Topo

Há 13 anos, J. Cesar viveu em um Fla com bombas, despejos e sem salários

Julio Cesar em seu retorno ao Fla, em situação muito melhor que na 1ª passagem - Gilvan de Souza / Flamengo
Julio Cesar em seu retorno ao Fla, em situação muito melhor que na 1ª passagem Imagem: Gilvan de Souza / Flamengo

Leo Burlá

Do UOL, no Rio de Janeiro

01/02/2018 04h00

De volta ao Flamengo, Julio Cesar encontrou a mesma camisa e torcida, mas um Rubro-negro muito, muito diferente daquele que deixou.

Ao voltar ao clube do coração, o camisa 12 entrou no túnel do tempo e lembrou das dificuldades que em nada sugerem o Fla dos tempos atuais. Salários atrasados e falta de condição adequada de trabalho eram parte do Flamengo que marcou a primeira passagem do jogador na Gávea. No aperto dos dias mais quentes, chegou a comprar um ar condicionado do próprio bolso, conforme seu próprio relato em sua apresentação.
 
Goleiro Júlio César durante treino do Flamengo, em 2003 - Arquivo/Folhapress - Arquivo/Folhapress
Julio Cesar no Flamengo em 2003
Imagem: Arquivo/Folhapress
 
Testemunha daquele Flamengo de vacas magras, Fernando lembra bem os "perrengues" passados. Companheiro do goleiro desde as categorias de base, o ex-zagueiro acha que o Fla "reinventou" seu dicionário e impediu que cenas desagradáveis voltem a se repetir.
 
"A gente não conhecia o Flamengo de outro jeito, só aquele que atrasava salário. O discurso era de que jogar pela instituição era mais importante que o dinheiro, mas ficamos até seis meses sem receber. Eu cheguei até a ser despejado por falta de pagamento do aluguel, que era de responsabilidade do clube. Como ainda era jovem e não ganhava muito, peguei dinheiro emprestado com o Beto e o Edilson", disse ele ao UOL Esporte.
 
Com muitos problemas de ordem política, o Flamengo dos anos 2000 fervia também fora do campo. Ora com times estrelados [e sem resultados expressivos], ora com equipes medíocres, o clube viveu dias para lá de conturbados na relação com os rubro-negros. E o goleiro foi protagonista.
 
Em 2002, Julio Cesar foi agredido por torcedor após invasão na Gávea - Reprodução / TV Globo - Reprodução / TV Globo
Em 2002, Julio Cesar foi agredido por torcedor após invasão na Gávea
Imagem: Reprodução / TV Globo
 
Em 2002, uma invasão na Gávea confinou os jogadores ao vestiário. Enquanto o grupo se refugiava aonde podia, Júlio foi dos poucos que tentou dialogar com o grupo, que lançava morteiros e acionava extintores de incêndio. Já dentro da sala de musculação, o jogador foi agredido por um torcedor. Constrangido com o episódio, o então novato contemporizou à época:
 
"Me bateram mas não foi nada demais. Só me protegi".
 
Julio Cesar agride torcedor do Fla em 2004 - Reprodução / TV Globo - Reprodução / TV Globo
Julio Cesar agride torcedor do Fla em 2004
Imagem: Reprodução / TV Globo
 
Dois anos depois, já mais experiente, o goleiro não teve o mesmo fair play. Após uma derrota no Campeonato Brasileiro, o elenco enfrentou a fúria da torcida no Santos Dumont. Com poucos seguranças para proteger os jogadores, eles foram acuados pelos vândalos. O pai do ex-meia Zinho, hoje comentarista da Fox Sports, se envolveu em uma confusão e Julio Cesar, além do próprio ex-jogador, compraram o barulho e trocaram socos com um dos que protestavam. O torcedor caiu e o goleiro desferiu um chute na cabeça, correndo em seguida.
 
"Eu disse que não encerraria a carreira aqui e estou mordendo minha língua. Saí magoado e desiludido", recordou ele.
 
Outro episódio emblemático da época ocorreu no dia do anúncio de um novo técnico. Após a saída de Oswaldo de Oliveira, a cúpula promoveu Waldemar Lemos, irmão de Oswaldo e então assistente, ao cargo. Em uma estrutura de imprensa absolutamente improvisada, o diretor Eduardo Moraes foi questionado por dezenas de torcedores que acompanhavam tudo no local. Bastou o treinador ser nomeado para que os enfurecidos rubro-negros questionassem o dirigente e entoassem o coro de "Fora Waldemar", em uma cena que mais tarde viraria folclórica nas redes sociais.
 
Diretor Eduardo Moraes anuncia Waldemar Lemos como técnico e é hostilizado - Reprodução / Espn Brasil - Reprodução / Espn Brasil
Diretor Eduardo Moraes anuncia Waldemar Lemos como técnico e é hostilizado
Imagem: Reprodução / Espn Brasil
 
Agora, com estrutura e salários em dia, o goleiro prevê três meses finais de carreira sob uma outra perspectiva. Sem a pressão de tempos atrás e dentro do conforto do Ninho, o goleiro dificilmente reviverá episódios como aqueles. Em paz neste capítulo final, Fernando confia até que o ex-companheiro mude seus planos:
 
"Nem sei se ele se aposenta depois de três meses, o Flamengo tem tudo para jogar três, quatro finais esse ano e o clube tem estrutura para alongar a carreira dele mais um pouco. É bom o Diego Alves ficar esperto".