nos cofres atleticanos. A negociação só foi descoberta mais de uma década depois. O jornal paranaense Gazeta do Povo publicou a denúncia em 2011 e foi processado por Petraglia, que perdeu na Justiça. O clube, porém, nada fez contra o dirigente, que alegou ser responsabilidade da diretoria financeira. A comissão de ética do Atlético ignorou o caso.

Alberto voltaria ao clube em 2008 para encerrar a carreira e, em 2012, foi contratado por Petraglia para ser o assessor da presidência para o futebol. Saiu ao fim de 2013, estremecido com o dirigente após a perda da Copa do Brasil para o Flamengo. Entretanto, eles mantiveram laços. A amigos próximos, Alberto confidenciou que esperava uma chance de assumir o time quando da saída de Eduardo Baptista, outro ex-Palmeiras. Quis o destino que fosse no próprio Palmeiras a retomada como técnico.

Escândalo do Passaportopoli e proximidade com Spalletti

Na Itália, Alberto trabalhou com nomes importantes do futebol mundial, como Roy Hodgson, inglês que dirigiu a seleção da Inglaterra na Copa 2014. Lá também pegou para si o rótulo de “Serie A”, em referência aos 10 anos na elite italiana, incluindo a passagem pelo Siena. Pela Udinese, um quarto lugar no Italiano que rendeu vaga a Champions League.

Um dos principais treinadores que trabalharam com Alberto em Udine foi Luciano Spalletti. Com ele foram três temporadas, a mais importante a de 2003-04, quando fez 22 jogos e passou a jogar também no meio. Porém, na temporada seguinte, Alberto perdeu espaço e não atuou pela Champions. Entrou em campo já na Liga Europa, após a eliminação na fase de grupos, quando marcou o gol da vitória sobre o Panionios, da Grécia, no jogo de volta, o que não foi suficiente para devolver os 1 a 3 da ida. Acabaria emprestado ao Siena.

"Spalletti foi um treinador muito importante para Alberto. Aqui estamos todos convencidos de que ele não conseguiu expressar o seu todo potencial. No começo, ele fez esforço na área defensiva, então com o tempo ficou um pouco melhor", contou Massimo Meroi, jornalista do Messagero Veneto, diário de Udine.

Alberto e Spalletti - Petrussi/Messagero Veneto - Petrussi/Messagero Veneto
Alberto, sem camisa, cumprimenta Spalletti em jogo pela Udinese nos anos 2000
Imagem: Petrussi/Messagero Veneto

Já em 2017, após comandar o Red Bull no Paulistão (foi o 13º no geral), viajou à Roma para passar alguns dias acompanhando Spalletti no comando da Loba – atualmente, ele comanda a Internazionale. O “estágio” na Itália rende elogios no Palmeiras, bem como a categoria ao bater na bola, que lhe dão o rótulo de “Série A”. Mas nem tudo foram flores na Itália; no caminho, um escândalo que envolveu vários jogadores sul-americanos.

Ao lado do também ex-atleticano Warley, e dos mais conhecidos Dedé, Dida, o argentino Verón e o uruguaio Recoba, Alberto foi denunciado pela Federação Italiana pelo uso de um passaporte português falso. Depois de se apresentar com um passaporte brasileiro, a Udinese tentou registrá-lo como comunitário usando um documento português, o que caiu no Bureau de Investigação Italiano.

Em uma viagem a Varsóvia, na Polônia, para um jogo da Copa UEFA em 13 de setembro de 2000, ele e Warley foram barrados na imigração. Alberto foi chamado a depor e alegou desconhecer a jogada feita pelo clube e pelo empresário. As investigações chegaram a 14 jogadores de diversas equipes, todos denunciados e julgados pelo uso dos passaportes.

Alberto pegou um ano de suspensão, reduzida para três meses e meio nas negociações. Foi titular no último jogo da temporada 00/01, diante do Napoli, em 26 de maio de 2001, e só voltaria a atuar em 13 de abril de 2002, contra o Hellas Verona. Perdeu espaço entre os titulares e só se recuperou na temporada seguinte. Ao todo foram 171 jogos na Itália, com quatro gols marcados, todos pela Udinese, que pagou 1,6 milhões de libras de multa pelo escândalo.