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Histórico do Whatsapp detalha ingressos VIP para Copa-14 e apoio à Globo

AFP PHOTO / FILES / YASUYOSHI CHIBA
Imagem: AFP PHOTO / FILES / YASUYOSHI CHIBA

James Cimino

Colaboração para o UOL, em Nova York (EUA)

15/11/2017 20h05

Surgiram mais indícios de como funcionava o esquema de propina para a negociação dos direitos de transmissão da Copa Libertadores e da Sul-Americana. No depoimento de Alejandro Burzaco na Suprema Corte do Brooklyn, em Nova York, nesta quarta-feira (15), foi revelado o histórico de conversas do Whatsapp do próprio delator do caso Fifa, o ex-CEO da Torneos y Competencias (empresa argentina de marketing esportivo responsável por negociar a venda dos direitos de transmissão no continente).

As mensagens mostram que Burzaco e vários dirigentes da Conmebol realizavam trocas de favores, como a constante distribuição de ingressos VIP da Copa do Mundo de 2014 para autoridades paraguaias. Segundo o delator, o objetivo era agradar o também paraguaio Juan Carlos Napout, que, uma vez eleito presidente da entidade, garantiria a extensão dos contratos da TV Globo e daria à Fox a exclusividade para o restante das Américas.

A trama era feita pelas costas do então presidente da Federação Argentina de Futebol, Julio Grondona, cuja morte já era prevista pelos envolvidos em junho de 2014 - o argentino morreu um mês depois. Burzaco teve que explicar à Justiça dos Estados Unidos o que é o Whatsapp, uma vez que o aplicativo nunca foi febre entre os norte-americanos, e o que são ingressos VIP.

O delator afirma que se encontrou secretamente com Napout em junho de 2014, no Copacabana Palace, no Rio de Janeiro, onde discutiram sobre a origem do dinheiro. Posteriormente, Burzaco marcou um café da manhã com Marcelo Campos Pinto, hoje ex-diretor da Rede Globo, para discutir a propina da emissora brasileira e a cessão dos contratos de torneios sul-americanos.

A fim de agradar Napout, o delator afirmou que os dirigentes conseguiram quatro ingressos para a semifinal da Copa em São Paulo, entre Holanda e Argentina, para o procurador-geral do Paraguai e o então presidente do país, Horacio Cartes. Segundo Burzaco, a Conmebol já ameaçava encerrar o esquema de propina com a TV Globo, de modo que a figura de Napout era vista como a ideal para manter o contrato.

Marco Polo Del Nero, atual presidente da CBF, teria pedido seis ingressos VIP da Copa de 2014 para Burzaco; os bilhetes, no entanto, pertenciam a Julio Grondona. Tendo que escolher entre pagar ou pedir o favor ao presidente da AFA, o brasileiro preferiu pagar para permanecer em bons termos com Napout, a quem tentava agradar constantemente em apoio à candidatura para a Conmebol.

Burzaco chegou a dizer brevemente que em um encontro em Assunção, no Paraguai, o grupo teria mudado todo o esquema após a morte de Julio Grondona. No entanto, o delator não explicou exatamente quais foram as alterações no sistema de propina.

Muitos ingressos VIP que haviam sido adquiridos por brasileiros para a final da Copa do Mundo acabaram sendo renegociados pelo então presidente da CBF José Maria Marin, já que boa parte da torcida do Brasil perdeu o interesse no jogo após a derrota da seleção por 7 a 1 para a Alemanha, em 8 de julho.

Após o fim da Copa do Mundo, Burzaco seguiu para Las Vegas e assistiu a uma luta de Mayweather antes de viajar para Miami Beach, na Flórida, onde se reuniu com os chefes da Fox em setembro de 2014. Em um restaurante grego, os dois lados discutiram a eliminação dos intermediários da T&T, de modo que o Fox Sports renovaria com a Libertadores para todas as Américas - exceto o Brasil, cujo contrato seria feito com a TV Globo através da propina paga à subsidiária holandesa da T&T, que comprava os direitos de transmissão por um valor abaixo do mercado.

O delator ainda disse que Eugenio Figueredo, então presidente da Conmebol, tinha ciúme de sua boa relação com Napout no jogo de poder. Depois de ganhar de Burzaco mais ingressos para a Copa, sem que Figueredo soubesse, Napout lhe agradeceu com "sós un capo" - termo em espanhol que significa algo como "você é o chefão".

Procurada pelo UOL Esporte sobre as novas acusações, a Globo repetiu o comunicado que havia emitido no dia anterior - e que foi lido na íntegra durante a exibição do Jornal Nacional:

"Sobre o depoimento ocorrido em Nova York, no julgamento do caso Fifa pela Justiça dos Estados Unidos, o grupo Globo afirma veementemente que não pratica nem tolera qualquer pagamento de propina. Esclarece que, após mais de dois anos de investigação, não é parte nos processos que correm na justiça americana. Em suas amplas investigações internas, apurou que jamais realizou pagamentos que não os previstos nos contratos."

"O grupo Globo se surpreende com o relato envolvendo o ex-diretor da Globo, Marcelo Campos Pinto. A ser verdadeira a situação descrita, o grupo Globo deseja esclarecer que Marcelo Campos Pinto, em apuração interna, assegurou que jamais negociou ou pagou propinas a quaisquer pessoas. O grupo Globo se colocará plenamente à disposição das autoridades americanas para que tudo seja esclarecido. Para a Globo, isso é uma questão de honra. Os nossos princípios editoriais nem permitiriam que fosse diferente. Mas o grupo Globo considera fundamental garantir aos leitores, aos ouvintes e aos espectadores que o noticiário a respeito será divulgado com a transparência que o jornalismo exige."