Choque de Cultura sobre futebol? Existe e exalta o que temos de pior

O Rueda é um técnico que sabe botar cada jogador onde ele rende mais, sabe movimentar as peças de uma equipe. Ele testou o Muralha em várias posições. Testou no gol, depois no banco, mas mesmo no banco ele estava atrapalhando bastante a equipe. Agora ele deslocou o atleta para a cabine com a porta trancada e está rendendo muito bem."

O goleiro Alex Muralha nem joga mais pelo Flamengo, mas só deixou o Brasil para atuar no futebol japonês depois de ser agraciado com o Troféu Lucas Mugni de 2017, selecionado ao lado de outros destaques (ou não) do Campeonato Brasileiro, como Pará, Rafael Vaz, Paulão e Egídio; Márcio Araújo, Felipe Melo, Lucas Lima e Jadson; Borja e Kazim. A escolha destes nomes foi feita pelos especialistas Craque Daniel e Cerginho da Pereira Nunes, que apresentam o programa "Falha de Cobertura" desde 2013 na internet.

O "Falha de Cobertura" é produzido pelo canal "TV Quase", que tem quase 200 mil inscritos no Youtube e também está no ar com o "Último Programa do Mundo", que já passou na MTV, e o "Choque de Cultura", que se tornou um fenômeno da internet nos últimos meses por meio da "Omeletevê", de quase 2 milhões de seguidores. O "Choque de Cultura", que produz uma boa parte dos memes que vemos hoje na internet, é uma sátira dos programas de crítica de cinema, apresentado por quatro motoristas de van. Da mesma forma, o "Falha de Cobertura" é uma ironia sobre as tradicionais mesas redondas esportivas da televisão. 

Craque Daniel é um ex-jogador de futebol cortado de última hora da Copa do Mundo de 1990. Ele é criador do voleio rasteiro e "tem sua ausência absurdamente confirmada na galeria de craques brasileiros". Depois de jogar ele virou empresário, se intitulou craque (para quem não entendeu a sátira...) e passou a apresentar um programa ao lado de Cerginho da Pereira Nunes, a quem tirou da prisão. Cerginho não conheceu sua família e se auto-registrou depois de adulto. Ele mora numa obra inacabada da Copa de 2014 e "busca mais uma graduação que é a tão sonhada faculdade de Jornalismo, que estuda à distância". Ele é o "jornalista-informação" à espera do diploma. 

"No finalzinho da MTV, em 2013, o Daniel Furlan (intérprete do Craque Daniel) foi chamado para fazer o Rock Gol na Mesa, sobre a Copa das Confederações, e me convidou. Foi minha primeira vez na frente das câmeras e ali nasceu o personagem, que então chamava Serginho do Império (depois, Cerginho da Pereira Nunes). Quando acabou a MTV tivemos um projeto na Abril e foi quando nasceu o Falha de Cobertura com esse nome. Sentíamos falta de uma mesa redonda sobre futebol mais passional, como víamos o Camisa 9 do Luiz Orlando na TV do Rio de Janeiro. Queríamos um programa de humor que fosse sátira de algo em que os caras não têm muita informação, mas têm aqueles conceitos enraizados, um clubismo fodido, expressões do cotidiano para falar sobre as coisas, sem discutir esquema tático, esse universo todo", explica o ator, diretor e roteirista Caito Mainier, intérprete do Cerginho da Pereira Nunes, ao UOL Esporte.

Seleções e Lucas Mugni

Na última temporada, o "Falha de Cobertura" convocou torcedores de vários times brasileiros a elegerem os piores jogadores que já atuaram por estas equipes. Além disso, o programa elege anualmente a seleção dos piores nomes do Brasileirão e o pior de todos ganha o Troféu Lucas Mugni, uma homenagem dos roteiristas flamenguistas ao jogador argentino que definitivamente não teve uma passagem inesquecível pela Gávea. A taça é uma escultura de sabonete e fica disponível para retirada do vencedor apenas no dia 25 de dezembro. Alex Muralha, vencedor em 2017, não foi retirar sua premiação, que agora será leiloada.

"Os comentários da internet diziam injustamente que fizemos esse prêmio em sabonete porque ia ser uma dificuldade a mais para o Muralha pegar", brinca Caito, que explica que o programa não enfrentou manifestações de ódio de jogadores, empresários ou assessores por conta das críticas ácidas aos boleiros.

"O Falha é humor, né? O cara que reclamar disso vai passar um recibo de maluco, não é possível. Mas faz parte do futebol, faz parte da profissão deles. Quando tem um cara jogando mal o pessoal vaia, xinga, é normal. O cara que joga tem que saber que vai ser criticado por uma má atuação ou alvo de piada por parte das pessoas".

Parceria com o SporTV

Como informou o UOL Esporte, o "Falha de Cobertura" será exibido em pílulas diárias nas plataformas de esporte do Grupo Globo entre este sábado e o dia 25 de fevereiro, quando acabam as Olimpíadas de Inverno da Coreia do Sul. O "jornalismo de alta periculosidade e baixa escolaridade" agora falará de outros esportes que não sejam o futebol sem restrição de conteúdo e com garantia da "ausência dos principais gols da rodada". Agora o grupo sonha em cobrir a Copa do Mundo na Rússia e internacionalizar a zoeira.

Zoeira never ends: alguns momentos 

- Craque Daniel e Cerginho da Pereira Nunes cunharam a expressão "menos um" para definir o papel de certos jogadores no esquema tático dos times. Tem time que joga no 4-4-1-menos um, por exemplo.

- Na eleição do Troféu Lucas Mugni, os comentários sobre quatro jogadores chamaram atenção: Márcio Araújo ("um jogador que ele mesmo rouba a bola e entrega para o adversário um pouquinho melhor"), Felipe Melo ("atleta cuja maior qualidade é tentar ser expulso em toda partida o mais rápido possível pra prejudicar menos sua equipe"), Lucas Lima ("quanto mais bonito fica, menos futebol apresenta, revelando-se um sansão da feiura") e Borja ("jogador que logo se adaptou ao futebol brasileiro de Bill, Obina, Val Baiano, Reascos e Souza").

- Em um dos programas, Craque Daniel pediu para Cerginho fazer análises relâmpago sobre os adversários do Brasil na primeira fase da Copa do Mundo. Deu nisso:

Suíça? "Canivete".
Costa Rica? "Traiçoeiros".
Sérvia? "Sorvete". "Porque eu não sei muito sobre a Sérvia".