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Donizete virou evangélico graças a Marcelinho. E até desistiu do Carnaval

Donizete Pantera defendeu o Corinthians em 1997 e foi campeão paulista - Eduardo Knapp/Folha Imagem
Donizete Pantera defendeu o Corinthians em 1997 e foi campeão paulista Imagem: Eduardo Knapp/Folha Imagem

Marcello De Vico e Vanderlei Lima

Do UOL, em Santos e São Paulo

02/03/2019 04h00

Enquanto jogador, Donizete Pantera soube aproveitar a vida fora das quatro linhas. Folclórico, o mineiro que 'virou' carioca ainda criança brilhou com as camisas de Botafogo e Vasco, apaixonou-se pelo Rio de Janeiro e até hoje reside na Cidade Maravilhosa. Mas se antes o jogador não perdia um Carnaval sequer, a história mudou depois que defendeu o Corinthians. Lá, foi contagiado pelas palavras de Marcelinho Carioca e se converteu. Virou evangélico.

Hoje com 50 anos e pai de três filhos, Donizete não quer saber de Carnaval. "Na época que eu jogava, o Carnaval era muito legal, porque é uma festa da nossa cidade [Rio de Janeiro], que para tudo. A gente ficava muito ligado nessas festas, queria participar de qualquer jeito. No camarote ou na avenida, dançando, brincando. O jogador brasileiro é muito viciado em Carnaval, mas hoje, não. Tenho outra religião, sou evangélico, não gosto muito", conta em entrevista exclusiva ao UOL Esporte.

"Hoje é uma festa totalmente diferente. Não gosto mais e não estou nem aí para quem gosta, não sou mais de brincar. Tenho três filhos, então fico mais na minha. Eu sou evangélico desde a época do Marcelinho Carioca. Eu escutava muito a palavra dele no Corinthians, desde 97 escuto a palavra de Deus e tudo vai se confirmando. A gente vai entrando mais na palavra a cada dia", acrescenta o ex-jogador, campeão paulista pelo Corinthians em 1997.

Donizete cogitou largar futebol após ficar fora da Copa de 98

Campeão brasileiro pelo Botafogo em 1995, ele ganhou a Bola de Prata da revista Placar - premiação mais importante do futebol do País. Ainda foi campeão da Libertadores pelo Vasco em 1998, marcando cinco gols. Donizete Pantera era um dos 'caras' na segunda metade da década de 90 no futebol brasileiro. E olha que a concorrência era enorme...

O atacante tinha uma enorme esperança de fazer parte do grupo que defenderia o Brasil na Copa do Mundo de 1998, na França. Ainda mais depois que um certo 'Baixinho' foi cortado por lesão. Seria a chance do Pantera, mas a comissão técnica liderada por Zagallo optou por convocar o volante Emerson na vaga de Romário.

Donizete Pantera, durante jogo pelo Vasco - Rosane Marinho/Folha Imagem - Rosane Marinho/Folha Imagem
Imagem: Rosane Marinho/Folha Imagem
O episódio fez Donizete pensar em largar o futebol.

"Ah, o cara cai muito de rendimento, né? Está ali esperando uma convocação. Todo mundo vendo, até a minha bisavó. E nada. E quando tem a segunda chance, quando o Romário machuca..."

"Na primeira Copa do Mundo, em 1994, não tive chance de ir. Depois, veio a segunda. E foi o meu ano porque em 1998 fui considerado o melhor jogador da América. Então, trabalhei para isso, e, de repente, não tenho a chance. Eu senti muito mesmo, durante cinco meses meu rendimento caiu bastante. Queria até parar de jogar futebol. Falei: 'Vou parar, já conquistei tudo'. Meu sonho era ganhar a Libertadores, mas aí entra a família e a gente vai superando, e aquela mágoa vai saindo e a carreira vai continuando", conta Donizete Pantera.

De acordo com o ex-jogador, o próprio Zagallo admitiu que o Pantera merecia ir para o Mundial da França. O UOL Esporte tentou contato com o Velho Lobo para dar a sua versão sobre a história, mas não teve sucesso até a publicação dessa reportagem.

"Eu tinha que falar com ele porque não me convocou, e uma vez encontrei com ele aqui na Barra da Tijuca e ele veio falar comigo, disse que foi arrependimento não ter me levado para a Copa do Mundo de 98. Aí eu pensei: 'Pelo menos ele teve a consciência de falar'. Eu chamo o Zagallo de meu pai, e o Zagallo: 'Pô, tenho arrependimento de não ter te levado para a Copa, acho que você fez falta para mim'. Aí eu falei: 'Tudo bem, professor, já passou', aí eu continuei brincando com ele e o Zagallo disse: 'Continua porque você joga muito', e foi isso".

Donizete recorda perda do Mundial de 97: "ambiente não estava legal"

Depois de vencer a Libertadores de 1997 ao bater o Sporting Cristal-PER na decisão, o Cruzeiro chegou para o Mundial, diante do Borussia Dortmund, da Alemanha, reformulado. Duas peças importantes na conquista sul-americana deixaram o grupo: o craque Palhinha, que foi vendido ao Mallorca, da Espanha, e o técnico Paulo Autuori, que seguiu para o Flamengo. Nelsinho Baptista assumiu o cargo e, com ele, chegaram quatro reforços contratados especificamente para o jogo contra os alemães: Bebeto, Alberto, Gonçalves e Donizete.

Mas não deu certo. O Cruzeiro foi derrotado por 2 a 0 e, com o revés, vieram questionamentos quanto às contratações, teoricamente pontuais, feitas para a partida. Na visão de Donizete, esse foi um dos pontos que prejudicaram o time celeste na partida disputada no Japão.

Donizete Pantera     - Reprodução - Reprodução
Imagem: Reprodução
"Fomos eu, Bebeto, Gonçalves e Alberto, que hoje é Alberto Valentim, e não foi muito legal porque o ambiente não estava legal. Achei que a galera estava um pouco sentida porque eles foram campeões da Libertadores e muitos ficaram para trás para dar oportunidade para gente. Existia um pouco de tristeza. E nós não tínhamos treinado. Não levamos o caneco mesmo pelas falhas que tivemos. Era um jogo só, não se pode falhar, e nós falhamos muito. Essas contratações que o Nelsinho Batista pediu deram um impacto para a galera que tinha sido campeã da Libertadores. Pelo menos achei que sim, deu desânimo no grupo", recorda.

"Eu ainda pertencia ao Corinthians, foi coisa de empresário pelo que entendi. O empresário mandou e a gente foi, só para um jogo mesmo. E acho que não recebi nada por isso, digo financeiramente", acrescenta Donizete.

Pantera sonha em ser comentarista: "mas está difícil"

Sem trabalhar desde que pendurou as chuteiras, Donizete hoje estuda para ser comentarista, apesar das dificuldades que o mercado atual oferece. Outra opção é atuar como técnico de futebol. A dúvida ainda existe, mas uma coisa é certa: o Pantera quer seguir respirando futebol.

"Hoje estou na expectativa de um curso, me formando para ser treinador. O meu sonho é ser comentarista, mas está difícil de arrumar um espaço, que está fechado, tem muitos profissionais qualificados na minha frente. Não sendo comentarista, queria estar em campo, trabalhando como treinador ou auxiliar. Eu fiz cursos da CBF e também fiz curso de gestão. Depois que encerrei a carreira nunca mais trabalhei. Estou procurando para lá e para cá", completa.

VEJA MAIS TRECHOS DA ENTREVISTA:

De Minas ao Rio de Janeiro e início no Volta Redonda

Eu sou mineiro, de Prados. Meus pais saíram de lá e foram tentar a vida em Volta Redonda, e eu comecei a minha carreia no Volta Redonda. Fiquei do Juvenil até o profissional. O empresário Léo Rabello comprou meu passe do Volta Redonda e me emprestou para o São José [SP], e o São José fez uma campanha muito boa no Paulistão de 89, fomos vice paulista. Perdemos a decisão para o São Paulo.

Parceria com Túlio Maravilha

Felipe Tigrão, novo técnico do Botafogo, ao lado de Donizete Pantera e Túlio Maravilha, seus companheiros de clube nos anos 1990 - Divulgação/Botafogo - Divulgação/Botafogo
Imagem: Divulgação/Botafogo
Eu fiz uma excelente dupla com o Túlio. Eu não era conhecido até que, em 90, eu fui para o Botafogo, fui campeão carioca, mas fui embora rápido para o México, para o Tecos. Fui o melhor jogador do futebol mexicano em 93/94 e em 95 cheguei no Botafogo. Encontrei uma estrutura muito fraca, mas tinha o Túlio como ídolo e eu fui muito bem porque estava muito bem fisicamente. Eu estava sendo um jogador muito requisitado no México e, com o Túlio, fizemos jogadas maravilhosas. E ele fazia os gols, ou seja, encaixou, né? O time era bom, então deu liga. O Túlio foi um cara que eu me dei melhor porque nós tivemos mais tempo de trabalho, e conseguimos ser campeões no Botafogo.

De onde veio o Pantera?

A Pantera veio do México. Isso surgiu em 93 ou 94, quando eu fui disputar a final do Campeonato Mexicano. Tinham muitos repórteres e pediram para falar alguma coisa diferente, e um amigo me chamou de Pantera, e isso pegou. Então, quando eu fazia gol mostrava as mãos com a garra da pantera, e depois fui fazendo gol e brincando como pantera mesmo, andando com os joelhos, e a marca ficou e virou. Hoje em dia todo mundo me chama de Pantera.

Saída do Corinthians e ida ao Vasco teve dedo de Edmundo

São Paulo me traz boas recordações. Quando cheguei ao São José fui muito bem aceito pela imprensa, pela torcida do Vale do Paraíba, a Águia do Vale, e também pela Fiel, pela torcida do Corinthians. Acho que mais pela minha qualidade, pela forma de jogar, de querer o jogo, de colocar a camisa como a sua pele, então sempre fui muito elogiado por isso. Pena que não pude jogar muito tempo no Corinthians. Fui campeão em 97, considerado o melhor jogador do Campeonato Paulista, mas não dei continuidade, voltei para o Vasco da Gama porque o Edmundo me pediu para jogar lá. Não fosse isso ficaria no Corinthians. Como o Edmundo é meu amigo, ele pediu para eu ir para o Vasco para o lugar dele, que estava sendo vendido para a Fiorentina. Eu fui e fiquei no lugar dele. E eu também queria voltar porque fazia tempo que eu não curtia o Rio de Janeiro. Antes de ir para o Corinthians eu fui para o Verdy Kawasaki, do Japão, depois para o Benfica, e aí fui para o Corinthians. Eu estava bem, campeão paulista e tal, mas o Edmundo me convidou e foi legal porque fui campeão da Libertadores com o Vasco.

Título especial na carreira

Foi no México, pelo Tecos. É um time pequeno que nunca havia sido campeão, e eu fui o melhor jogador do campeonato, fiz gol, então dei uma alegria muito grande para a torcida, campo cheio, foi muito legal, marcante. Eu sou um cara abençoado por Deus porque por todos os lugares que passei fui campeão, e sempre fui líder. Sempre fui um cara que chegou chegando, pisando firme.