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Fernando Baiano recorda Mundial de 2000: "ajudei Corinthians a ser campeão"

Marcello De Vico e Vanderlei Lima

Do UOL, em Santos e São Paulo

02/12/2018 04h00

14 de janeiro de 2000. Depois de avançar em primeiro no grupo que contava com o poderoso Real Madrid, o Corinthians enfrentava o Vasco no Maracanã, na grande final do Mundial de Clubes da Fifa. O placar não saiu do 0 a 0 tanto no tempo normal como na prorrogação, e, com isso, a decisão foi para os pênaltis. Oportunidade para os goleiros e cobradores entrarem para a história de seus clubes, e foi o que Fernando Baiano, um dos batedores do time paulista, fez. O atacante, então com 20 anos e o mais jovem entre os que foram para a marca da cal, deslocou o goleiro Helton e ajudou o Corinthians a conquistar o seu primeiro título mundial.

Prata da casa do Corinthians, Fernando Baiano estava em seu terceiro ano como jogador profissional da equipe alvinegra. Reserva de Luizão, ele entrou na vaga de Edílson no final da prorrogação, já com o intuito de fazer parte da lista dos cinco batedores. Além dele, Rincón, Luizão e Edu converteram suas cobranças, enquanto Marcelinho parou nas mãos de Helton. A sorte do camisa 7 é que Edmundo também perdeu o quinto pênalti do Vasco, o que fez a nação corintiana fazer a festa em pleno Maracanã. Momento que o jovem atacante não esquece jamais, conforme ele conta em entrevista exclusiva concedida ao UOL Esporte.

O atacante Fernando Baiano faz sinal para a torcida se calar após converter a sua cobrança na disputa por pênaltis contra o Vasco na final no Maracanã - Getty Images - Getty Images
Imagem: Getty Images
"O Oswaldo [de Oliveira, técnico] falou: 'Você vai entrar e tenta fazer o gol. Eu tive até a oportunidade no finalzinho... E ele falou ainda: 'Se a gente precisar bater pênalti, você bate'? Eu falei: 'Opa, com certeza, se eu acertar entro para a história, eu quero jogar, eu quero entrar', e graças a Deus eu entrei no finalzinho. A partida foi para os pênaltis e eu bati o pênalti com tranquilidade e ajudei o Corinthians a se sagrar campeão. A gente viveu intensamente. O pessoal que jogou o Brasileiro de 99 estava bem exausto, e o Mundial foi em janeiro de 2000. O pessoal não teve tempo para descansar. Foram campeões do Brasileiro de 99 e foram escolhidos 23 atletas. Eu lembro que tiveram alguns cortes e eu estava ansioso para fazer parte deste grupo do Mundial, e graças a Deus eu estava no grupo, e foi bacana porque tinha Real Madrid, Manchester [United], Necaxa, e a gente viveu intensamente janeiro, apesar que era para ter férias. Mas a gente colocou na cabeça que se a gente ganhasse ia marcar história para as nossas vidas e para o próprio clube, então foi muito gratificante ter feito parte de tudo isso", recorda.

5 gols no mesmo jogo, e na Libertadores: "noite especial"

Antes disso, Fernando Baiano já havia acumulado momentos especiais com a camisa do Corinthians. Na Libertadores de 1999, o atacante eternizou seu nome na história do clube ao marcar cinco gols em um mesmo jogo: 8 a 2 contra o Cerro Porteño, no Pacaembu, em jogo que entrou para substituir, nada mais, nada menos, que o consagrado Marcelinho Carioca. Fernando, até então, carregava o status de promessa após vencer a Copa São Paulo no início do ano. Teve a confiança do então técnico Evaristo de Macedo para iniciar o duelo, e não decepcionou.

Fernando Baiano comemora um dos seus cinco gols marcados contra o Cerro Porteño na Libertadores de 1999 - Evelson de Freitas/Folha Imagem - Evelson de Freitas/Folha Imagem
Imagem: Evelson de Freitas/Folha Imagem
"Foi um jogo que me marcou. As pessoas até hoje lembram deste jogo. Foi um jogo que nós vencemos por 8 a 2, um placar super elevado que é muito difícil de se ver dentro do futebol. As pessoas podem até falar: 'Ah, foi fácil', mas lá no Paraguai nós perdemos por 3 a 0, então quer dizer, naquela noite estava todo mundo inspirado, a gente precisava da vitória. Foi até o primeiro gol do Silvinho [ex-lateral], aconteceu de tudo um pouco. Então, esse jogo para mim marcou bastante. Até então eu ainda não havia marcado gol pelo Corinthians na Libertadores, e de uma vez só marquei cinco", conta o ex-jogador, que ganhou moral com o grupo corintiano.

"Eles me deram os parabéns. Eu era muito novo, tinha 19 anos, estava próximo do meu aniversário de 20, começando, e, de repente, fazendo muitos gols, marcando a história, foi gratificante, uma noite especial. No outro dia, o pessoal da imprensa me ligou para marcar entrevistas, e eu era muito tímido, tinha dificuldade para me expressar diante das câmeras, de tantos jornalistas, e depois a gente vê que é coisa de quem está iniciando a carreira", diz.

Chegada ao Corinthians veio após goleada de 7 a 0 contra...

A ida de Fernando Baiano ao Corinthians, ainda aos 14, deu-se de forma curiosa. Ele jogava na várzea e teve o time de Parque São Jorge como adversário. A derrota foi feia, 7 a 0, mas ainda assim o atacante conseguiu se destacar a ponto de ser chamado para fazer um teste no clube.

Atacante Fernando Baiano durante treino do Corinthians, em 1999 - Arquivo/Folhapress - Arquivo/Folhapress
Imagem: Arquivo/Folhapress
"Eu jogava na várzea, num time chamado Sinésio Rocha, aí nós jogamos contra o Corinthians e perdemos por 7 a 0, e o treinador do Corinthians naquela ocasião era o Mirandinha, que jogou no Corinthians, no São Paulo, e ele me chamou para eu fazer um teste, com praticamente já tudo certo, porque eles me viram jogar. Isso foi com 14 anos. É coisa de Deus mesmo, e o Mirandinha chamou só eu, e dali eu fui dos 14 anos até ao profissional do Corinthians", conta.

"Esse é o primeiro 7 a 0 que ajudou, e o último [risos]. Eu fiz toda a base lá até chegar no profissional. Eu morei no alojamento, peguei ônibus para treinar, eu tenho uma história muito bonita. Saí da periferia, morei no alojamento do Parque São Jorge, conheço o Parque São Jorge de cor e salteado, enfim, eu tenho um carinho muito grande pelo Corinthians. Toda vez que eu vou ou passo pelo Parque São Jorge passa um filme na minha cabeça, é muito gratificante", diz.

Legião de craques ao subir no Corinthians: "satisfação enorme"

Depois de fazer a base no Corinthians e ganhar a sua primeira chance no profissional, em 1998, Fernando Baiano se viu no meio de um time recheado de estrelas, e admite: não foi fácil. Por outro lado, o atacante teve uma oportunidade única para aprender e ganhar experiência.

Índio, Fernando Baiano e Marcelinho Carioca comemoram o título brasileiro de 1999 pelo Corinthians - Evelson de Freitas / Folha Imagem - Evelson de Freitas / Folha Imagem
Imagem: Evelson de Freitas / Folha Imagem
"Tinha Gamarra, Luizão, Rincón, Marcelinho Carioca, Vampeta, e para mim, estar no meio dos feras, era uma satisfação enorme. Uma que era muito difícil jogar no Corinthians, ainda mais vindo da categoria de base... Era difícil e subiam uma leva de garotos campeões da Taça São Paulo com futuro promissor, e eu estava no meio desse grupo aí, e eu consegui subir e jogar depois de toda base no Corinthians. Então eu tenho uma história bem bonita", afirma Fernando Baiano, que durante um bom tempo encontrou dificuldades para encontrar espaço na equipe.

"O Luizão veio no segundo semestre de 1999. Em 1998 eu joguei pouco porque foi o ano que eu subi, e no primeiro semestre de 99 eu fui titular. No segundo semestre o Luizão veio e não tinha como eu disputar com o Luizão, ele já tinha experiência. Eu era um garoto subindo da base. O Luizão já tinha sido campeão no Vasco, Palmeiras, então já tinha uma confiança, uma bagagem muito grande, era difícil competir, tanto é que o Luizão foi para a seleção brasileira, disputou Copa do Mundo... Mas para mim sempre foi um aprendizado, sempre foi bom estar no meio daqueles craques no meu início de carreira", acrescenta.

A saída do Corinthians: "queria ter oportunidade"

Sem muito espaço após a chegada de Luizão, no segundo semestre de 1999, Fernando Baiano optou por deixar o Corinthians com o simples objetivo de poder atuar mais. E assim foi. No fim de 2001, deixou o clube e acertou com o Internacional, onde conquistou o Gauchão de 2002.

"Não era nem para eu ter saído. O Parreira [técnico] chegou e falou: 'Pô, vocês liberaram o Fernando Baiano, eu ia usar ele'. Foi até engraçado que eu fui para o Rio de Janeiro e cruzei com o Parreira no refeitório, e ele falou: 'Poxa, você foi embora por que? Eu ia te usar aqui', e eu falei: 'A diretoria me liberou'. Eu estava afim de jogar e acabei indo para o Internacional, e eu comecei a jogar lá e tive um ano maravilhoso, fui campeão gaúcho em 2002", relembra.

"Eu dei um passo para jogar porque no Corinthians eu não estava tendo muita oportunidade, mas não foi por nada a minha saída, foi realmente isso, mais pelo interesse do Inter. E o Corinthians já tinha alguns atacantes que estavam jogando e eu queria ter oportunidade", finaliza o ex-jogador de 39 anos que encerrou a carreira em 2014 após passar pelo Mogi Morim.

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Giovanni, o ídolo no começo da carreira

No meu início, na base, eu gostava muito do Giovanni, mas não tinha nada a ver com a minha posição. Mas eu sempre admirei o Ronaldo Fenômeno, o Romário, esses caras... Eu até cheguei a jogar contra o Romário. Foram os caras que, realmente, na década de 90, eram os melhores na posição, e até encerrarem a carreira eles foram os melhores.

Passagem pela Espanha: "pegaram um amor por mim"

Eu fui muito bem no Celta de Vigo, no Málaga... Uma das maiores lembranças, primeiro, foi no Málaga. Eu fiquei seis meses e fiz nove gols, isso no returno, e fui eleito a melhor contratação do mercado de inverno. Aí o Málaga queria renovar e eu acabei indo para o Celta. Os caras pegaram um amor por mim em cinco meses, muito legal, foi uma passagem muita linda. Pena que eu fiquei pouco tempo. E no primeiro ano eu fiquei entre os artilheiros, o nosso time entrou na Uefa, e eu tinha uma lembrança muito boa: a gente vencia e as pessoas comentavam se não tinha uma vaga para mim na seleção brasileira, mas na época só tinha craques, não tinha assim: 'Ah, eu vou convocar qualquer um porque estava no bom momento'. Não, eram só craques mesmo, só fera, e a gente, como bom jogador, tinha destaque no nosso clube, a gente entendia [não ser convocado] porque era só craque, não tinha chance para nós, não [risos].

Passagem pelos Emirados: "me deram muita coisa boa"

Fernando Baiano comemora gol do Al Wahda no Mundial de Clubes - AP/Hussein Malla - AP/Hussein Malla
Imagem: AP/Hussein Malla
Eu sou um cara que se adapta em qualquer lugar. Depois que eu joguei lá na Alemanha, -10ºC, com neve, e não falava nenhuma palavra em alemão, para mim ficou fácil em termos de clima (Emirados Árabes], e logo em seguida eu comecei a estudar inglês para poder sair e comprar algumas coisas, então nos Emirados para mim foi tranquilo, me adaptei muito bem, fui campeão, tenho um carinho enorme pelos dois times que eu joguei lá [Al-Jazira e Al-Wahda], então foi maravilhoso. E aconteceu tanta coisa lá. A minha esposa é brasileira, de São Paulo, e eu a conheci lá, casei lá, o meu filho nasceu em Dubai, ou seja, os Emirados Árabes me deram muita coisa boa, foi bem diferente.

O que faz hoje: "sou um cara totalmente dedicado à família"

Hoje a minha vida é bem tranquila, eu curto mais a família, dou toda a atenção ao meu filho, cuido das minhas coisas... Graças a Deus e ao futebol eu consegui alguns investimentos, e hoje eu estou intermediando jogador, quando pinta uma oportunidade para o mundo árabe ou aqui mesmo... A gente dá a dica, mas eu não sou aquele empresário que vai nos campos, vai ver jogo, então o meu tempo é mais com a minha família mesmo. Agora... Voltar ao futebol eu não pretendo. Eu tive uma ótima experiência na Portuguesa [superintendente de futebol], apesar de o pessoal falar isso ou aquilo, mas eu sou muito grato. Era uma área que eu não tinha o conhecimento e fiquei pouco tempo, mas foi um clube em que eu aprendi bastante. Mas eu não pretendo voltar, não. Hoje eu sou um cara dedicado totalmente à minha família. Se tem algum moleque eu indico, procuro ajudar, bato a minha bolinha de vez em quando, e curtindo a vida.