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Caso Drone mostra todo o poder (e a autoconfiança) de Renato no Grêmio

Ídolo tirou Grêmio da fila após 15 anos, goza de prestígio no clube e tem método particular - REUTERS/Agustin Marcarian
Ídolo tirou Grêmio da fila após 15 anos, goza de prestígio no clube e tem método particular Imagem: REUTERS/Agustin Marcarian

Luiza Oliveira

Do UOL, em Al Ain (EAU)

12/12/2017 04h00

O Grêmio se viu no meio de um turbilhão quando, às vésperas da final da Libertadores, uma matéria da ESPN expôs um esquema de espionagem do clube contra adversários. Mesmo com uma enxurrada de críticas, Renato Gaúcho apareceu de cara lavada, na maior tranquilidade, para salvar a pátria: ‘O mundo é dos espertos’. Em uma frase, ele virou o jogo e conquistou os gremistas.

Ao transformar o cenário, Renato deu uma pequena mostra do seu poder no Grêmio. Poder esse que vai muito além da influência que exerce sobre os jogadores que vão tentar uma vaga na final do Mundial de Clubes no duelo contra o Pachuca, nesta terça, às 15h. 

O campo se tornou apenas uma de suas atribuições. Renato não liga de meter o bedelho onde não é (ou é!) chamado. Manda soltar e manda prender. Os amigos até brincam que não se pode conversar perto dele porque é como se o ouvido do treinador estivesse nas costas. Ele presta atenção em tudo ao seu redor.

Renato Gaúcho acompanha o treino do Grêmio na Argentina - Divulgação/Grêmio - Divulgação/Grêmio
Imagem: Divulgação/Grêmio

Dá pitaco no departamento médico, na preparação física, passando pela fisiologia e até pela logística. Na final da Libertadores na Argentina, por exemplo, foi dele a decisão de trocar o hotel onde a delegação ficaria hospedada. No hotel que havia sido reservado, houve um vazamento de gás que ocasionou uma explosão. Alguns dias antes da viagem, o Grêmio consultou o estabelecimento e ouviu que tudo seria reparado a tempo, mas Renato nem titubeou. Não iria correr riscos de jeito nenhum. Imagina se não tem banho quente para os atletas bem na grande decisão?

"Virginiano nato", teimoso e centralizador. Mas eficiente

Pode parecer chato, mas é um chato eficiente e que dá resultado. “Eu vou em todos os setores porque eu me garanto. E sei que se em alguns deles der algo errado, estoura no futebol e em mim que sou o treinador”, disse.

O perfil resolvedor de problemas, que ‘faz e acontece’, acaba agradando a diretoria. Experiente e com tarimba de campeão, ele reina entre os dirigentes. Discretos, não têm o perfil de aparecer muito ou chamar os holofotes para si com declarações bombásticas em programas de televisão.

No departamento de futebol então, ninguém tasca. E é aí que ele mais esbanja a sua autoconfiança. Um banho de auto-estima em qualquer mortal. Faz o que acha que deve ser feito e só dá ouvidos com muita insistência. Os mais próximos até brincam que é um virginiano nato, por ser tão teimoso.  

Alexandre Mendes e Renato Gaúcho durante treino do Grêmio - Lucas Uebel/Divulgação Grêmio - Lucas Uebel/Divulgação Grêmio
Imagem: Lucas Uebel/Divulgação Grêmio

Fechado em seu mundo, toma praticamente todas as decisões com seu auxiliar e fiel escudeiro Alexandre Mendes. Preza por uma comissão técnica bem enxuta, a ponto de ter recusado a companhia de um novo assistente depois da saída de James Freitas. O antigo auxiliar, que ficou no clube até o título da Copa do Brasil, era conhecido pelo estilo estudioso e fazia sucesso com Roger, com quem agora vai trabalhar no Palmeiras.

O lema de Renato é: quanto menos pessoas tiverem informações, melhor é. As práticas adotadas até geram certo desconforto entre integrantes da comissão técnica fixa. Algumas vezes, por exemplo, os profissionais só ficam sabendo o time que vai a campo minutos antes de a atividade começar. É difícil fazer qualquer planejamento assim.

Conflito com departamento de análise, inclusive no caso drone

Em Porto Alegre, Renato até hoje mora em um quarto de hotel. Por lá se tranca e fica quase 15 dias sem sair. Assiste a jogos sozinho e tira um sarro de que a ‘mente está trabalhando’. Prefere essa introspecção a trabalhar junto com o departamento de análise de desempenho do clube, com quem ele nunca teve boa relação por não dar muito valor ao trabalho realizado.

Renato Gaúcho, técnico do Grêmio, durante o último treino do time em Porto Alegre antes da final da Copa Libertadores - REUTERS/Diego Vara - REUTERS/Diego Vara
Imagem: REUTERS/Diego Vara

A confiança no próprio taco também ficou clara quando adotou a polêmica iniciativa de contratar um espião para observar os treinos dos adversários, mesmo a contragosto de muitos profissionais do clube e, inclusive, de alguns dirigentes. Na visão de alguns, ignorou todo o material produzido pela área responsável durante um ano inteiro para dar asas à sua 'ideia genial'. O trabalho feito pelo espião ainda era criticado por ter imagens ruins e de curta duração, feitas por um drone que custava caro.  

O técnico Renato Gaúcho orienta o Grêmio em jogo contra o São Paulo - Ricardo Rímoli/AGIF - Ricardo Rímoli/AGIF
Imagem: Ricardo Rímoli/AGIF

Só que, mais uma vez, Renato mostrou seu poder. Ninguém teve a coragem de peitá-lo e o procedimento foi mantido até ser descoberto. Quando isso aconteceu, o clube se enrolou para tentar explicar o caso e ele não teve o menor problema em assumir.  Em meio à confusão, o principal membro do departamento de análise ficou fora da viagem do Mundial de Clubes e acabou pedindo demissão sem concordar com as práticas adotadas.

Relação com jogadores

A relação com os jogadores é um capítulo à parte e é onde Renato mais se sente em casa. Mostra uma habilidade grande para lidar com o vestiário e tem como um de seus principais trunfos a experiência como atleta. Nada de termos complicados ou ‘futebolês’. Ele entende do riscado e sabe mandar a resenha. Fala a linguagem do boleiro para dar confiança e passar instruções às vésperas de um grande jogo.  Falou para Luan, por exemplo, que atacante podia ficar tranquilo dentro da área. Nervoso tem de ficar o zagueiro, com medo de fazer um pênalti. Parece que o menino deu ouvidos ao chefe quando marcou diante do Lanús, na final da Libertadores.

Renato Gaúcho conversa com Arthur após gol do Grêmio diante do Fluminense - Jeferson Guareze/AGIF - Jeferson Guareze/AGIF
Imagem: Jeferson Guareze/AGIF

A postura, é claro, também causa opiniões controversas. Internamente, Renato recebe críticas de alguns setores por não ser um estudioso da bola. Quando o assunto é a análise tática, ele divide a responsabilidade com os jogadores. Muitos deles têm voz ativa e puxam a fila para conversar com o técnico e dar pitacos sobre o que deve ser feito. Edilson, Geromel, Ramiro, Maicon e Fernandinho são alguns dos pontas firmes.

Eles até investem na prospecção de informações sobre si mesmos, o time e os adversários. Nesta temporada, Maicon levou Arthur ao departamento de análise de desempenho para ele captar dados sobre o que precisava melhorar.

O que todos concordam é que Renato tem visão de jogo, com boas leituras e soluções em situações complicadas. A explicação que Fernandinho deu no programa ‘Bem, Amigos’, do Sportv, sobre como Renato Gaúcho consertou o time taticamente na final da Libertadores, mostra bem esse lado dele. “Taticamente ele cobra muito da equipe, de cada atleta. Quando se joga em sintonia facilita as ações ofensivas e defensivas. Sabemos o quanto ele tem sido importante, como treinador, como pai, tem cuidado do grupo. Se relaciona bem com os jogadores, dá moral e confiança”.