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Polícia diz que Federação Paraibana exerceu influência em julgamentos

Marcello De Vico

Do UOL, em Santos (SP)

16/05/2018 20h16

Um dos principais alvos das investigações da Operação Cartola, a Federação Paraibana de Futebol (FPF) influenciou diretamente julgamentos realizados pelo Tribunal de Justiça Desportiva de Futebol da Paraíba (TJDF-PB). É o que diz um relatório da Polícia Civil da Paraíba a que o UOL Esporte teve acesso. Um áudio específico, também obtido pela reportagem junto a uma série de conversas telefônicas entre dirigentes e autoridades, ajuda a dar ainda mais veracidade à informação, inicialmente publicada pelo site Globoesporte.com.

A conversa em questão diz respeito ao regulamento do Campeonato Paraibano de 2018. Ao final da primeira fase, levantou-se uma polêmica em relação à interpretação de quais times teriam o direito de, nas semifinais, decidir a segunda partida em casa e jogar por dois resultados iguais. Isso por que o regulamento da competição estadual não deixava clara esta questão.

Sendo assim, o Botafogo-PB entendia que merecia a vantagem por ter somado mais pontos que o Treze-PB na primeira fase (22 a 14). O Treze-PB, por sua vez, argumentava que a vantagem era sua por ter sido o primeiro de sua chave – enquanto o Botafogo-PB foi o segundo da sua. A Federação Paraibana de Futebol tinha o mesmo entendimento do Treze, e o caso acabou indo parar na esfera jurídica depois que o Botafogo-PB entrou com um recurso no tribunal.

Trecho de relatório da Polícia Civil sobre a Operação Cartola: Amadeu Rodrigues x Lionaldo Santos - Reprodução/Polícia Civil - Reprodução/Polícia Civil
Trecho de relatório da Polícia Civil
Imagem: Reprodução/Polícia Civil

No dia 22 de março, o Tribunal de Justiça Desportiva de Futebol da Paraíba (TJDF-PB) julgou o recurso impetrado pelo Botafogo-PB. O áudio em questão, obtido pela reportagem e que conta com uma conversa entre o presidente da FPF, Amadeu Rodrigues, e o presidente do TJDF-PB, Lionaldo Santos, foi interceptado justamente na mesma data do julgamento.

Na conversa entre os dois, Amadeu Rodrigues chega a sugerir qual deveria ser o resultado da sessão, que ainda contava com uma ação impetrada pelo Sousa, que buscava uma vaga semifinal também alegando que tinha feito uma campanha melhor que o semifinalista ‘oficial’, o Serrano.

Lionaldo: Me diga uma coisa, essa sessão deve ser realizada hoje… qual é a sugestão que você dá?
Amadeu: Seguir o relator. Manter do jeito que tá… o primeiro jogo aqui em João Pessoa, o segundo em Campina, com o Treze com direito das vantagens.

Lionaldo: Já falasse com Serpa [Francisco Di Lorenzo Serpa, auditor do TJDF-PB]
Amadeu: Eu não tenho ligação com Serpa não... dei uma ligada para ele, mas é o lógico isso…
Lionaldo: O relator é ele.
Amadeu: Você viu que o procurador deu um um parecer já, não foi? 
Lionaldo: Foi.
Amadeu: Dessa forma… da forma correta... entendeu? Pelo menos é a orientação de todos... Vamos seguir o que está certo… o certo é esse… o primeiro jogo é aqui… o segundo lá… com a vantagem do Treze… é o entendimento que está até no Supremo…

No julgamento, os auditores do TJDF-PB decidiram, por unanimidade, não aceitar o recurso do Botafogo-PB, justamente o resultado sugerido por Amadeu Rodrigues. Lionaldo Santos se absteve de votar por conta de um pedido impetrado pelo Treze.

Apesar de não ter conseguido o mando de campo nos tribunais, o Botafogo-PB passou pelo Treze nas semifinais e depois se sagrou campeão ao bater o Campinense na decisão.

Defesa de Amadeu fala em ‘conversa institucional’

Procurado pelo UOL Esporte, Eduardo Araújo, diretor executivo da FPF, justificou a conversa entre os dois como normal. “Lionaldo sequer vota nesse caso porque, como presidente, ele ligou para o presidente [Amadeu] falando de outros assuntos e perguntou qual era o posicionamento da Federação, o posicionamento do Amadeu, e ele disse aquilo que estava no parecer jurídico de Marquito [Marcos Souto Maior Filho, diretor jurídico da Federação]”.

“Foi uma conversa institucional. Presidente do tribunal ligou para o presidente da Federação para tratar de outro assunto e fez uma pergunta no meio da conversa para saber o que ele esperava do julgamento. Foi desse jeito. A conversa tem três minutos, isso acontece em dez segundos e os caras gravam o que interessa. A investigação é inquisitiva, a polícia está ali para tentar mostrar qualquer tipo de responsabilidade. A gente está muito tranquilo. Amadeu falou aquilo que estava no parecer do departamento jurídico”, acrescentou.

O UOL Esporte tentou contato com Lionaldo Santos, mas não obteve resposta.

100 investigados na Operação

Amadeu Rodrigues e Lionaldo Santos são apenas dois entre os vários citados na Operação Cartola, desencadeada pela Polícia Civil e pelo Ministério Público no mês de abril. Já são 100 os investigados, número que ainda pode aumentar.

Além de Amadeu - afastado pela CBF - e Lionaldo, estão entre os investigados Rosilene de Araújo Gomes, ex-presidente da FPF, José Renato, presidente da Comissão de Arbitragem (já afastado), Zezinho, presidente do Botafogo-PB, Breno Morais, vice do Botafogo-PB, e Juarez Lourenço, presidente do Treze-PB, além vários árbitros e assistentes.