Topo

Ex-Grêmio só retomou futebol após castigo da mãe por repetir de ano

Arquivo pessoal/Paulo Roberto
Imagem: Arquivo pessoal/Paulo Roberto

Marcello De Vico e Vanderlei Lima

Do UOL, em Santos e São Paulo

24/03/2019 04h00

Grêmio, São Paulo, Santos, Vasco, Botafogo, Cruzeiro, Corinthians, Atlético-MG e Fluminense, nesta ordem. Ex-lateral direito, Paulo Roberto construiu uma carreira para ninguém botar defeito, mas não sem antes colocar a profissão em modo de espera, depois de levar um belo de um castigo da própria mãe, que era professora. Enquanto começava a dar os primeiros passos no clube gaúcho, depois de ser descoberto no time de sua cidade (Viamão-RS), o jovem atleta encontrava dificuldades para tirar boas notas na escola e acabou repetindo de ano.

Em entrevista ao UOL Esporte, o ex-jogador, hoje aos 57 anos, recorda o que foi combinado com a sua mãe para que voltasse a fazer o que mais gostava.

"Eu jogava no time do Tamoio, de Viamão, que é minha cidade, e o Grêmio veio fazer um amistoso. Na época eu era um dos mais jovens e jogava com os adultos; eu tinha 15, 16 anos e já jogava com os adultos de 20, 21 anos, e eu me destaquei neste jogo e acabei sendo convidado a ir para o Grêmio, ainda como meio-campo. Joguei um ano e meio e acabei não passando de ano na escola, e minha mãe, que era professora, me tirou de lá com a promessa de que se eu fosse bem no ano seguinte voltaria. Eu acabei saindo do Grêmio e voltei um ano depois", contou.

Paulo Roberto, ex-lateral do Grêmio - Reprodução - Reprodução
Imagem: Reprodução
Depois de retornar ao Grêmio, Paulo Roberto melhorou na escola e conseguiu conciliar os estudos com os treinos em dois períodos no clube gaúcho. E assim foi até se profissionalizar.

"Isso foi explicado a eles [Grêmio] pelos meus pais, e eu voltei no ano seguinte, já como juvenil. Tinham treinos em dois períodos, aí comecei a estudar à noite e consegui me formar. Cheguei a prestar vestibular e não fiz faculdade, mas consegui conciliar as duas coisas [futebol e escola], terminei o colegial e cheguei ao profissional. Depois não estudei mais", relatou.

"Minha mãe pegava no meu pé e dizia que tinha que estudar, tinha que estudar", relembrou Paulo Roberto, que se tornou lateral direito graças a um teste feito por Ênio Andrade, então técnico do Grêmio.

"Eu sempre tinha jogado no meio-campo. Aí, na seleção gaúcha de juvenil - que a gente foi campeão brasileiro naquele ano de 81 - o treinador me usou de lateral num jogo e o Seu Ênio Andrade me viu jogando, porque ele era o treinador do profissional, e aí tive uma oportunidade de jogar no profissional como lateral direito, e meu sonho era jogar no profissional do Grêmio. Eu fui e acabou dando certo", afirmou Paulo Roberto, que posteriormente ganhou títulos importantes com a camisa do Grêmio, entre eles a Libertadores e o Mundial de 1983.

"Nós fomos campeões brasileiros em 81, vice brasileiro em 82, campeão da Libertadores em 83 e campeão mundial de 83, mas o mais difícil, em sacrifício, com certeza foi a Libertadores. Mas a conquista mais importante, que teve mais repercussão, logicamente, foi o Mundial, onde nós jogamos com o Hamburgo - era como se fosse o Barcelona hoje, comparando. Era o melhor time da Europa, ganhava de todo mundo, e nós chegamos como zebra, todo mundo dava como certa a vitória do Hamburgo, e a gente se sagrou campeão. O mais importante foi esse [título], mas o mais difícil foi a Libertadores", comparou.

Recusa à Europa: "salário era parecido"

Ex-lateral do Grêmio Paulo Roberto (dir.) e os filhos - Arquivo pessoal/Paulo Roberto - Arquivo pessoal/Paulo Roberto
Imagem: Arquivo pessoal/Paulo Roberto
Em meio a tantos clubes grandes que defendeu no Brasil, Paulo Roberto ainda poderia ter acrescentado algum time europeu em seu currículo, mas preferiu continuar em solo verde e amarelo. Segundo ele, os salários oferecidos por lá não eram tão atrativos como hoje.

"Não dá para enganar tanto tempo assim, né [risos]? Para mim é um orgulho muito grande ter jogado nesses clubes, ter conquistado títulos, ter marcado história. Na época eu tive três, quatro oportunidades para jogar na Europa e não fui. Financeiramente não era uma diferença tão grande como é hoje, eu não era alucinado para jogar na Europa. Como eu jogava em times grandes, o salário era parecido com o da Europa. Eu joguei nos maiores nove clubes do Brasil, fiz uma ótima carreira e me orgulho disso. E hoje estou te dando uma entrevista, falando de uma carreira que eu já parei há 20 anos por ter jogado nos maiores clubes do Brasil, então isso é um motivo de honra muito grande. Joguei em seleção de base e na seleção principal", recordou.

Marca recém-alcançada por Diego Souza

Ao acertar com o Botafogo, Diego Souza igualou a marca de Paulo Roberto: passou a contar com nove clubes - entre os 12 grandes de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul - no currículo. E, para o ex-jogador, o que mais fica marcada não é grande quantidade de equipes de nome que defendeu, mas sim os títulos conquistados por elas.

"O que marca são as conquistas. Nesses clubes todos, o único que não conquistei título foi no Fluminense. No Santos, fiquei pouco tempo e conquistei uma Copa Quirino, no Japão, invicto, e só joguei um Paulista. Mas você vai ali na sede do clube e tem o pôster da Copa Quirino, vai no Vasco da Gama e tem vários, no Botafogo, no Grêmio, no Atlético-MG, no Cruzeiro. Em todos tem um pôster que eu estou lá, então o que marca são as conquistas", disse Paulo Roberto, que não vê Diego Souza tão marcado na história de alguns clubes justamente pela ausência de taças.

"O Diego Souza é um grande jogador, nível de seleção brasileira, e acho que, talvez, não tenha marcado tanto porque não houve as conquistas. Mas ele deixou o legado dele. Não foi campeão no Sport, mas a torcida queria que ele voltasse, a torcida do Vasco da Gama queria que ele voltasse também. Ele é um excelente jogador. O que pode acontecer é, quando ele parar de jogar futebol depois de anos, não ser lembrado porque não teve as conquistas, mas enquanto estiver jogando vai ser lembrado", opinou.

VEJA OUTROS TRECHOS DA ENTREVISTA

Renato Gaúcho merece busto?

O busto ficou legal, e eu acho que ele merece, sim, porque em toda a história são 115 anos de Grêmio, e até hoje é o título mais importante do clube. É lógico que o time era muito unido, era um conjunto, mas o Renato acabou se destacando, fez os gols, e quem faz gols se destaca. Até hoje é um ídolo do clube, como jogador, e depois voltou como treinador e ganhou títulos que o Grêmio não conquistava há anos, então ele é um cara que merece tudo que está acontecendo com ele, por tudo que fez como jogador e está fazendo agora também como técnico.

Renato Gaúcho sucessor de Tite?

Eu creio que sim, o Renato deve ser o próximo treinador da seleção brasileira. A seleção brasileira não está tendo evolução nenhuma com este tempo do Tite, e penso que nem vai ter porque não tem como evoluir com os amistosos que o Brasil joga. Eu não sei o que o Brasil vai ganhar jogando contra o Panamá, República Tcheca. As pessoas ainda falam: 'Ah, é Europa', mas o Brasil tinha que jogar contra uma Alemanha, Espanha, Itália, parece que tem medo de perder fazendo jogos assim. Aí chega na Copa do Mundo e faz 16 anos que o Brasil perde para europeu. Então, se não ganhar a Copa América, acho que vai haver troca, e se houver troca, o Renato é um sério candidato para ser o treinador da seleção brasileira.

Jogaria no Internacional?

Jogaria, se tivesse oportunidade na época. Quando estava no Cruzeiro teve uma situação de eu jogar no Inter, e eu jogaria sem problema nenhum porque sempre me coloquei como um jogador profissional, independente de ser gremista quando era pequeno e ter começado no Grêmio. Acho que o maior respeito que poderia ter por uma equipe é dando o melhor em campo, tentando sempre ajudar a vencer. Tem a rivalidade, mas joguei no Cruzeiro e no Atlético-MG, em que a rivalidade é parecida, e em São Paulo joguei no Santos e no São Paulo, e nunca fui cobrado, sempre dei o meu melhor com a camisa que eu vestia, em respeito ao torcedor que apoiava.

Aposentadoria no Cerro Porteño

Eu já estava querendo parar, estava com um problema no tendão, e depois eu acabei fazendo uma cirurgia. Eu fui para lá porque o Jair Pereira, que foi meu treinador no Cruzeiro e no Corinthians, foi para o Cerro Porteño e me levou. Joguei alguns jogos, mas não consegui ter uma sequência até porque meu tendão não estava aguentando mais, eu tomava remédio para jogar. Depois o Jair Pereira saiu e eu pedi para rescindir meu contrato [em 1998], até porque não conseguia mais jogar, e eu me cobrava muito, e o Cerro Porteño é um grande clube do Paraguai.

Alergia o fez rescindir com o Corinthians

Eu analiso como uma boa passagem. Eu tinha mais um tempo de contrato, mas tive um problema alérgico, e minha esposa, que estava grávida, também teve, em relação à poluição, e acabei rescindindo meu contrato depois do Brasileiro de 94, tinha mais um ano. Mas a passagem foi muito boa porque o Corinthians formou um baita time, com o Jair Pereira de treinador. Só que o Palmeiras tinha um time muito bom, era parelho. Mas o que decidiu o Brasileiro de 94 foi o primeiro jogo, em que houve uma situação de gol do Palmeiras que estava impedido, e o árbitro não deu. No jogo final, tínhamos que ganhar com dois gols de diferença; fizemos 1 a 0 com gol do Marques e depois o Palmeiras acabou empatando e conquistou o título.